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Publicado: Quinta, 27 de Agosto de 2020, 18h00 | Última atualização em Sexta, 21 de Mai de 2021, 13h25
TABACO
Nicotina tabaccum [tabaco]. Em: Veloso, José Mariano da Conceição. Florae fluminensis. Rio de Janeiro: Off. Lith. Senefelder, 1825-1827. OR 2687 Bib

Planta nativa da América, era usada pelos indígenas com finalidades terapêuticas, religiosas e de lazer. Logo no início da colonização do Brasil, o plantio do tabaco foi estabelecido pelos colonos portugueses e seus descendentes. Mas, foi somente a partir de meados do século XVII, que sua produção deixou de ser um cultivo caseiro para espalhar-se por amplas regiões da colônia lusitana, sobretudo norte e nordeste. Ao contrário do açúcar, o cultivo do tabaco não necessitava de grande capital, e qualquer um podia cultivá-lo com certa facilidade (ANTONIL, André João. Cultura e Opulência do Brasil por suas Drogas e Minas. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2007). Popularmente chamado de fumo, era apreciado também na Europa, a princípio baseado em sua fama medicinal. A variedade do tabaco em pó – o rapé – era exportado, ainda, para a Índia e China. Foi o segundo maior produto de exportação da América portuguesa até o século XVIII e uma das principais mercadorias de troca utilizada no comércio de escravos na costa africana. O tabaco comercializado na África era chamado refugo – fumo de qualidade inferior, rejeitado para os mercados europeu e asiático, mas que tinha grande aceitação no escambo por escravos africanos. Devido a sua crescente importância, ainda em 1674, foi criada a Junta da Administração do Tabaco, responsável por administrar o monopólio real e coibir o contrabando. Posteriormente, em 1702, criaram-se superintendências nos portos mais importantes da colônia, com vistas a controlar a qualidade e o mercado. Ao superintendente cabia: assistir aos despachos e à boa arrecadação do tabaco; conceder licenças e fiscalizar a pesagem antes de enrolado e beneficiado; ter conhecimento sobre denúncias de descaminhos do tabaco; castigar os transgressores na forma da lei, entre outras atribuições. A partir de 1751, estas atribuições passaram às Mesas de Inspeção. Foram regiões produtoras de tabaco: Pará, Maranhão, Minas Gerais, Pernambuco e, sobretudo, Bahia.

 

TABELIÃO PÚBLICO

Durante o sistema de capitanias hereditárias, foi concedido aos donatários o direito da criação de vilas e de ofícios de justiça, responsáveis pela aplicação da lei em toda capitania. Com a criação dos ofícios, estabeleceu-se a figura do tabelião – funcionário público responsável pela elaboração de escrituras e instrumentos necessários para a autenticidade legal dos atos administrativos e judiciais, conservando ainda os traslados destes em notas. Institucionalizou-se os cargos de tabelião do judicial – atuava nas cidades sob jurisdição do juiz de Fora, entregando a este as querelas e inquirições já realizadas; registrava todos os autos; colhia a assinatura do juiz nas sentenças definitivas proferidas verbalmente em audiência; procedia a quaisquer autos, inquirições ou devassas, quando por ordem judicial etc. – e do tabelião das notas – responsável pelo registro de todas as notas dos contratos firmados, em livro próprio, bem como pela guarda deste livro e pela elaboração de todos os testamentos, inventários e instrumentos de posse das terras.

 

TÁFIA

Ver AGUARDENTE.

 

TACHO

Tachos ou tachas eram grandes vasilhas, normalmente de cobre ou ferro, usadas na casa de caldeiras, onde se inicia o processo de produção do açúcar. Utilizavam-se quatro tachos na produção. Depois de moída a cana-de-açúcar, seu caldo ia para o primeiro tacho, no qual se iniciava o processo de purificação: era aquecido, sem ferver, para a retirada das impurezas, que formavam uma “espuma”. Para isso, os caldereiros usavam escumadeiras, ou espumadeiras. Passava-se, então, o caldo para a segunda tacha, onde este recebia água, era aquecido e se repetia o procedimento de limpeza. Na terceira tacha (ainda chamada de caldeira) o caldo era fervido para apurar e ganhar a consistência de um xarope. Na última tacha – de cozimento – o caldo era cozido até se tornar um “mel” e depois até ficar em ponto de “puxa-puxa”, quando começava a açucarar e seria retirado e colocado nas formas.

 

TANGER

Situada no norte de Marrocos, a cidade de Tânger é a entrada ocidental do estreito de Gibraltar que liga o oceano Atlântico ao mar mediterrâneo e a Espanha ao norte da África. Dando continuidade às conquistas no norte da África após a tomada de Ceuta em 1415, Tânger foi ocupada pelos portugueses em 1471, sob comando de d. Afonso V, conhecido como o Africano por suas vitorias sobre os mouros no continente. O domínio da praça tinha como objetivo a expansão da fé cristã para além da Europa e evitar o isolamento da única cidade sob o domínio luso na região, Ceuta, dando aos portugueses o controle do estreito de Gibraltar. A ocupação lusa estendeu-se por quase dois séculos, uma das possessões portuguesas de mais longa duração no Magreb, resistindo aos constantes ataques mulçumanos. A retirada portuguesa de Tânger ocorreu apenas em 1661, numa aliança entre Portugal e Inglaterra, por ocasião do casamento da infanta d. Catarina de Bragança, filha de d. João IV, com o rei inglês Carlos II, quando a cidade foi entregue como dote à Coroa britânica.

 

TAUNAY, AUGUSTE (1768-1824)

Nascido na França em 1768, irmão do pintor Nicolas Taunay, o escultor e professor Auguste-Marie Taunay ganhou notoriedade no período napoleônico, tendo sido responsável, entre outras obras, pela decoração das escadarias do Louvre e do Arco do Triunfo do Carrossel, em Paris. Incorporado, junto ao irmão, à missão artística francesa – grupo de artistas que vieram para o Brasil com a missão de organizar o ensino das artes plásticas na cidade –, aportou no Rio de Janeiro em 1816. Um dos primeiros trabalhos realizados, em parceria com Debret e Grandjean de Montigny, foi a ornamentação da cidade para as solenidades de aclamação de d. João VI em 1818. Participou também, da decoração dos festejos em homenagem a chegada da princesa Leopoldina e de seu casamento com d. Pedro. Taunay foi nomeado professor de escultura da recém-criada Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, que, no entanto, só seria de fato instalada dez anos depois, após a sua morte, já com o nome de Academia Imperial de Belas Artes

 

TAUNAY, NICOLAS (1755-1830)

Pintor, ilustrador e professor francês, Nicolas Taunay era irmão de Auguste Taunay. Recebeu o título de agregado da Academia Real de Pintura em 1784, o que possibilitou a sua participação em salões oficiais e uma pensão por três anos. Foi membro do Institut de France – instituição fundada em 1795 reunindo 5 escolas de ensino e estudos superiores –, ocupando a sua presidência entre 1814 e 1816. Consagrou-se como pintor que retratou os feitos de Napoleão Bonaparte, pintando os triunfos do general em quadros de grande formato. Em 1816, aceitou o convite de Joaquim Lebreton para integrar, junto ao seu irmão, a Missão Artística Francesa. Ao lado de nomes como Debret, Grandjean de Montigny, Marc e Zépherin Ferrez, estabeleceram-se na cidade do Rio de Janeiro com o objetivo de organizar o ensino das artes plásticas na capital. Durante sua estadia produziu mais de trinta paisagens da cidade e arredores; participou da decoração da cidade para os festejos da chegada da princesa Leopoldina; de seu casamento com d. Pedro e da aclamação de d. João VI. Voltou à França em 1821 como barão de Taunay, deixando filhos no Brasil.

 

TAVARES, D. ANTÔNIO ROLIM DE MOURA (1709-1782)
Plano da Vila Bela de Santíssima Trindade, capital da capitania de Mato Grosso, 1789. Ministério da Guerra. BR RJANRIO OG.MAP.110

Nasceu na Vila de Moura, Baixo Alentejo, em 1709. Filho de família aristocrática portuguesa, foi nomeado governador da capitania de Mato Grosso em 1748 por decreto de d. João V. Embarcou de Lisboa para o Brasil em fevereiro de 1749, chegando ao seu destino, Cuiabá, apenas dois anos depois. Logo que assumiu o governo, fundou a Vila Bela da Santíssima Trindade – território de fronteira, ainda indefinida, entre as possessões espanholas e lusitanas na América. Expulsou os missionários espanhóis da região e estabeleceu novas alianças com os indígenas. Por seus serviços prestados como primeiro governador de Mato Grosso foi agraciado, em 1763, com o título de conde de Azambuja pelo rei d. José I. Em 1765, foi transferido para o governo da Bahia, onde ocupou o cargo de vice-rei do Brasil entre os anos de 1767 e 1769, sendo substituído pelo marquês de Lavradio. Ao retornar a Portugal, foi eleito sócio da Real Academia de Ciências de Lisboa e exerceu, ainda, os postos de presidente do Conselho da Fazenda, governador das Armas da Estremadura, capitão do regimento de infantaria da Corte e veador da casa da rainha d. Maria Ana de Áustria.

 

TAVERNAS E CASAS DE PASTO

O comércio de alimentos no período colonial envolveu várias modalidades, como vendas, armazéns, comércio das ruas, das quitandeiras, além de casas de pasto e tabernas. Esses espaços funcionaram também como um espaço de sociabilidade e para hospedagem, como se pode ver em diferentes narrativas dos que passaram pelo interior das capitanias, encontrando pouso em estalagens ou vendas e experimentando os mais diversos cardápios, alguns muito precários, outros reservados aos mais abastados. Mas, no início do século XIX, é na capital que as casas de pasto se multiplicam e, depois também, restaurantes de hotéis, que passam a servir refeições nas áreas nobres da cidade ou no centro. Assim, como descreve Maria Beatriz Nizza da Silva em Vida Privada e cotidiano no Brasil na época de d. Maria I e d. João VI, abriam-se mesas redondas onde se pagava semanalmente uma subscrição pelo jantar, única forma de admissão dos comensais. O jantar, que ocorria às 14 horas habitualmente poderia incluir vinho e em alguns casos também se poderia escolher não partilhar a mesa, ocupando um quarto fechado. Além dos portugueses, outros estrangeiros se ocuparam do negócio no Rio de Janeiro, como ingleses e franceses, em hotéis como o Royaume du Brésil. Comia-se nesses estabelecimentos sopas, cozidos, doces, e algumas receitas mais sofisticadas anotadas por Jean Baptiste Debret em sua Viagem pitoresca: “lembrarei pois que em 1817 a cidade do Rio de Janeiro já oferecia aos gastrônomos recursos bem satisfatórios, provenientes da afluência prevista dos estrangeiros por ocasião da elevação ao trono de d. João VI”. Era, segundo o artista francês, o paladar de comerciantes e viajantes ingleses e alemães que exigia os prazeres da mesa, atendidos pelos italianos que imperavam no comércio relacionado à alimentação, em restaurantes e casas de comestíveis que vendiam azeites finos, frios bem conservados, massas delicadas, frutas secas de primeira qualidade. Foram também os únicos padeiros da cidade então em atividade, na rua do Rosário, seguidos por outros concorrentes no abastecimento de pão. 

 

TÁVORA, FRANCISCO DE ASSIS DE (1703-1759)

Filho e herdeiro do 2º conde de Alvor, Bernardo António Filipe Neri de Távora e d. Joana de Lorena, foi um nobre, militar e administrador colonial português. Casou-se, em 1718, com sua prima, Leonor Tomásia de Távora, 3ª marquesa de Távora, tornando-se então o 3º marquês de Távora, importante casa da nobreza lusa. Foi nomeado vice-rei da Índia em 1750, ainda no reinado de d. João V. Em março desse mesmo ano, o marquês de Távora partiria para Goa representando a Coroa portuguesa naquele continente, acompanhado por d. Leonor, sua esposa e pelos seus filhos, Luís Bernardo (o marquês-novo) e José Maria. Seu governo foi marcado por importantes campanhas militares e comerciais, conquistando praças e fortalezas e vantagens comerciais na região. Acumulando poder e fama, retornou a Portugal em 1754, já no reinado de d. José I, quando se revelaram hostilidades entre a casa dos Távoras e a Coroa portuguesa, sobretudo devido à grande influência de Sebastião José de Carvalho e Melo, que via na antiga nobreza lusitana um empecilho para a consolidação do ministério pombalino. Em 1758, o marquês de Távora foi acusado de ser um dos cabeças na tentativa de regicídio ocorrida no ano anterior.  Os autos produzidos pela Junta da Inconfidência, que julgou o crime, sugerem que o marquês teria participado da conjuração por “ódio à falta de decorro e pudor que o rei impunha à sua Casa”, por conta da relação amorosa entre o rei d. José I e d. Teresa de Távora, irmã e nora de Francisco de Assis, casada com seu filho Luís Bernardo, que era pública a todos no Reino. Condenado à morte pelo crime de lesa-majestade, foi desnaturalizado, barbaramente executado, seus bens confiscados pela Casa Real e o título de marquês de Távora extinto.

 

TÁVORA, LEONOR TOMÁSIA DE (1700-1759)

Filha de d. Luís Bernardo de Távora e de d. Ana de Lorena, d. Leonor tornou-se marquesa de Távora em 1721, após o falecimento de seu avô paterno o 2º marquês de Távora. Estendeu o título ao seu marido, Francisco de Assis de Távora, seu primo, com quem se casou em 1718. Integrante de uma das principais e mais poderosas famílias nobiliárquicas de Portugal, tornou-se uma das figuras de oposição ao ministério de Sebastião José de Carvalho e Melo, além de intimamente ligada aos jesuítas e o padre Gabriel Malagrida, seu diretor espiritual. Foi a primeira fidalga a ser incriminada pelo atentado contra o rei d. José, a 3 de setembro de 1758, vindo a ser presa na sua residência, juntamente com seu marido e filhos, na noite de 13 de dezembro. Única mulher supliciada durante a execução pública dos réus condenados pela tentativa de regicídio, a marquesa de Távora foi decapitada em cadafalso e teve todos os seus bens confiscados pela Câmara Real.

 

TÁVORAS

A casa dos Távoras é uma das mais antigas e importantes casas nobiliárquicas portuguesas. Notabilizavam-se pelos bens que administravam, pela grande influência local que possuíam e pela importância de suas redes matrimoniais, que os uniram com outras importantes casas como os condes de Atouguia, da Ribeira Grande e de Vila Nova, os marqueses de Alorna e os duques de Aveiro e de Cadaval. Seu vasto patrimônio teve origem em bens situados na província de Trás-os-Montes, no entanto, segundo o historiador Nuno Gonçalo Monteiro, a família retirava a maior parte de seus rendimentos, tal como as demais casas titulares, das comendas e bens da Coroa que administravam. Durante o reinado de d.José I, animosidades entre os Távoras e a Coroa portuguesa vão surgir: todo esse poder e influência passaram a ser vistos com desconfiança pelo rei e, sobretudo, pelo ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, que pretendia fortalecer seu ministério, anulando ou diminuindo as forças concorrentes, como é o caso da Companhia de Jesus e a antiga nobreza lusa, refratária às mudanças propostas pelo então secretário. A estreita relação entre a família Távora e os jesuítas, especialmente o padre Gabriel Malagrida e suas pregações místicas, também era vista com desconfiança pela Coroa, representando uma ameaça ao ministério pombalino. A falta de reconhecimento do rei pelos serviços prestados pelo 3º marquês de Távora no governo da Índia e o relacionamento amoroso de conhecimento público entre d. José e d. Teresa de Távora e Lorena, esposa de Luís Bernardo de Távora, o marquês novo, aumentaram as hostilidades. Em setembro de 1758, d. José sofreu um atentado, Sebastião José apressou-se em culpabilizar a alta nobreza, através de um célere e questionável processo que condenou por crime de lesa-majestade toda família Távora, além de outros nobres lusos, que ficou conhecido como “Processo dos Távoras”. Em janeiro de 1759, Francisco de Assis Távora, Leonor Tomásia de Távora, Luís Bernardo Távora e José Maria de Távora cumpriram a pena de morte, em uma execução pública que ficou marcada pela violência dos suplícios infrigidos aos réus. As crianças e os demais homens e mulheres da família foram encarcerados em conventos e mosteiros; seus bens foram transferidos à Coroa; as casas arrasadas e salgados os chãos; as armas da família picadas e o uso do sobrenome Távora proibido.  No reinado de d. Maria I, o processo foi revisto e o nome dos Távoras reabilitado.

 

TEATRO
Vista da sala de espetáculos no largo do Rocio, onde hoje se encontra o teatro João Caetano, na praça Tiradentes, Rio de Janeiro. Em: Arago, Jacques Etienne Victor. Voyage autor du monde (...). Paris: Imprimerie em Taille-Douce de Langlois, 1824-1826. OR 2126 Bib

O teatro teve sua origem na Grécia antiga, decorrente das manifestações em louvor a Dionísio, o deus do vinho. Com o advento do Império romano, o teatro espalhou-se pelo mundo. A despeito das diversas épocas que atravessou e dos variados estilos que desenvolveu, tornou-se um relevante veículo de divulgação de ideias, fossem elas religiosas ou políticas. Na América portuguesa, o teatro foi introduzido pelos primeiros colonos e, desde o início, representou mais do que arte e entretenimento. Utilizado como um instrumento de auxílio para os jesuítas na conversão dos infiéis, assumiu um viés mais pedagógico, para ensinar aos pagãos algumas noções da moral cristã, como pecado e arrependimento. Dessa forma, atuou como veículo de pregação e convencimento na catequese dos índios. O Auto de Santiago (1564), escrito pelo padre jesuíta José de Anchieta (1534-1597), é considerado a primeira peça apresentada no Brasil. Ao longo do século XVII, a temática religiosa permaneceu, mas de uma outra forma. Segundo Rogério Burasz (2008), nesse período, a liturgia católica barroca tinha uma natureza dramática, uma forma quase teatral de devoção, caracterizada por festas, procissões, músicas e encenações. Na falta do espaço físico do teatro, as igrejas cumpriam esse papel e o público-alvo já não era primariamente o índio, mas toda a população. Para as procissões e autos, que ganhavam as ruas e contavam com grande participação popular, foram criados cenários móveis, marionetes, elementos cênicos e as famosas estátuas de roca – imagens sacras de madeira, vestidas com trajes de tecido. Ao lado das manifestações religiosas, temas ligados a festas populares e acontecimentos políticos começam a emergir, como exemplo, as comédias apresentadas nos eventos de aclamação a d. João IV, em 1641. As ruas das cidades e vilas tornam-se locais para representações de comédias e tragédias, geralmente encenadas em tablados ou palcos improvisados ao ar livre. Só na segunda metade do século XVIII, as primeiras casas da ópera seriam abertas no Rio de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto, Belém, Salvador e em outros centros urbanos. Numa tentativa de conferir certo grau de civilização e modernidade à colônia portuguesa, essas casas de espetáculos exibiam as novas tendências teatrais que vinham de Portugal, com a introdução da ópera italiana, com repertórios, basicamente, importados da Europa. Em suas Memórias da rua do Ouvidor, Joaquim Manoel de Macedo diria das óperas: “Talvez que alguns pensem que a lamentável falta de bom teatro dramático seja de pouca importância. Possivelmente assim não é. No teatro, pode-se tomar o pulso à civilização e à capacidade moral do povo de um país”. Tanto no século XVIII quanto no XIX – quando a vinda da família real representou um estímulo à construção de novos teatros no Brasil – além de local de entretenimento, essas casas serviam como novos espaços de sociabilidade, criando oportunidades de interação social, anteriormente circunscritas, sobretudo, à igreja. Os teatros ganham importância, levando a uma maior profissionalização das companhias dramáticas, destaque para aquela dirigida por João Caetano. Os divertimentos públicos se intensificariam durante o período joanino, e os espetáculos teatrais faziam parte da nova sociabilidade cortesã.

 

TECA

De nome científico Tectona grandis, a teca é uma árvore de alto porte, originária do sudeste asiático, cuja madeira foi muito utilizada pelos portugueses para a construção naval. Substituiu os pinheiros e carvalhos europeus, que antes constituíam a base das embarcações lusas. Sua madeira é de alta densidade, mas leve e muito resistente, ideal para grandes construções, como as naus, e ainda garantiam maior durabilidade. No entanto, se para Portugal era interessante o uso da árvore indiana, devido a sua resistência, por outro lado, era muito dispendioso produzir navios em Goa, em vez de Lisboa. Algumas sementes dessa madeira chegaram ao Brasil via Angola em 1788 e dez anos depois, foi solicitado ao vice-rei da Índia o envio de mudas de teca, oriundas de Damão para serem plantadas em solo brasileiro. Essa medida, adotada pela administração portuguesa de acordo com as ideias ilustradas, coincide com a perda de possessões portuguesas no Oriente, que levou à necessidade de aclimatar especiarias e drogas, além de outras plantas originárias da região da Índia, e que eram de grande importância para o consumo e comércio português com suas colônias e com outros estados europeus. Em 1802, o desembargador e letrado Baltasar da Silva Lisboa registrou que mudas de teca estavam sendo plantadas em toda parte do Brasil. Mas, foi na comarca de Ilhéus, Bahia, onde a árvore melhor se adaptou, sendo cultivada na região desde 1800.

 

TEIVE, FERNANDO DA COSTA DE ATAÍDE (1729-1778)

Nascido em Lisboa, era filho e neto de fidalgos e aristocratas do reino. Tinha um longínquo, mas, ainda assim, significativo laço de parentesco e apadrinhamento com o marquês de Pombal e seu irmão, Mendonça Furtado, o que provavelmente lhe rendeu – somado também a sua experiência militar atuando em regiões de fronteiras – a indicação para capitão-general do estado do Grão-Pará e Maranhão em 1763. Neste cargo, fora incumbido de proteger os limites da capitania; promover o povoamento e ocupação do estado, sobretudo das regiões consideradas mais “frágeis” aos ataques estrangeiros; fazer a região prosperar economicamente, estimulando a agricultura, a cultura e coleta das drogas do sertão e assegurar, ainda, a liberdade dos índios, conforme estabelecido no Diretório de 1757 [Diretório dos índios]. O processo de civilização dos índios, iniciado com a publicação do Diretório e a expulsão dos jesuítas, era uma diretriz importante para sua administração e para garantir a presença de vassalos do rei nos territórios do norte, especialmente aqueles próximos às fronteiras com a América hispânica. Teive foi o responsável pela criação de vilas e pela vinda de imigrantes portugueses e de outras partes do império para introduzir novas lavouras, colonizar o interior e produzir riquezas. Um dos locais que mais recebeu atenção e povoamento durante seu governo foi a vila de São José de Macapá, estratégica por sua localização na foz do rio Amazonas e importante para assegurar a segurança do território. Outro projeto ambicioso realizado durante seu governo foi a transferência da praça de Mazagão, do Marrocos, para uma região próxima de Macapá, processo iniciado em 1769. Devido a expansão muçulmana no norte da África, Pombal decidiu que a população de Mazagão – possessão portuguesa em Marrocos – seria transferida para o Grão Pará, estimulando o povoamento da região que necessitava de garantia de soberania. Desse modo, foi fundada a vila de Nova Mazagão. Em 1772, Ataíde Teive foi destituído do cargo pelo primeiro ministro do reinado mariano, Martinho de Melo e Castro, acusado de graves falhas durante sua administração, como arbitrariedades, favorecimentos, desvios de conduta e de arrecadação. Retornou a Portugal e à carreira militar em 1773, falecendo cinco anos depois.

 

TEJO

Importante afluente da geografia portuguesa, o rio Tejo nasce na Espanha e deságua no oceano Atlântico, em sua foz foi construída a cidade de Lisboa. Desde à pré-história à idade contemporânea, encontram-se vestígios do aproveitamento econômico de seu vale no povoamento e desenvolvimento humano na região. Suas margens foram fundamentais para a manutenção de populações antigas, bem como responsável pelo comércio fluvial português, já que estabelece a ligação entre o litoral e o interior da península Ibérica. Pela sua extensão, localização geográfica e navegabilidade, o rio Tejo foi um meio de comunicação e de transporte de pessoas e mercadorias, permitindo a saída de produtos para os circuitos econômicos internacionais e vice-versa (Magalhães, Fátima. O Tejo na organização do espaço. Lisboa: Minerva do Comércio, 1996). Foi do seu estuário que partiram as naus e as caravelas dos descobrimentos portugueses. As embarcações eram ancoradas à frente da Ribeira das Naus, de onde o rei poderia assistir à movimentação dos navios e que possuía um grande número de estaleiros. Durante cerca de cinco dias os navios eram preparados e abastecidos de munição e víveres indispensáveis para a viagem, antes de partirem para o mar Oceano através das águas do rio Tejo.

 

TELES, D. FERNANDO DA SILVA (1683-1762)

Nascido em Lisboa e filho do marquês de Alegrete, Fernando da Silva Teles, e de d. Helena de Noronha, frequentou a Universidade de Coimbra e iniciou sua carreira militar em 1708, participando das lutas contra as tropas de Filipe V, na Guerra de Sucessão Espanhola (1703-1713). Recebeu os títulos de visconde de Vila Nova da Cerveira ao casar-se com a sua sobrinha d. Maria José de Lima e Hohenloe e, de gentil-homem da câmara de d. José I, em 1750. Foi, ainda, embaixador extraordinário em Madri e conselheiro de Guerra. Vila Nova esteve entre os fidalgos que fizeram oposição ao marquês de Pombal, sendo preso no castelo de S. João da Foz onde permaneceu até o seu falecimento. Sob o pseudônimo de Teotônio de Souza Tavares, publicou o Discurso sobre a disciplina militar, a ciência de um soldado de infantaria, dedicado aos soldados novos em 1737.

 

TELESCÓPIO

Instrumento destinado a observar objetos que, em função da distância, eram invisíveis a olho nu. A invenção do primeiro telescópio é creditada ao ótico holandês Hans Lippershey (1570?-1619), que teria observado que os objetos parecem maiores e mais próximos quando olhados através de uma lente convexa e outra côncava. Lippershey buscou patentear o instrumento em 1608, mas a patente foi negada. O governo holandês, entretanto, pagou-lhe uma alta soma por cópias do invento. A partir de 1609, Galileu Galilei (1564-1642), que tomou conhecimento do instrumento, aperfeiçoou-o produzindo telescópios cada vez mais potentes. Galileu é considerado o pioneiro no uso de um telescópio para finalidades astronômicas, tendo descoberto os satélites de Júpiter, as manchas solares, as fases de Vênus e os montes e vales da Lua, transformando radicalmente a ciência ocidental. Em 1610, publicou o Sidereus Nuncius, pequeno tratado científico e a primeira obra baseada em observações feitas com auxílio de um telescópio.

 

TENDAL

O tendal, ou estendal, era o local nos engenhos de açúcar onde se colocavam as formas, com o caldo da cana cozido, para purgar e secar.

 

TERCEIRO ESTADO

A expressão refere-se a um dos três estamentos nos quais a sociedade medieval europeia se dividia. Estes estamentos eram categorias hierarquicamente estabelecidas e, cada uma, representava um conjunto de valores e possuíam um lugar específico na ordem sociopolítica de então. Eram delimitados não apenas pelos costumes, pela tradição, mas também por seu status jurídico. O primeiro e segundo estados, respectivamente clero – responsável pela vida espiritual – e nobreza – encarregada da defesa – eram grandes proprietários de terras. Já o terceiro estado aglutinava os grupamentos menos favorecidos em termos políticos da época, abrangia cidadãos cuja ocupação não se ligava nem as armas e nem a igreja e que sustentavam os estamentos superiores, através do pagamento de impostos. Era formado, em geral, por camponeses e trabalhadores urbanos, incluindo a burguesia em ascensão. Em Portugal, por exemplo, a legislação definia, desde o século XVI, os modos de vida aceitáveis, sendo os negócios, um deles, como indicou Vitorino Magalhães Godinho em Estrutura da Antiga Sociedade Portuguesa e que constituiria, com outros indivíduos, o terceiro estado. O termo, característico de uma sociedade de Antigo Regime, ficaria marcado pela sua associação aos movimentos revolucionários do século XVIII, sobretudo às vésperas da Revolução Francesa quando foram convocados os Estados Gerais, o que não ocorria desde o século anterior. Os representantes dessa ordem assumiram a vanguarda dos acontecimentos, transformando a reunião e a si mesmos em deputados de uma assembleia nacional. Emmanuel Sieyès, escritor e político francês, que participou do Estados Gerais, defendia a ideia de que o Terceiro Estado seria o estrato social mais importante para formação de uma nação, formado por aqueles encarregados de todas atividades produtivas, que os outros dois estratos se recusavam a cumprir, mas que usufruíam da riqueza gerada. Ainda segundo o autor: “Que é o Terceiro Estado? Tudo. Que tem sido até agora na ordem política? Nada. Que deseja? Vir a ser alguma coisa” e, isso só poderia se concretizar, com a demolição do Antigo Regime e de sua sociedade fortemente estratificada. A difusão do pensamento liberal, que nasceu estimulado pelas ideias iluministas e que teve seu apogeu com a eclosão das revoluções americana e francesa, influenciou decisivamente movimentos políticos em toda Europa, provocando o fim do absolutismo monárquico e da estrutura social estamental. Em contraposição à vontade real, ganhava força a tese de um governo representativo liberal em que a soberania reside essencialmente na nação e em seus indivíduos livres e iguais. Tal proposição ganharia apoio de setores do terceiro estado, sobretudo, da burguesia, interessados em ampliar sua participação política, a liberdade econômica e suas garantias e direitos individuais. Portugal, que no início do século XIX ainda vivia uma monarquia absolutista, assistiu, em 1820, à Revolução do Porto, que representou o ingresso do pensamento liberal no ideário luso. O movimento revolucionário anunciava uma monarquia limitada por uma constituição liberal, elaborada pelas Cortes Constituintes, formadas por representantes eleitos. Fortalecida economicamente pela prosperidade das atividades comerciais, a burguesia ascendia politicamente, em detrimento da aristocracia de corte. A derrubada do Antigo Regime, expressou os interesses do Terceiro Estado, que poderia assim fortalecer-se em campo político e ascender socialmente com o fim dos estamentos enquanto lugares a que se pertenciam por hereditariedade, substituídos por uma sociedade de classes.

 

TERCEIROS

Termo que designa os membros de uma ordem terceira – associações religiosas formadas por leigos, identificados a uma ordem religiosa tradicional. Funcionavam como representantes no mundo secular das ordens primeiras. O estabelecimento das ordens terceiras no Brasil foi favorecido no período conhecido como União Ibérica, quando as coroas portuguesa e espanhola estiveram unidas (1580-1640). A Espanha era adepta das ordens mendicantes como instrumento de conquista espiritual das suas colônias na América, o que permitiu que, durante a União Ibérica, o monopólio da atuação dos jesuítas no Brasil fosse dividido com outros grupos religiosos. A chegada das ordens terceiras na colônia esteve, na maioria das vezes, associada ao estabelecimento anterior das congregações mendicantes às quais estavam vinculadas. Assim, em geral, os terceiros se instalavam no mesmo terreno onde já se encontravam os conventos dos religiosos. Entretanto, tal lógica se inverte nas regiões de colonização mais recente, onde muitas vezes a presença dos religiosos não era permitida, como foi o caso de Minas Gerais. Tais associações sustentavam-se a partir de doações de seus membros, que não raro legavam propriedades às ordens. Para que uma ordem terceira fosse reconhecida oficialmente, e assim passasse a funcionar, seu compromisso deveria ser aprovado por três instâncias, em primeiro lugar, o bispo diocesano; em seguida pelo rei e por último, pelo papa. A dificuldade em obter a aprovação era grande, o que reduzia o número de ordens atuantes na colônia. Aqueles que desejassem ingressar nessas associações religiosas deviam passar por um processo seletivo baseado em critérios de pureza de sangue. Em princípio, era vetado o ingresso a pessoas de ascendência negra, judaica, escravos, forros, mulatos. No entanto, nem sempre tais regras eram seguidas à risca. Após aprovado, o novo membro deveria passar pelo período denominado de noviciado, no qual ele aprenderia as normas de conduta da ordem e seria instruído na educação religiosa. As regras deviam ser seguidas por todas as filiais, o que as diferenciavam de outras associações como as irmandades e as confrarias. Já os estatutos eram formulados pela filial, o que tornava possível as diferenciações dentro da mesma ordem. O sucesso das ordens terceiras durante o período colonial podem ser associado ao fato de estabelecerem um elo entre os dois lados do Atlântico, já que possibilitavam a circulação entre membros de diferentes filiais. Assim, tais associações religiosas serviam de referência aos portugueses recém-chegados da Europa, os quais as procuravam como forma de inserção social no Novo Mundo.

 

TERÇO

Ver MILITARES.

 

TERMO DE VEREAÇÃO

Declaração com a postura dos vereadores das câmaras municipais sobre assunto relativo ao governo e polícia das cidades. Segundo o Diccionario da lingua portugueza de Morais e Silva (Lisboa: Typographia Lacerdina, 1789), termo de vereação seria uma “postura, ou decisão dos vereadores, ou do Conselho para o bom regimento da terra”.

 

TERRA DE OLHÃO

Cidade portuguesa no distrito do Faro, situada na região do Algarve, sul de Portugal. Essa vila, cuja principal atividade econômica era a pesca, teve um papel importante nas guerras contra os franceses [invasão francesa]. Em 1808, os moradores de Olhão, notadamente os pescadores, fizeram um levante contra medidas abusivas implementadas pelo governo francês, liderado por Junot, como a criação de tributos e penas mais severas a quem desrespeitasse as novas regras, sobretudo para a produção pesqueira e seu comércio. Embora a recomendação do governo de Lisboa fosse para não resistir aos franceses, focos de levantes no sul da Espanha e em outras regiões portuguesas, incitaram os "olhanenses" a uma rebelião em junho de 1808. Apesar da rápida reação francesa contra a insurreição, o estímulo à revolta já havia se espalhado pelo Faro e todo o Algarve. A revolta de Olhão teve uma dupla vitória ao conseguir a expulsão dos franceses não apenas da cidade, mas também de todo o reino do Algarve. Após a conquista, sob o comando do mestre Manuel Martins Garrocho e do piloto Manuel de Oliveira Nobre, uma tripulação com dezessete homens embarcou no caíque Bom Sucesso e, seguiu em direção ao Rio de Janeiro, com o objetivo de dar a notícia a d. João. O príncipe regente, tomando conhecimento do episódio, que deu início à restauração do Algarve ao reino de Portugal, e talvez visando ao incentivo a outras rebeliões, autorizou a elevação da então freguesia de Olhão a Vila de Olhão da Restauração.

 

TERRAS MINERAIS

A expressão refere-se às regiões onde foram encontrados minerais preciosos no Brasil colonial (principalmente ouro, ouro branco e diamantes), a saber: as Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, principalmente e, em bem menor escala, Bahia e São Paulo. A descoberta das primeiras minas de ouro, resultado das expedições empreendidas pelos paulistas ao interior da América portuguesa, deu-se em finais do século XVII, já os diamantes foram encontrados na primeira metade do século XVIII. Os minérios do Brasil, além de boa qualidade, eram de aluvião, ou seja, encontrados nas margens dos rios, o que tornava mais fácil e barata a exploração. Estes fatores explicam a presença de toda sorte de pessoas nas regiões das minas, tanto vindas de outras partes da colônia quanto do reino, atraídas pela possibilidade de explorar o ouro e enriquecer rapidamente – o que não acontecia com tanta frequência tendo em vista a pobreza característica daquela sociedade em formação. A atividade mineradora gerou grandes divisas para a Coroa, muito embora os lucros tão fartos não tenham durado muito – o ouro de aluvião, apesar de fácil e barata extração, se esgotava com rapidez. O auge da mineração no Brasil deu-se em meados do século XVIII; já em 1780 os rendimentos se encontravam em queda. A exploração aurífera permitiu o início da ocupação do interior da colônia: cidades e vilas surgiram em torno dos ribeiros e lavras; estradas foram abertas; verificou-se um grande fluxo migratório para os “sertões” – o que representou uma variação no eixo produtivos centrado nos litorais e tornou a região das Minas Gerais a mais densamente povoada do Brasil. Criou-se, ainda que pequena, uma possível mobilidade social, praticamente inexistente em outros lugares da colônia. A região das minas, apesar de ter sofrido graves crises de fome, da eterna carestia dos gêneros, e de ter gerado uma falta de braços para o trabalho em outras regiões produtoras da colônia, auxiliou no desenvolvimento de outras áreas especializadas no abastecimento interno, sobretudo de gêneros agrícolas e gado. Surgiu um núcleo de produção urbano que beneficiou uma série de atividades ligadas ao transporte, ao comércio, aos serviços e ao artesanato. Além da formação de uma nova composição social, a coroa portuguesa precisou desenvolver um sistema de fiscalização para supervisionar a produção aurífera e coletar a parte devida ao governo. Ainda em 1603, foi criado o Regimento das Terras Minerais do Brasil, que buscava organizar a procura e a extração de metais preciosos na colônia. A legislação assegurava sempre à Coroa a propriedade das terras lavradas, aos descobridores era dada a concessão para explorar as datas (lotes de terras). Previa também, a instalação de casas de fundição, destinadas a fundir todo metal extraído das minas, e a criação do cargo de provedor, responsável por estabelecer e fiscalizar a exploração aurífera, evitando o contrabando, e por administrar as casas de fundição. As descobertas de grandes jazidas nas últimas décadas dos Setecentos provocou alterações na administração das terras minerais. O regimento de 1603 foi substituído, em 1702, pelo Regimento do Superintendente Guarda Mores e Oficiais para as Minas de Ouro, que alterou a denominação da Provedoria para Superintendência das Minas, vinculada diretamente à Lisboa, além de ter sob sua alçada toda a jurisdição ordinária, cível e criminal, dentro dos limites das minas. Com o aumento da produção aurífera, em meados do século XVIII, seguiram-se novas mudanças administrativas com a criação das Intendências do Ouro. [Ver Intendente das Minas] A exploração das terras minerais provocou o deslocamento do eixo político econômico para o centro-sul da América portuguesa, o que resultou na transferência da capital de Salvador para o Rio de Janeiro em 1763, porta de acesso à região das Minas Gerais.

 

TESOUREIRO DA CASA REAL

Figura medular na rede de serviços do Paço Imperial, o tesoureiro administrava as somas necessárias aos gastos da Casa Real. Era ele o responsável pela folha de ordenamento de todos os outros funcionários do Paço. Segundo Giovanna Milanez de Castro, “o Tesoureiro da Casa Real recebia os recursos do Real Erário e, com estes, provia a domesticidade de todo o necessário que competia a seu cargo” (Serviço e celebração nos trópicos: a casa real portuguesa no Rio de Janeiro do período joanino. Campinas, 2016). Com a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, acumulou uma nova função: a acomodação das repartições dos servidores do Paço e seus empregados em edifícios existentes e em novas construções na cidade.

 

TIMBRE BRASILEIRO

Durante o processo de emancipação do Brasil, adeptos da causa brasileira compuseram e apresentaram hinos de exaltação à Independência, como por exemplo o Timbre Brasileiro: independência ou Morrer, que relata a luta dos brasileiros contra Portugal, se libertado da tirania e alcançando a liberdade almejada. Nos anos seguintes a 1822, fez-se necessário escolher e apresentar tais insígnias aos ‘brasileiros', já com o intuito de fortalecer o pertencimento a uma nova pátria. No entanto, a composição escolhida como Hino da Independência era um poema de Evaristo da Veiga, Hino Constitucional Brasiliense, com música de d. Pedro I. O hino tornou-se bastante popular durante o período imperial, sendo proferido como hino nacional, embora de forma não oficial.

 

TIMOR LESTE

Ilha localizada ao sul da Indonésia, que faz parte do arquipélago das Ilhas Sonda, perto da ilha de Java. O lado leste da ilha foi conquistado pelos portugueses entre 1512 e 1514, quando da primeira expedição comandada por Afonso de Albuquerque, após a conquista de Ormuz, Goa, Ceilão, Malaca e Molucas. Os principais produtos de interesse na ilha eram o sândalo, da variedade mais fina e valiosa, o mel e a cera, que já eram comercializados com os povos malaios das ilhas no entorno e com os chineses, desde o século XII, aproximadamente. No século XVI, os portugueses, já acompanhados de missionários jesuítas, estabeleceram alianças com os povos locais, e construíram feitorias de onde seriam exportadas as especiarias para a Europa. Não pretendiam estabelecer uma colônia na região, apenas um entreposto comercial. No entanto, em meados do século XVII, os holandeses, aliados aos reinos locais da Indonésia, ameaçaram invadir e ocupar o lado oriental da ilha, o que levou os lusos a estabelecer um governo e organizar a colônia. Em 1702, enviam o primeiro governador e a colonização do Timor português, como ficou conhecida até o século XX, foi iniciada. Para eliminar as disputas com o lado ocidental pertencente aos Países Baixos, foi assinado o Tratado de Lisboa em 1859, quando o território da ilha foi oficialmente dividido e as fronteiras acertadas. Entretanto, apesar dos acertos, a fronteira entre os dois lados continuaria em disputa até a 2ª Guerra Mundial, quando os japoneses invadiram a ilha. Portugal, que não havia se alinhado com nenhum lado no conflito, pede apoio aos Estados Unidos para garantir seu território. O lado oeste aproveitou a guerra e o enfraquecimento do poder dos holandeses para se unir oficialmente aos indonésios e proclamar sua adesão ao país independente da Indonésia. Já no lado oriental, não houve um movimento separatista imediato, permanecendo sob domínio luso. A separação definitiva de Portugal somente ocorreu em 2002, depois de ter sido invadido pela Indonésia em 1975 e passados mais de duas décadas em guerras civis, entre nacionalistas separatistas portugueses e indonésios, apoiados pelos Estados Unidos durante a Guerra Fria. A independência chegou para o Timor-Leste, nome adotado depois da separação de Portugal, destruído por anos de guerras, e o país precisou contar com a presença de tropas de paz da ONU, compostas por militares brasileiros, para garantir o fim de ataques e auxiliar na reconstrução das cidades.

 

TIRANO

O conceito de tirania nasceu na Grécia, designando, sobretudo, o poder exercido sem legitimidade. Para o filósofo Platão (427 A.E.C. - 347 A.E.C.), seria o governo de um só, o tirano, que reina ou governa não segundo a vontade dos cidadãos, mas apoiado apenas em seu próprio arbítrio. Já Aristóteles (384 A.E.C.-322 A.E.C.), definiu a tirania como uma forma impura e corrompida da monarquia, onde o tirano governa para os que estão no poder e não para o povo (Melillo Moreira de Melo. Tipologia clássica dos sistemas políticos. Revista de Ciência Política. FGV, 1979). No período moderno, o tirano é entendido como uma figura despótica, que usurpa o poder e o exerce de forma absoluta. Segundo Rafael Bluteau, em seu Diccionario da língua portuguesa, tirano seria o “príncipe que é único e despótico; o que usurpou o governo (...). O que governa mal, contra as leis, privando arbitrariamente os seus vassalos dos bens, da liberdade civil, das vidas e honras” (Lisboa: Na Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1789).

 

TODO ESSE POVO [RELIGIOSIDADE POPULAR]

A religiosidade popular no Brasil desenvolveu-se a partir do sincretismo de variadas práticas religiosas, principalmente as dos negros africanos, ameríndios e brancos católicos. O processo colonizador perpetrado pela coroa portuguesa envolveu a participação primordial da Igreja Católica, principalmente através da Companhia de Jesus, ordem responsável pela propagação da religião e instrumento civilizador. A religiosidade foi assimilada e construída pelos colonos de forma independente do catolicismo oficial, afastando-se dos dogmas e hierarquização impostos, agregando rituais e cosmovisões característicos das culturas aqui disseminadas. No período colonial, o distanciamento da metrópole e a escassez de párocos e templos fomentaram práticas heterodoxas, principalmente no âmbito privado. Muitos recorriam a remédios e rituais mágicos para sanarem doenças e problemas cotidianos. No espaço público, as manifestações tendiam ao extremo, demonstrando piedade exagerada para fugir da vigilância da Inquisição, muitas vezes não condizendo com a vida diária. Em Portugal, a religiosidade popular apresentava especificidades, em função de como o catolicismo fora desenvolvido por lá, a partir da base cultural característico do país, atrelado ao caráter rural, que levaram à proximidade com os ritos pagãos e místicos, traços transportados para o Brasil. Exemplo forte desta característica é o sebastianismo, crença oriunda do século XVI, mas que permeou o imaginário português chegando até o Brasil, perdurando até o século XIX. O sebastianismo nasceu em função do desaparecimento do corpo do rei d. Sebastião na batalha de Alcácer Quibir, contra os mouros, em 1578. Desde então, os portugueses desenvolveram a crença no seu retorno. A ideia do advento de um rei libertador, não se limitou à fé no regresso de d. Sebastião, envolvendo, também, um conjunto de temas messiânicos sucessivamente reelaborados em contextos de crise e de indefinição política em Portugal.

 

TOLEDO, CARLOS CORREIA DE (1731-1803)

O padre Carlos Correia de Toledo foi um dos únicos inconfidentes de Minas Gerais, ao lado de Inácio de Alvarenga Peixoto, a defender o fim da escravidão de forma explícita. Pároco na região de São João del Rei, nasceu em Taubaté, São Paulo. Era rico proprietário de terras, escravos e minas, além de ser um homem culto, que contava com uma biblioteca particular de qualidade e tinha um músico mulato como seu empregado. Foi uma das principais lideranças intelectuais da conspiração. Como outros sacerdotes que participaram do movimento inconfidente, foi mandado para Portugal para cumprir sua pena, onde morreria em 1803.

 

TOMADIAS

Mercadorias provenientes de apreensões por contrabando ou desvios de gêneros estancados ou diversos.

 

TOUCADOS

Termo que designa um conjunto de adornos para a cabeça ou para os cabelos das mulheres e dos homens tais como presilhas, arranjos, véus, perucas e, principalmente, chapéus, cujas formas e tamanhos variaram conforme o período e lugar. No Brasil, seguindo a moda francesa, sobretudo a partir da transferência da corte portuguesa, o uso de chapéus era requisito obrigatório para as damas frequentarem saraus, festas e cerimônias religiosas. A preocupação feminina com os toucados se dava em função dos variados penteados que faziam nos cabelos conservados compridos. Para tal, utilizavam-se de pentes, arames, cabelos humanos e até farinha e madeira em pó para fixar o modelo escolhido. No que se refere à indumentária masculina, o toucado, via de regra, era o chapéu, fabricado em geral na Inglaterra, país que ditou a moda para os homens durante o século XIX.

 

TOUCINHO

Gordura localizada abaixo da pele do porco, com o respectivo couro. A criação de suínos e a produção de toucinho destinavam-se ao consumo familiar e ao abastecimento dos mercados locais. O toucinho era o mais importante subproduto da criação de suínos. Alimento utilizado no preparo de todas as comidas, servia para cozinhar, untar e preservar os alimentos. Foi utilizado também para substituir a manteiga e o azeite. Separado da carne, o toucinho podia ser conservado por meio da salga, depois encaixotado e comercializado. A carne também podia ser salgada para a venda. Indispensável na dieta alimentar dos habitantes da colônia, o toucinho integrava obrigatoriamente o farnel de bandeirantes, tropeiros e viajantes, principalmente na sua versão salgada. Os escravos e a população pobre consumiam diariamente, acompanhado de feijão-preto e farinha de mandioca.

 

TRÁFICO DE ESCRAVOS
Termo de contagem de escravos transportados de Angola para o Rio de Janeiro no bergantim Amizade. Rio de Janeiro, 23 de maio de 1808. Diversos – SDH – códices. BR RJANRIO NP.COD.242.v1

Uma das atividades econômicas mais lucrativas do período colonial, o tráfico de escravos oriundos da África foi responsável pela entrada de mais de 4 milhões de africanos no Brasil durante cerca de três séculos (Hebert Klein. A demografia do tráfico atlântico de para o Brasil. Estudos econômicos. Maio/ agosto, 1987). Alimentando-se de prisioneiros das guerras étnicas e, posteriormente, tribais que assolavam os reinos africanos, a procura por cativos foi fomentada pela expansão colonial baseada no sistema de plantation, dominante nas Américas, que se apoiava na mão-de-obra escrava. A pressão europeia pelo fornecimento de mercadoria humana levou à um crescimento exponencial da escravidão no continente. O tráfico negreiro resultou no chamado comércio triangular que envolvia África, Europa e América, integrados em um sistema de comercialização de diferentes tipos de riqueza: os escravos africanos, normalmente empregados nas grandes plantações de café, açúcar e algodão da América, eram trocados por tabaco, tecido, cachaça, rum ou armas na costa africana, ao longo da qual várias nações europeias acabaram estabelecendo feitorias para viabilizar o comércio. Transportados em navios tumbeiros ou negreiros, os escravos provinham principalmente do Senegal, da Gâmbia, da Costa do Ouro e da Costa dos Escravos, durante os séculos XVII e XVIII e do delta do Níger, do Congo e de Angola nos séculos XVIII e XIX. De acordo com os dados da The Trans-Atlantic Slave Trade Database – portal internacional de catalogação de dados sobre o tráfico atlântico –, navios portugueses ou brasileiros embarcaram escravos em quase 90 portos africanos, fazendo mais de 11,4 mil viagens negreiras. Dessas, 9,2 mil tiveram como destino o Brasil. A atividade mercantil teve sua expansão inicial entre os séculos XV e XVI – os primeiros escravos africanos chegaram ao Brasil com a expedição de Martim Afonso de Souza em 1530, vindos da Guiné e, em 1568, o governador-geral Salvador de Sá tornou-a oficial. Mas, foi entre os anos de 1750 e 1850, que o tráfico negreiro conheceu seu auge e teve como principal porto importador a cidade do Rio de Janeiro, sobretudo em função da necessidade de abastecimento da região das minas. O comércio de homens mulheres e crianças, tornava-se objeto de dupla exploração: a “mercadorização”, através do tráfico atlântico e a expropriação de sua força de trabalho dentro do sistema escravagista colonial nas Américas, gerando lucros extraordinários, apesar do custo elevado, das “perdas em trânsito”, como diria Manolo Fiorentino, referindo-se aos diversos riscos que envolviam a travessia atlântica (pirataria, epidemias, naufrágios) e das dificuldades para administrar tal atividade, sobretudo pela resistência africana a esse processo de coisificação (Maria Jorge dos Santos Leite. Tráfico Atlântico, Escravidão e Resistência no Brasil. Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana. Agosto de 2017). Os traficantes de escravos, conhecidos como homens de negócios, foram os grandes beneficiários da atividade, tornando-se a elite econômica colonial, mas que precisavam recorrer a relações sociais mais amplas, tanto na metrópole quanto na América e na África, indispensáveis para o funcionamento do comércio atlântico de escravos. Segundo Jaime Rodrigues, o tráfico de escravos envolveu não apenas os africanos escravizados, mas toda uma rede formada por negociantes, feirantes, oficiais e marinheiros comuns, autoridades administrativas e colonos. (De costa a costa: escravos e tripulantes no tráfico negreiro. Rio de Janeiro/ São Paulo: Companhia das letras, 2005). Esse comércio de almas, foi, durante séculos tido como algo natural e justificado tanto economicamente quanto pela religião, que enxergava o processo de escravização como uma forma de levar a fé católica à povos infiéis. No entanto, no alvorecer do século XIX, filósofos liberais colocariam em debate a escravidão, iniciando uma intensa campanha abolicionista, liderada pela Inglaterra. Apesar das pressões britânicas pelo fim do comércio atlântico de escravos, que resultou na assinatura de diversos tratados abolindo a importação de africanos, como a lei Feijó de 1831, mas que seriam apenas “para inglês ver”, o tráfico negreiro, atividade econômica basilar no Brasil colonial, resistiria ainda meio século, mantendo-se, durante alguns anos, na clandestinidade após a proibição do tráfico de escravos em 1850.

 

TRATADO AJUSTADO, CONCLUÍDO E ASSINADO NA CORTE DE VIENA (1817)

Inserido na tradicional política de casamentos entre membros das famílias reais, característica da diplomacia do Antigo Regime, e fruto de uma velha combinação dinástica, a união de d. Pedro, herdeiro do trono português, e Carolina Josefa Leopoldina, princesa de Áustria, foi realizada por procuração, em Viena a 13 de maio de 1817, dia do aniversário de d. João. O noivo foi representado pelo arquiduque Carlos, irmão do imperador. As minuciosas negociações que envolveram o casamento couberam ao Marquês de Marialva, ministro plenipotenciário português, responsável também por redigir o tratado matrimonial assinado em Viena, em 26 de novembro de 1816. O contrato estabelecia os valores do dote, contra dote e arras, em duzentos mil florins de Reno cada um, garantidos por d. João por hipoteca sobre a totalidade das rendas do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves e sobre os bens da Coroa. Constaram ainda, no tratado, artigos que previam os casos de viuvez da arquiduquesa e o destino dos bens que ela deixasse se falecesse antes do príncipe real, com ou sem filhos. Neste último caso, que se verificou em dezembro de 1826, toda a sua herança passaria à descendência, a não ser que ela usasse do direito de dispor da Terça da mesma herança. O contrato foi ratificado por d. João, que por carta de lei de sete de abril de 1817, hipotecou as rendas da Casa de Bragança. A união da Casa de Áustria à Casa de Bragança, que se celebrou com a ostentação habitual às cerimônias da corte austríaca, fez parte de uma reorientação na política externa praticada pelo monarca entre 1814 e 1816. O objetivo principal era estreitar relações com outras cortes europeias, buscando evitar uma situação de dependência exclusiva em relação à Inglaterra, face aos acontecimentos de 1807-1808 [Ver invasão francesa em Portugal].

 

TRATADO D’ ABOLIÇÃO DOS ESCRAVOS DA EQUINOCIAL PARA O NORTE

Ver CONGRESSO DE VIENA.

 

TRATADO DE ALIANÇA DEFENSIVA ENTRE A RÚSSIA E A PORTA OTOMANA (1789)

Se a Revolução Francesa não intimidou inicialmente o Império Otomano, por este sentir que as ameaças às famílias reais europeias cristãs não lhe diziam respeito, a situação se altera em 1798, quando Napoleão ataca o Egito, região sob controle otomano. A invasão provoca uma aproximação entre o Império Otomano e a Inglaterra e, até mesmo, com sua tradicional rival, a Rússia, originando o tratado de aliança defensiva entre o império czarista e a Porta Otomana. A aproximação durou muito pouco: findo o conflito, a relutância da Inglaterra em retirar suas forças do Egito, acaba por aproximar a França do Império Otomano, que reconhece Napoleão como imperador em 1806.

 

TRATADO DE AMIENS (1802)

Tratado de paz assinado entre França e Grã-Bretanha que garantiu uma trégua de 15 meses nas hostilidades entre as duas potências durante as guerras revolucionárias francesas. Antes desse acerto, franceses e ingleses estiveram em constante estado bélico, fosse nos mares, por meio de suas atividades de corso e aprisionamento de navios, ou por meio de seus aliados, respectivamente espanhóis e portugueses. O agravamento das hostilidades se deu com a pressão de Napoleão sobre as outras nações da Europa para aderir ao bloqueio comercial contra a Grã-Bretanha em 1806, quando o tratado já havia sido quebrado, que acabou por resultar na invasão da península ibérica e na transferência da Corte portuguesa para o Brasil em 1808.

 

TRATADO DE 1654

Com o fim da União Ibérica – união dinástica entre as coroas portuguesa e espanhola, incluindo suas possessões coloniais, sob o controle do rei da Espanha, Felipe II –, a difícil situação de Portugal, economicamente derrotado, e ainda sob ameaça da coroa espanhola, levou o reino a realizar alianças e assinar tratados, em especial com a Inglaterra, de quem Portugal passou a se tornar cada vez mais dependente, a ponto de, em certos momentos, comprometer sua soberania. Um destes tratados foi assinado em Londres no ano de 1654,  e reduzia para 23% as taxas sobre as mercadorias inglesas que passavam pelas alfândegas portuguesas, além de permitir aos navios ingleses o comércio com as colônias lusas, salvo algumas exceções – no Brasil, por exemplo, alguns produtos continuavam a ser comercializados apenas pela Coroa portuguesa. Este tratado também garantia a liberdade religiosa para os súditos ingleses (em sua maioria não católicos) e instituía o juiz conservador da nação britânica, que tratava dos privilégios jurisdicionais dos súditos britânicos em Portugal e no Brasil colonial. Segundo Rodrigo Ricupero (O exclusivo metropolitano no Brasil e os tratados diplomáticos de Portugal com a Inglaterra. Revista de História, n.17. São Paulo, 2017), o tratado era muito desfavorável à Portugal, sobretudo em se tratando do fim do exclusivo metropolitano, ao ponto de que o mesmo só fosse ratificado por d. João IV em 1656 mediante a ameaça de ataque da armada inglesa aos navios portugueses na entrada da barra de Lisboa.

 

TRATADO DE BADAJOZ (1801)

Acordo de paz e amizade celebrado entre Portugal, de um lado, e França e Espanha de outro. Firmado na cidade espanhola de mesmo nome, foi imposto a Portugal em virtude da presença dos exércitos francês e espanhol em seu território. Implicava na restituição à Espanha de todas as conquistas lusas feitas na Galiza, além da cessão de alguns territórios coloniais na América do Sul, reconhecendo definitivamente o direito espanhol à posse da Colônia do Sacramento e dos Sete Povos das Missões – regiões disputadas entre as duas coroas ao longo do século XVIII. Em relação à França, estabeleceu-se o rio Arawani como fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa, bem como o fechamento dos portos lusitanos ao comércio britânico.  A violação de algum dos seus artigos por qualquer uma das partes envolvidas conduziria à anulação do acordo, o que veio a suceder com a assinatura do Tratado de Fontainebleau, em 27 de outubro de 1807, e a subsequente invasão franco-espanhola a Portugal.

 

TRATADO DE MADRI (1750)

Acordo de limites firmado entre Portugal e Espanha em 1750, visando reconhecer oficialmente as fronteiras marítimas e terrestres, definindo os limites do poderio de cada coroa sobre as colônias na América. Nesse contexto, merece destaque a figura de Alexandre de Gusmão, secretário do Conselho Ultramarino, brasileiro que intermediou o tratado e conferiu a este o princípio do uti possidetis, isto é, a ideia de que a terra deveria pertencer a quem de fato a ocupasse. Essa iniciativa constituiu uma inovação jurídica no domínio das negociações diplomáticas. Gusmão também foi o responsável pela elaboração do Mapa dos Confins do Brazil com as terras da Coroa de Espanha na America Meridional, conhecido como mapa das Cortes, que buscou ilustrar o estipulado no texto do projeto de tratado proposto, uma construção cartográfica com objetivos diplomáticos. No mapa apareciam as terras em disputa que já estariam efetivamente ocupadas pelos súditos portugueses na América e foi fundamental para o aceite espanhol de quase todas as cláusulas que vieram de Lisboa. Em suas determinações, o tratado estabelecia que a colônia do Sacramento pertenceria à Espanha e o território dos Sete Povos das Missões a Portugal. Ao Norte, no vale Amazônico, também foram atendidos os interesses portugueses, garantindo a defesa daquele território diante da possibilidade de investidas de estrangeiros na região e consolidando o controle político-administrativo do estado do Grão-Pará e Maranhão; além de garantir a integração dessa região com a capitania de Mato Grosso, mantendo o controle dos rios existentes no vale do Guaporé. Pela primeira vez, desde o Tratado de Tordesilhas (1494), procurava-se definir a totalidade dos limites entre as possessões das coroas ibéricas no novo mundo. Este tratado acabou por fornecer à América portuguesa uma configuração muito próxima à atual delimitação territorial do Brasil. A demarcação de tais fronteiras, demasiado extensas, não foi um processo simples: após a assinatura do tratado, as coroas ibéricas organizaram expedições demarcatórias constituídas por diversos profissionais formados nas áreas de engenharia, cartografia, matemática, desenho, astronomia, entre outros, com o objetivo de reconhecer, cartografar e delimitar as fronteiras do território colonial. No entanto, um clima de desconfiança entre os participantes das comissões de demarcação ameaçava a conclusão dos trabalhos, além das dificuldades em retirar os jesuítas e índios da região dos Sete Povos e outros problemas encontrados na demarcação territorial, explicam a pouca duração desse tratado, anulado, em 1761, pelo Tratado de El Prado. Cabe ressaltar que o Tratado de Madri desempenhou um papel de extrema importância na formação territorial do Brasil pois expôs as reais proporções da ocupação portuguesa na América, resultado da expansão territorial para além do tratado de Tordesilhas durante mais de dois séculos de colonização.

 

TRATADO DE PARIS (1763)

Acordo que pôs fim à Guerra dos Sete Anos (1756-1763), selando a paz entre as potências beligerantes em fevereiro de 1763. Consolidado pelo duque Choiseul, da França, o marquês de Grimaldi, da Espanha e o duque de Bedford, da Inglaterra, o tratado foi resultado de dois anos de negociações, iniciadas pelo ministro francês desde janeiro de 1761. A Inglaterra foi a grande beneficiada neste acordo, recebendo da França a maior parte de suas colônias na América do Norte. De uma maneira geral, suas principais implicações foram: a França cedeu para os ingleses as possessões americanas do Canadá, parte do Mississipi, a Ilha de Cabo Breton, Dominica, Granada, São Vicente, Tobago, a colônia do Senegal (África), além de possessões na Índia; a Inglaterra recebeu da Espanha o território da Flórida, Menorca e algumas possessões no Mississipi; a Espanha obteve da Inglaterra a devolução de Cuba e das Filipinas e da França a Luisiana – território com o qual se compensou a perda da Flórida; já a França, conservou as posses de Guadalupe e Santa Lucia (ambas no Caribe), assim como o direito de pesca nas costas da Terra Nova (Canadá); Portugal obteve da Espanha a devolução da colônia do Sacramento, junto à promessa da retirada das tropas da Espanha e da França deste território.

 

TRATADO DE PARIS (1814)

Tratado assinado em 30 de maio de 1814, que pôs fim à guerra entre a França napoleônica e a chamada Sexta Coalizão, formada pela Inglaterra, Rússia, Prússia, Áustria e Suécia. Com a abdicação de Napoleão Bonaparte, derrotado e exilado na ilha de Elba, o tratado restituiu todos os territórios ocupados pela França revolucionária desde 1792, além de estipular o pagamento de uma indenização às nações que tiveram seus territórios invadidos e aos países vencedores. Com relação aos territórios na América portuguesa, o tratado determinava a devolução da Guiana Francesa, anexada por Portugal em 1809 como represália à primeira invasão francesa de Portugal.

 

TRATADO DE PASSAROWITZ (1718)

Assinado na cidade de Passarowitz (atual Sérvia), entre o Império Otomano, o Império Austríaco e a República de Veneza, o tratado determinou a perda de territórios otomanos para a Áustria – parte das atuais Romênia, Sérvia e Bósnia –, enquanto Veneza renunciava a seu controle sob maior parte da Grécia, continental e insular, que passou para domínio otomano. Esse tratado representou o período de expansão máxima do império dos Habsburgos, família real que governou a Áustria do final do século XIII até 1918. O poder da casa dos Habsburgos desenvolveu-se a partir da eleição de Rodolfo como rei do Sacro Império Romano-Germânico em 1273, tendo também assumido o controle da Áustria e da Estíria, que se tornaram o centro do poder da família. No século XVI, a Casa de Áustria torna-se proeminente com a ascensão ao trono de Castela e Aragão por Carlos Habsburgo em 1516. Reuniu, sob o domínio da família, o Império Romano Germânico, a Hungria, a Boêmia, Borgonha, Nápoles, Sardenha, Sicília, os Países Baixos, a Espanha e seus domínios na América. O poderia dos Habsburgo cresceria a ponto de dominar mais da metade da Europa. Na fronteira oriental, o Império Otomano ameaçava sua hegemonia, o avanço dos “infiéis” no continente tinha como resistência e primeira linha de defesa o império Austríaco, provocando inúmeras disputas territoriais. Em 1716, a Áustria envolve-se na guerra turco-veneziana, iniciada pelos otomanos que tentavam recuperar o controle de territórios no mar Egeu. Uma série de derrotas para o exército austríaco obrigou o Império Otomano a assinar o tratado de Passarowitz, pondo fim à guerra. Para além de questões territoriais e militares, o tratado também foi um acordo de comércio, que regulamentou as relações entre o Sacro Império e o Império Otomano. Em seu primeiro artigo, estendia a liberdade comercial estabelecida entre os dois impérios aos súditos dos Habsburgos nos territórios italianos e espanhóis, e dos territórios futuramente conquistados pelo imperador cristão. Também estabelecia algumas situações em que comerciantes do Sacro Império teriam preferência em relação aos de outras nações, além de taxas e impostos a serem pagos.

 

TRATADO DE PAZ E AMIZADE (1648)

Durante três décadas do século XVII, conflitos generalizados de causas diversas compuseram, junto ao quadro de crise que marcaria o período e deixaria milhões de mortos, um cenário de devastação na Europa, como só seria visto novamente séculos mais tarde: peste, fome, retrocessos em áreas do conhecimento que haviam experimentado novo impulso no século anterior, conflitos de ordem religiosa. A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), como ficou conhecida essa série de conflitos generalizados, não seria a única responsável pela crise econômica e social que atingiu o continente. Iniciada na região da Boêmia, parte integrante do Sacro Império Romano-Germânico, a série de conflitos tinha como motivação inicial as diferenças religiosas decorrentes do fim do monopólio da cristandade por parte da Igreja Católica Apostólica Romana, mas, na verdade, expressou o embate de interesses envolvidos no processo de transformação da economia de uma forma geral, e especialmente, a luta política pelo poder que rivalizou estados ainda em processo de consolidação e secularização. Envolvendo os domínios de dinastias antagônicas (Habsburgos – Áustria e Bourbouns – França), a guerra terminou com a assinatura de dois tratados, ratificados no Tratado de Vestfália (1648), também conhecido como A Paz de Vestfália. Tradicionalmente, considera-se a paz de Vestfália um marco na origem do moderno sistema de Estados-nação, como atualmente conhecemos, e nas relações internacionais modernas, abrindo caminho para um sistema de reconhecimento de soberania mútua entre estados seculares. Atualmente, estudiosos do tema questionam ou mesmo rejeitam esta concepção (Luis Mota em Uma releitura crítica em torno do "sistema vestfaliano”; Diego Santos Vieira em O baile do monstro: o mito da paz de Vestfália na história das relações internacionais modernas; Lucas Freire: O impacto de Westphalia na montagem de uma nova ordem na política mundial), uma vez que a combinação de elementos que formariam a originalidade do sistema vesfaliano – nacionalidade + organização política sob forma de Estado + soberania + território – na verdade se cristalizou de formas diferentes e em momentos diversos. De todo modo, o tratado formalizou o direito à aliança entre os príncipes, e a partir dali, tornou-se muito mais claro que as relações entre os diversos estados europeus que, aos poucos se consolidavam, estavam em franca transformação: as guerras haviam se tornado muito mais desestabilizadoras e formas de resolução que exigissem menos desgaste físico e econômico das nações envolvidas fazia-se premente. Os tratados passaram a ser fundamentais para a segurança internacional, estabelecendo os termos segundo os quais os estados se relacionariam. Por vezes encerrando conflitos bélicos, por vezes inaugurando novos rumos nas relações entre dois ou mais estados, os Tratados (de Paz, de Paz e Amizade, de Aliança, de Comércio) orientariam o comportamento dos governantes e teriam papel fundamental na elaboração da cada vez mais intrincada teia de interesses, rivalidades e associações entre as entidades políticas que formavam a Europa.

 

TRATADO DE PAZ E AMIZADE (1799)

Em maio de 1799 foi assinado um Tratado de Paz e Amizade entre o reino de Portugal e o Bei (regência) de Trípoli, ao qual seguiu-se um tratado de mesmo teor com a regência de Túnis, no mês seguinte. Estas ações diplomáticas buscavam dar um fim à atividade corsária berbere ainda existente no Mediterrâneo e no Atlântico, praticada por grupos oriundos do norte da África. Os corsários ameaçavam a atividade comercial lusitana e eram responsáveis pelo cativeiro de súditos europeus, capturados durante os conflitos e transformados em reféns escravizados a espera de resgate. Esta iniciativa também integra um conjunto de esforços empreendidos por Portugal no sentido de garantir formalmente maior segurança e maior espaço no comércio internacional, esforço este empreendido especialmente no último quartel do século XVIII.

 

TRATADO DE PAZ ENTRE A ESPANHA E A PORTA OTOMANA (1782)

Embora a Espanha e o Império Otomano tenham sido rivais na luta pelo controle do Mediterrâneo ao longo da maior parte do século XVI, ao final do século e início do seguinte, o surgimento de novas variáveis – em especial, a chegada dos espanhóis à América – acabou por deslocar a atenção de ambos os Estados para outros objetivos. Durante os séculos XVII e XVIII, tanto a Espanha quanto o Império Otomano perderam paulatinamente sua força diante de novas potências europeias, como a França, Inglaterra e Rússia. Nesse contexto, o Tratado de Amizade e Comércio de Constantinopla, celebrado entre as duas nações em 1782, restabeleceu relações comerciais e diplomáticas, a princípio beneficiando a Espanha, carente de divisas advindas de comércio, e o Império Otomano, que começava a se sentir encurralado pelo expansionismo russo e para quem o tratado com a Espanha contribuiria para a segurança no Mediterrâneo. A evolução política europeia após a Revolução Francesa e a aproximação da Espanha com o império napoleônico, que tinha interesses expansionista contrários à Porta, no entanto, inviabilizaram a continuidade do tratado.

 

TRATADO DE PAZ ENTRE A RÚSSIA E A PORTA OTOMANA (1774 e 1783)

O Império Russo e o Império Otomano assinaram, em julho de 1774, o tratado de Küçük Kaynarca, dando fim ao conflito entre as duas nações que durou de 1768 a 1774. As perdas para o Império Otomano foram consideráveis e, as condições de paz, humilhantes. A Porta Otomana perdeu territórios e influência sobre populações inteiras dentro dos limites do Império. Após a assinatura do tratado, o Império russo não cessaria em tentar obter ganhos territoriais e políticos à custa do já decadente império turco, durante seu movimento expansionista rumo à Europa. Cinco anos depois, o tratado precisou ser ratificado – convenção expiatória de 10 de março de 1779 –, sob a mediação de um embaixador francês, reforçando a necessidade de manter a região da Crimeia independente, já que a Rússia agia de forma a intervir no destino político do território. No entanto, em 1783, a península da Crimeia seria anexada ao território russo e um tratado de comércio assinado, concedendo à Rússia consideráveis vantagens nas trocas comerciais com o Império Otomano, o que acabou por despertar em outras nações europeias o desejo de obter as mesmas facilidades. Com essa incorporação, o Império russo teria acesso ao mar Negro, pondo fim ao incontestável domínio turco na região. A percepção do papel do Império Otomano, não mais considerado uma ameaça real à Europa cristã no equilíbrio de poder continental, tornou-se mais aguda e sua fragilidade frente ao expansionismo russo, verteu-o ao papel de peça estratégica na diplomacia de nações como França, Inglaterra e Áustria, incomodadas com o crescimento de um estado que consideravam muito mais ameaçador do que o esvaziado sultanato de Istambul: o Império da Rússia czarista.

 

TRATADO PRELIMINAR DE 1777 (TRATADO DE SANTO ILDEFONSO)

O Tratado Preliminar de Paz e Limites, assinado em Santo Ildefonso, em 1º de outubro de 1777, teve como finalidade encerrar os conflitos fronteiriços na América e na Ásia, que ocorreram ao longo de quase três séculos, entre Portugal e Espanha. Com o fracasso do Tratado de Madri, anulado pelo El Pardo (1761), representantes das coroas ibéricas, d. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho e o conde de Floridablanca, negociaram um tratado preliminar que, posteriormente, foi reafirmado e aprimorado pelo Tratado de Amizade, Garantia e Comércio em 11 de março de 1778 (Tratado de El Pardo). O acordo pretendia demarcar fronteiras conforme os acidentes demográficos das regiões em litígio, para tanto, comissões demarcatórias foram estabelecidas por ambas as coroas, que deveriam encaminhar-se até os locais determinados pelo tratado e estabelecer a linha divisória entre os limites espanhóis e portugueses. De acordo com o tratado, Colônia do Sacramento e as terras a leste do rio Uruguai caberiam à Espanha, incluindo o território das missões orientais, admitindo a soberania castelhana sobre as duas margens do rio da Prata.  Enquanto a Espanha deveria restituir a ilha de Santa Catarina – invadida em 1776 pelas forças espanholas a partir de Buenos Aires – à coroa lusa, além de garantir o domínio português na região do Rio Grande de São Pedro e adjacências, passando o limite fronteiriço pelo rio Jacuí. O tratado previa ainda, ajustes nas divisas da região norte, notadamente Amazonas e Mato Grasso.

 

TRATADOS DE 1787 E 1799

Referem-se ao Tratado de Amizade, Navegação e Comércio firmado entre Portugal e Rússia em 1787 e renovado em 1799 por meio dos ministros plenipotenciários Francisco José Horta Machado, de Portugal, e Alexandre Príncipe de Bezborodko, da Rússia. Pela carta de 1787 foram definidas vantagens comerciais para ambos os reinos, a saber: vinhos portugueses transportados em navios russos ou portugueses só pagariam quatro rublos de direito de entrada nas alfândegas russas, assim como o sal pagaria metade dos direitos, caso não excedesse os valores e quantidades estipulados para transporte, por tratar-se de um gênero estancado; tábuas, madeira para construção de navios, cânhamo, linhaça, óleo de cânhamo e linho, barras e arcos de ferro, âncoras e peças de artilharia, balas e bombas pagariam metade dos direitos nas alfândegas portuguesas, assim como algumas fazendas russas. Além destas vantagens, também foram estipuladas facilidades para o conserto de navios nos portos de ambos os países e garantia de respeito ao culto religioso. Em 19 de abril de 1799, foi publicada a ratificação do tratado de 1787, que confirmava as vantagens fiscais para os produtos de ambas as nações e apontava para a necessidade de apresentação de certidões que confirmassem a procedência dos produtos. Acrescentava também a diminuição pela metade dos impostos cobrados nas alfândegas portuguesas sobre os seguintes produtos russos: os brins, lonas e outras fazendas de linho, próprias para o velame dos navios. Já nas alfândegas russas, o azeite português e o tabaco em pó, rolo ou folha, vindo do Brasil, também seriam taxados pela metade. O novo acordo vigoraria por 12 anos a partir daquela data.

 

TRATADOS DE 1810

O controle do comércio e navegação entre o reino e suas colônias sempre foi uma preocupação do Estado português. Esse comércio era regido pelas convenções do pacto colonial, que reservava o monopólio dos produtos coloniais para a metrópole, embora o contrabando entre as colônias e outros reinos evidencie as falhas e brechas no sistema.  Considerado um verdadeiro contrato político, pressupunha uma série de instrumentos político-institucionais para a sua manutenção. Na prática, a coroa não conseguia reservar esses mercados apenas para si e, desde o século XVII, eram feitas concessões cada vez maiores a aliados históricos, como os ingleses. Durante a chamada Viradeira – período que se iniciou em 1777 com a nomeação de novos Secretários de Estado, em substituição do marquês de Pombal, por d. Maria I – empreendeu-se uma tentativa de controlar o contrabando e estreitar os laços comerciais intercoloniais, reservando à colônia seu papel de produtora de gêneros agrícolas e de consumidora de manufaturados, visando a controlar a erosão do sistema colonial, que já apresentava sinais de crise. Essa estrutura seria invertida com a chegada da corte joanina em 1808 e a consequente abertura dos portos às nações amigas de Portugal. Eliminava-se o exclusivismo mercantil e essa medida, na prática, favorecia mais à Inglaterra, que exigiu a manutenção e ampliação de certos privilégios econômicos. A situação de dependência comercial com a Inglaterra seria agravada com a assinatura dos Tratados de 1810. Em 19 de fevereiro desse ano, dois importantes tratados foram firmados entre Portugal e Inglaterra: o Tratado de Comércio e Navegação e o Tratado de Aliança e Amizade, que regulamentavam as relações comerciais entre as duas nações, como consequência da nova situação política e econômica resultante abertura dos portos brasileiros. A justificativa dos tratados expressava principalmente o desejo das nações em estreitar os laços de amizade e ampliar os benefícios de seus vassalos por meio de um novo sistema de livre comércio entre os envolvidos, incluindo seus domínios, e no caso português, a nova sede do Império português, o Brasil. Foram acertados, entre outros pontos, assuntos relativos ao comércio entre os países envolvidos, como no artigo VIII, que abolia monopólios que pudessem restringir o comércio entre Portugal e Inglaterra (e seus respectivos domínios), embora fossem mantidos os estancos a certos produtos, como os tecidos de lã ingleses, os vinhos portugueses e o pau-brasil. O artigo principal (XV), que regulava as novas tarifas alfandegárias, estabelecia que todos os gêneros ingleses – à exceção dos estancados – deveriam ser admitidos sem limitações nos domínios portugueses, pagando direitos de 15%. O acordo firmado revela o precário equilíbrio de forças e as dependentes relações de Portugal em relação à Inglaterra, resultando em uma concessão que favorecia diretamente os produtos ingleses em detrimento dos próprios gêneros portugueses, que pagariam 16% de impostos, desigualdade corrigida quase um ano depois, e dos estrangeiros de outras nações amigas, taxados em 24%. Este tratado resultou, praticamente, em um domínio inglês no mercado do Brasil, uma vez que se tornava bastante difícil para as outras nações competir com os preços, a variedade e a qualidade dos produtos oriundos da Inglaterra e suas colônias. Provocou profundo mal-estar e insatisfação entre os produtores e negociantes portugueses, uma vez que se sentiam lesados no comércio colonial, anteriormente, controlado com exclusividade. Também desagradou aos ingleses, desejosos de mais benefícios e privilégios em troca de terem ajudado na transmigração da Corte e na manutenção da integridade do Império português. Os acordos referiam-se, ainda, as concessões previstas no Tratado de 1654 como a liberdade de culto aos súditos ingleses e o direito de julgamento por juízes ingleses segundo leis inglesas, caso algum súdito britânico cometesse delito nos domínios da Coroa portuguesa. O artigo X do Tratado tratava, ainda, sobre a gradual extinção do tráfico de escravos africanos e sua limitação às possessões portuguesas. Tal resolução suscitou inúmeras acusações de arbitrariedade, pois, segundo comerciantes portugueses, se foi elevado o número de embarcações apreendidas sob alegação de tráfico ilegal, também foi grande o número de traficantes que alegavam comerciar apenas nas possessões portuguesas, onde o governo britânico não deveria atuar. Em termos práticos, a medida mostrou-se ineficaz, a abolição do comércio de escravos só seria efetivada quatro décadas mais tarde.

 

TRATADO DE INGLATERRA (1810)

Ver TRATADOS DE 1810.

 

TRATADO DE 19 DE FEVEREIRO DE 1810

Ver TRATADOS DE 1810.

 
TRIBUNAL DO DESEMBARGO DO PAÇO E DA CONSCIÊNCIA E ORDENS

Ver mesa do desembargo do paço e da consciência e ordem.

 

TRIBUNAL DO SANTO OFÍCIO DA INQUISIÇÃO

Órgão de investigação e repressão, criado pela Igreja Católica no período medieval, que encontrou êxito depois da Contra Reforma ou reforma católica. Foi instituído, em 1231, pelo Papa Gregório IX, através da bula Excommunicamus e confirmado por um decreto dois anos depois. O Santo Ofício sistematizou as leis e jurisprudências acerca dos crimes relativos à feitiçaria, blasfêmia, usura e heresias. Os processos eram constituídos a partir de denúncias e confissões feitas, muitas vezes, por aqueles temerosos de serem acusados de acobertar ou fomentar as heresias. Se, na Idade Média, esteve ligado diretamente ao Vaticano e direcionado para investigação de práticas contrárias aos dogmas da Igreja, no período moderno se submeteu mais à monarquia, servindo de apoio para o estabelecimento e o fortalecimento dos Estados Nacionais na península Ibérica. As monarquias católicas promoveram a instalação do Santo Ofício buscando afastar possíveis percalços sociais que acarretassem conflitos, frustrando assim a estabilidade política e social de seus reinos (Juarlyson Jhones S. de Souza e Jeannie da Silva Menezes. O poder na inquisição: as redes de cooperação política com o Santo Ofício no império português. II Simpósio Internacional de Estudos Inquisitoriais. Salvador, 2013).  De acordo com os seus estatutos, as penas mais leves poderiam ser do jejum, multas, pequenas penitências e até a prisão. Quando os acusados se negavam a pedir perdão ou a retratar-se, eram entregues ao braço secular (autoridade civil), o qual geralmente aplicava a pena máxima da morte na fogueira, em um ato público chamado “auto de fé”, onde todo poder da Inquisição era exposto em toda sua amplitude. Instalado em Portugal entre 1536 e 1821, durante seu funcionamento atuou também nas colônias lusitanas. A Inquisição portuguesa demonstrou, desde cedo, o compromisso principal de perseguir a heresia judaizante, associada aos cristãos-novos. Aspecto preservado nos braços inquisitoriais do ultramar. O caráter antissemita do Santo Ofício pode ser evidenciado nas sentenças proferidas pelo tribunal, as penas mais graves eram aplicadas aos acusados de judaísmo. “A sistemática perseguição dos chamados cristãos-novos - judeus convertidos ao cristianismo e suspeitos de ‘judaizar’ em segredo - foi, sem dúvida, o traço distintivo e peculiar das inquisições ibéricas, respondendo pela grande maioria dos réus processados e executados” (Ronaldo Vainfas. Trópico dos pecados: moral, sexualidade e inquisição no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997). No Brasil, o bispo da Bahia preenchia a função inquisitorial, por delegação do Santo Ofício de Lisboa, com todo o aparato burocrático da Inquisição, tendo havido quatro visitações do tribunal português na Bahia (1591/1593 e 1618), em Pernambuco (1594-1595) e no Pará (1763-1769). Após quase 300 anos de atividade, o Tribunal do Santo Ofício foi extinto em 1821, por decisão da assembleia constituinte portuguesa – criada após revolução liberal do Porto. A extinção do tribunal foi uma adequação inevitável da sociedade portuguesa às “luzes do século” [Ver iluminismo].

 

TRIGO

Gramínea cujo grão está presente na alimentação da humanidade e de animais desde a surgimento da agricultura, cuja origem provável é o Oriente Médio. Da Mesopotâmia, o trigo se espalhou pelo mundo, chegando à Europa durante o expansionismo romano. E, através das navegações do século XVI, os europeus levariam o trigo ao Novo Mundo. Chegou às terras brasileiras em 1534, trazido por Martim Afonso de Souza, que desembarcou na capitania de São Vicente. O clima quente dificultou a expansão da cultura, sendo seu consumo restrito, já que havia também uma preferência pela farinha de mandioca. A partir do século XVIII, começou a se expandir comercialmente para o sul da colônia.

 

TRÍPOLI

Antiga cidade fenícia fundada sete séculos antes da era cristã. Ao longo da sua história, foi ocupada por gregos, romanos e cartagineses. No século VII da era comum, caiu sob dominação de dinastias muçulmanas baseadas no Cairo. Na década de 1550, o Império Otomano estabeleceu, na antiga Trípoli, mais uma das suas bases reforçadas, após vencer tropas espanholas que haviam dominado a região por algumas décadas a partir do início daquele século. Como ocorreu em outras localidades do norte da África, o poder direto do Império Otomano acabaria se flexibilizando a partir do século XVIII; no caso de Trípoli, os novos governantes locais manteriam, contudo, ligações com Istambul, conservando, inclusive, o título de bei – originalmente uma denominação otomana para o governador de província. No início do século XIX, a regência de Trípoli, junto a outras regências do Magreb (Túnis, Argel, e o sultanato independente do Marrocos), envolveu-se em um conflito com os Estados Unidos, de quem os corsários locais vinham recebendo dinheiro em troca de proteção aos navios norte-americanos que circulavam no Mediterrâneo, conforme um tratado assinado em 1796. O conflito durou quatro anos, até a assinatura de um acordo de paz em 1805.

 

TRONCO

Na Idade Média, esse instrumento de tortura era extremamente comum nas praças das vilas e cidades, deixando o condenado ao suplício exposto às intempéries, aos ratos e insetos e aos insultos públicos. No Brasil, era comum, no período de escravidão, que cada fazenda possuísse um tronco no terreiro, usado pelos senhores e seus feitores para punir o escravo por “desobediência” ou tentativa de fuga. Formado por duas peças de madeira retangular, presas em uma das extremidades por dobradiças de ferro e na outra um cadeado, com orifícios onde eram encaixados o pescoço, pulsos e tornozelos do escravo, que ficava ali cativo por dias e noites.

 

TROPAS DE COMISSÁRIOS

Após a assinatura do Tratado de Madrid em 1750, que buscava pôr fim às questões fronteiriças entre as possessões ibéricas, foram criadas duas tropas de comissários encarregados de assentar tais limites: uma pela bacia do Amazonas e outra pelo rio Prata. Em 17 de janeiro de 1751, foi assinado o Tratado de Instruções para os Comissários do Sul e à 24 de junho de 1752, referendou-se o Tratado das Instruções dos Comissários da Banda do Norte. As comissões demarcadoras do Norte e do Sul dividiram-se em tropas ou partidas de comissários subalternos, para facilitar o trabalho das demarcações nas respectivas regiões. Portugal contratou geógrafos, cartógrafos, astrônomos e matemáticos estrangeiros especialmente italianos, para integrar as comissões demarcadoras, responsáveis pelos trabalhos de campo das demarcações de limites (raias) e pela realização das observações físicas e astronômicas, para a confecção das cartas geográficas. Os trabalhos de campo das demarcações de limites se estenderam até o ano de 1761 quando, então, foi assinado a Convenção de El Pardo, que anulou as decisões do Tratado de Limites de 1750. Os portugueses conservaram a Colônia do Sacramento e renunciaram a posse dos Sete Povos das Missões, que ficariam em poder da Companhia de Jesus ou da Cora espanhola.

 

TROPAS DE [PRIMEIRA] LINHA

Ver MILITARES.

 

TÚNIS

A regência de Túnis, atual Tunísia, localiza-se no norte da África – Magreb –, berço da civilização cartaginesa, que teve seu apogeu no século III a.C., antes de sucumbir ao Império Romano. A partir de meados do século XVI, foi um beilhique – estado vassalo de um sultanato do Império Otomano. Os seus governantes, como de outras províncias da região, eram chamados de Bei, até o ano de 1881, quando se torna protetorado da França. Originalmente "bei" era um governador civil do Império Otomano, mas ao longo da sua história a denominação definiu várias formas de vassalagem como também de aliança, sob diversos graus de dependência e subordinação ao sultão de Constantinopla. Túnis era um centro irradiador de poder e uma das duas cidades economicamente mais importantes do norte da África, ao lado de Trípoli. A regência de Túnis armava corsários, que costumavam agir na região do estreito de Gibraltar, assaltando cidades costeiras de Portugal, e tinham em seu poder numerosos cristãos. O marquês de Nisa, com sua esquadra no Mediterrâneo, entre 1798 a 1800 e com o apoio diplomático da Inglaterra, estabeleceu tréguas com as regências de Túnis e Trípoli.

 

TURBILHÃO CARTESIANO

A expressão “turbilhão cartesiano” faz alusão a René Descartes, um dos expoentes da Revolução Científica ocorrida entre os séculos XVI e XVII, em que as estruturas do pensamento, sobretudo no plano científico, passaram a ser questionadas. Até então, explicações teológicas e metafísicas, apoiadas principalmente pela Igreja Católica, dominavam os estudos em torno dos fenômenos da natureza. Novas descobertas científicas, no entanto, fundamentadas em explicações racionais, revelavam que essas antigas concepções não mais satisfaziam um homem ciente de uma maior objetividade que o levasse a compreender fenômenos e leis que regiam a natureza e consequentemente, o seu mundo cotidiano. Era o surgimento da ciência e da filosofia modernas que, para além do campo científico, trariam novas ideias sobre as relações entre indivíduo, sociedade e Estado. Essas concepções se alastraram pela Europa e integram diretamente o movimento Iluminista, que contestou frontalmente as instituições do Antigo Regime, derrubado na França em 1789 por revolucionários inspirados pela filosofia das luzes. Com Napoleão Bonaparte, os ideais da Revolução Francesa foram impostos à força em vários países, o que representou para homens como o governador da capitania de Pernambuco, Caetano Pinto de Miranda Montenegro um verdadeiro “turbilhão” movido pela força das perigosas ideias francesas.

 

TUTELA

A função do tutor no mundo luso-brasileiro foi compilada pela primeira vez em lei nas Ordenações Afonsinas entre 1446 e 1448, muito inspiradas pelo direito romano. Tais ordenações tratavam dos encargos e obrigações dos tutores – então chamados guardadores – e estabeleceram as bases do que se firmou com as Ordenações Filipinas em 1603. Nesta compilação, os termos tutor e curador aparecem como sinônimos, ao passo que guardador cai em desuso. A diferença entre o tutor e o curador, estabelecida pelo direito romano, previa que o primeiro fosse responsável pela pessoa do órfão ou incapaz e, o segundo, se ocupasse dos bens do mesmo. Na prática, no Império português, os dois termos eram usados para designar a mesma pessoa e as funções se sobrepunham, sendo, basicamente, “promover com zelo e exatidão em favor de pessoa impedida o negócio que lhe é encarregado”, podendo ser órfão, idoso ou deficiente. Os tutores eram responsáveis por prover educação e subsistência aos órfãos, cuidar de seus bens até que estes atingissem a maioridade (25 anos), garantindo o retorno do patrimônio inalterado com os rendimentos previstos ao legítimo dono, e até mesmo, promover e autorizar o casamento dos menores de idade. Não era raro que irmãos pudessem ter tutores diferentes ou que um mesmo órfão tivesse mais de um curador, caso herdasse bens imóveis em mais de uma região no Reino, ficando cada um responsável por uma localidade. Os tutores poderiam ser uma pessoa indicada pelo pai ou pelo avô no testamento, normalmente da família, mas não obrigatoriamente, chamado tutor testamentário. Poderiam ser também, parentes próximos homens, salvo poucas exceções, possuidores de posses e capazes de gerir os bens dos órfãos sem prejuízo a eles, chamados tutores legítimos. Ainda existiam os tutores dativos: pessoas indicadas para a função pelos alcaides e alvasis, que atuavam como juízes no âmbito municipal, até a criação do cargo de juiz de órfãos pelo Código Filipino, que passou a ser o encarregado de nomear e confirmar tutores, bem como de fiscalizá-los. Embora a lei previsse penas muito duras aos tutores que não cumprissem com suas obrigações ou negligenciassem o cuidado com os órfãos e seus bens, havia muitos casos não previstos que eram encaminhados diretamente aos secretários de Estado e ao próprio monarca, como no caso de troca de tutor ou curador, ou mesmo substituição no caso de falecimento ou incapacidade deste. Caso a mãe morresse, a tutela era automaticamente revertida ao pai, que se tornava curador dos bens dos filhos. No caso de o pai falecer, o órfão poderia ficar com a mãe legítima e natural, caso esta não se casasse novamente. Se contraísse matrimônio, automaticamente perdia o direito à tutela dos filhos, que passavam a algum parente mais próximo, preferencialmente o avô, e depois a outros familiares mais próximos ao órfão. Ao longo do século XIX, houve forte pressão de advogados e juízes para que a tutela do órfão seguisse naturalmente para a mãe, e somente na incapacidade desta, para avós ou outros parentes, o que somente se concretizou amplamente no Brasil com a criação do Código Civil em 1916, já no período republicano.

 

TULHA

Grande recipiente utilizado para colocar o açúcar depois de retirado das formas.

 

 

 

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