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Sala de aula

Escrito por cotin | Publicado: Quarta, 07 de Novembro de 2018, 16h15 | Última atualização em Quinta, 27 de Dezembro de 2018, 19h17

Requerimento da congregação de Santa Cruz dos Milagres de Goa

Informe da Secretaria de Estado do Ministério do Reino à Chancelaria da Relação de Goa sobre o requerimento da congregação de Santa Cruz dos Milagres de Goa solicitando ao príncipe regente que proibisse as denúncias contra esta igreja, que a impediam de manter os bens que garantiam seu sustento. Entre os bens da igreja estavam as propriedades concedidas pelos antigos reis de Portugal, anteriores a d. João VI. Consta do requerimento o grande serviço que a congregação prestava ao Estado português na propagação do evangelho tendo, inclusive, após a expulsão dos jesuítas de Goa, os padres desta igreja passado a exercer a função de inquisidores na Mesa do Santo Ofício, assim como também ficaram encarregados do ensino público nos colégios de Rachol e Chorão. Apresenta ainda a situação de penúria da congregação naquele momento, que foi obrigada a ficar endividada na tentativa de não deixar faltar comida a seus missionários, pois “há mais de sete anos tem chegado a diminuir parte para a ração destinada para o sustento individual”.      

Conjunto documental: Secretaria de Estado do Ministério do Reino
Notação: caixa 645, pct. 5, pacotilha 3
Datas-limite: 1707-1821
Título do fundo ou coleção: Negócios de Portugal
Código do fundo ou coleção: 59
Argumento de pesquisa: Damão, cidade de; Damão, porto de
Data do documento: 8 de janeiro de 1816
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 1 a 3

 

Informe Chanceler da Relação de Goa com o seu parecer fazendo as diligências que lhe parecerem próprias. Rio em Mesa 8 de Janeiro de 1816.

Diz a congregação de Santa Cruz dos Milagres de Goa[1] que sendo ela sido estabelecida e confirmada pelos augustos predecessores de vossa alteza real e tomada de baixo da sua real proteção: Documento nº 1º e sendo indispensavelmente preciso para sua manutenção, que possuíssem alguns bens de raiz[2], foram os mesmos augustos senhores reis de Portugal, servidos conceder-lhe essa graça, a que em parte tem sido dominada para que se acham sem render as propriedades uma chamada Bamonabatta com seus anexos de pedaços pequenos de várzeas sita na aldeia de Murda das Ilhas de Goa; outra que foi de Miguel Pires de Carvalho situada em Carbolindas mesmas ilhas; terceira chamada Ambecarddoem, que foi de Francisco de Brito Rosário situada na aldeia de Meirut terras de Bardez, a quarta de Malna situada na aldeia de Pilerne da mesma província de Bardez, causando um abatimento em quase mil e noventa reis.

Documento nº 2º e o mesmo vice-rei Vasco Fernandez Cezar de Menezes ouvindo o procurador da Coroa e Fazenda concedeu a mesma licença de baixo da cláusula da aprovação real, a qual licença não teve efeito para que os suplicados não tiveram naquele tempo mesmo nem proporções de se poderem aproveitar dela. Documento nº 3º [sic]

A suplicante congregação é sem dúvida uma das mais úteis ao Estado de vossa alteza real na propagação do evangelho desde o seu estabelecimento:

Os arcebispos primazes, os vice-reis, e governadores da Índia tem empregado seus padres em diversas missões[3], e nas mais arriscadas como Timor, Ceilão, Damão, Malabar, Goa, e nas províncias e mais partes, umas vezes por ordens suas, e outras da mesma Corte como se vê de todas os documentos de baixo do nº 4º e ainda nas ocasiões que se lhe ofereceram de subscrições e outras deste Estado, se tem mostrado pronta e obediente a vontade de seus augustos soberanos e amante do Estado. Documento nº 5º; as freiras recolhidas, os sentenciados a último suplício e os povos os pedem sempre com preferência para a direção de suas almas. Documento nº 6º, e os de que deste Estado saíram os jesuítas têm sido empregados no ensino público dirigindo os dois colégios de Rachol e Chorão[4].

Documento nº 7º, e na mesma Corte tem reconhecido o bom serviço destes Padres documento nº 8º [sic]. Os inquisidores apostólicos, depois de que saíram de Goa os ditos jesuítas tem empregado os seus padres na instrução dos réus penitenciados pela Mesa do Santo Ofício.

Documento nº 9º

Acontece augusto e pio senhor que presentemente tendo diminuído as mesquinhas rendas dos conventos dos suplicantes muito consideravelmente pelas ocorrências [...], e pelo baixo preço dos gêneros muito principalmente do coco que faz a principal parte de suas rendas e vendo-se eles na precisão de conservarem o mesmo número de religiosos para acudirem ao ensino ao ensino dos colégios, as missões de que se acham encarregadas, e ao mais deveres, a que se vê chama o seu Ministério apesar de terem diminuído todas as despesas ainda mesmo algumas das mais necessárias, tem ficado para alguns anos obrigada a se empenhar endividada só assim de não faltar quanto fosse indispensável para a primeira necessidade, pois há mais de sete anos tem chegado a diminuir parte para a ração destinada para o seu sustento individual, como se vê no documento nº 10º. A suplicante Congregação detido se aniquilará se vossa alteza real por sua inata bondade, e clemência se não compadecer do seu estado atual, por quanto tendo ela recebido alguns legados pois com encargos de missas, e de outros hipotecados para vários devedores do dinheiro do fundo de vários encargos e pensões, e sentenciado como de empenho todos os encargos respectivos vários indivíduos levados mais de ânimo fazerem mal do que outro fim tem denunciado alguns destes bens do Juiz dos Feitos da Coroa e Fazenda[5] e suposto que uma destas denúncias foi julgada improcedente, contudo a suplicante Congregação receia que continuem a serem vexados, e portanto prostrada ante o trono de vossa alteza real.

Pede a vossa alteza real pela sua alta grandeza pela conservação da religião neste Estado e pelas chagas de nosso senhor que vossa alteza real haja por bem proibir, que se denunciem os bens que possui a Suplicante consistentes da sexta junta; bem como vossa alteza real já foi servido determinar neste Estado relativamente as confrarias do Santíssimo Sacramento, e o mesmo vice-rei já assim determinou relativamente as igrejas; como conceder-lhe a licença para possuir os mesmos bens como até agora possui: A suplicante Congregação não cessa de rogar diariamente pela feliz conservação de vossa alteza real de sua real família, e felicidade de suas armas para sossego de nossa pátria comum, e todos os seus fiéis vassalos.

E receberá mercê.

 

[1] Criada em 1682, foi reconhecida formalmente pelo papa Clemente XI apenas em 1707. Desde o início constituiu-se em importante “braço” no processo de cristianização em Goa. Em 1759, com a expulsão dos jesuítas, a congregação assumiu a frente dos principais colégios católicos na região – Chorão e Rachol – e passou a ser considerada como o mais importante grupo religioso do Estado das Índias ficando, ainda, encarregado do Tribunal do Santo Ofício.

[2] São os bens imóveis, frequentemente relacionados à terra. Além dos terrenos propriamente ditos, as construções também são consideradas bens de raiz.

[3] Aldeamentos constituídos, quase sempre em regiões coloniais, com a finalidade de catequizar e civilizar as populações nativas de não-cristãos e como parte importante do domínio e imposição cultural da metrópole sobre suas colônias. A ação da Igreja católica no Brasil foi inerente ao processo de colonização da América portuguesa. Durante boa parte do período colonial, a catequização e o ensino na colônia ficariam ao encargo das ordens religiosas, sobretudo os jesuítas. As missões ou reduções, foram aldeamentos erigidos no interior do território com a finalidade de catequizar e civilizar os índios. Até 1580 somente os jesuítas tinham autorização para estabelecerem-se na colônia, mas isso mudou com anexação de Portugal à Espanha – período da União Ibérica – e outras ordens religiosas fundadas no período medieval instalaram-se no Brasil, como os franciscanos, carmelitas, beneditinos e capuchinhos. As missões religiosas possibilitavam, além da conversão, o processo de conquista da terra pelos portugueses. A política de construção de aldeamentos em variados pontos do sertão foi fundamental para a ocupação do vasto território colonial. O sucesso das missões suscitou conflitos entre colonos e missionários, principalmente no que diz respeito ao controle da mão de obra indígena: as reduções dependiam da força de trabalho compulsória dos índios aldeados, já os colonos ambicionavam a escravização dos indígenas, em especial, aqueles já “domesticados” pelos religiosos e habituados ao trabalho. A legislação real não se mostrou eficaz na solução desses conflitos e o período colonial assistiria às crescentes hostilidades entre missionários e colonos. O declínio das reduções iniciou-se com a expulsão dos jesuítas das colônias portuguesas e espanholas a partir do século XVIII.

[4] Foram os dois principais colégios de educação católica em Goa, além de abrigarem em suas instalações muitas das principais autoridades religiosas da região. Lá se formavam padres e partiam religiosos rumo a várias localidades da Ásia. Chorão foi criado em 1559 e Rachol concluído completamente em 1609, embora a primeira pedra para sua construção tenha sido erguida em 1580. Mas as atividades missionárias nas duas regiões onde se construíram tais seminários são ainda mais antigas, datando do início do século XVI.

[5] Juízo responsável por processar os bens de devedores de impostos ou que estivessem em débito com quaisquer obrigações financeiras com a Coroa. O devedor, passado certo prazo para quitação, caso não o fizesse, poderia ser executado em juízo e, em última instância, ver seus bens irem a leilão ou serem incorporados ao patrimônio da Coroa. Possuía, também, a incumbência de fiscalizar e de legislar sobre terras públicas. Era comum o recebimento de denúncias sobre terras da Coroa que estariam sendo utilizadas por outrem sem a devida propriedade; daí a questão era julgada e o denunciante poderia requerer alvará de Mercê para utilizar a terra, caso esta fosse retirada dos denunciados. Foi criado como parte constituinte da Relação do Rio de Janeiro, em 1751. Antes disso, existia Juiz dos Feitos da Corroa, Fazenda e Fisco na Relação da Bahia, fundada em 1609.

Carta sobre a deplorável situação das colônias na Ásia

Cópia da carta do secretário de Estado da Marinha e Ultramar Martinho de Melo e Castro para o marquês de Lavradio, d. Luís de Almeida Portugal, vice-rei do Brasil, relatando sobre a deplorável situação em que as colônias portuguesas na Ásia se encontravam, e sobre as ordens da rainha ao saber do ocorrido, estabelecendo novas leis, regulações e ordens. D. Maria I ordenou que fosse indispensável o reestabelecimento da Marinha de Goa, que se formassem novas tropas, e que fosse mandada para o porto de Goa uma nau com o capitão de guerra e mar, o capitão general do Estado da Índia, os ministros de Justiça, os oficiais de mar e terra e as tropas, petrechos e provisões de guerra, que fariam escala no Rio de Janeiro para que lá tomassem as provisões necessárias para a viagem.

Conjunto documental: Correspondência da Corte com o Vice Reinado
Notação: códice 67, vol. 5
Datas-limite: 1769-1778
Título do fundo ou coleção: Secretaria de Estado do Brasil
Código do fundo ou coleção: 86
Argumento de pesquisa: Goa, cidade de; Goa, porto de
Data do documento: 18 de fevereiro de 1774
Local: Lisboa
Folha(s): 38

 

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Ilustríssimo e excelentíssimo senhor tendo chegada a real presença de sua majestade a deplorável solução em que se acham os seus domínios na Ásia, e querendo o mesmo senhor socorrer aquele Estado, entendeu que as forças mais sólidas eficazes que lhe podia mandar eram as leis, estatutos e regulações, e ordens, que presentemente lhe remete. Para com elas estabelecer no mesmo Estado e uma nova, e bem depurada forma de governo político, civil e econômico, acomodada e conforme as circunstâncias de seus atuais habitantes.

Entendeu igualmente sua majestade que para segurar, e fazer respeitáveis aqueles domínios portugueses, lhe era indispensavelmente necessário levantar a tropa e Marinha de Goa do abatimento, e relaxações a que se acha reduzida, e com este fim ordenou que os dois regimentos de guarnição[1] daquela capital se reduziram ao [ilegível] das tropas estabelecidas neste reino, e que além deles se levantassem, mais um regimento de infantaria[2], outro de artilharia[3], e que os ‘Sipais[4] se formassem sobre o pé, e disciplina do corpo extinto dos voluntários reais.

Com estas ordens, e este fim mandou sua majestade sair deste porto a nau por invocação Nossa Senhora Madre de Deus, comandado pelo capitão de mar e guerra Joseph Sanches de Brito, e a fragata Nossa Senhora da Guia comandada pelo capitão mor de mar e guerra Isidoro de Moura, as quais levando a seu bordo o governador, capitão general do Estado da Índia d. José Pedro da Câmara, os ministros de Justiça, os oficiais de mar e terra; a tropa e os petrechos e provisões de Guerra, que vão embarcados na mesma nau, e fragata[5], fizessem escala pelo porto do Rio de Janeiro para nele tomarem os refrescos e provisões necessárias, e demorando-se no referido porto a preciso termo de três semanas o mais, no fim deles prosseguiram a sua viagem para Goa.

Nesta inteligência ordena majestade que vossa excelência mande assistir a referida nau, e fragata com tudo quanto lhes for preciso, removendo qualquer embaraço que possa ocasionar-lhes maior dilação, e dando todas as providências que julgar convenientes para que não experimentem a menor falta. Advirto porém a vossa excelência que entre as provisões, que se meterem a bordo, senão deve permitir de sorte [ilegível] gado vacum, por ter sua majestade defendido este artigo como sua perniciosa relaxação de sua Marinha, que reduz as naus e fragatas, que só devem servir para a guerra, em imundos currais, para uso, ou abuso das suas equipagens. Guarde a vossa excelência. Palácio da Nossa Senhora da Ajuda 18 de fevereiro de 1774 = Martinho de Melo e Castro = Senhor Marquês de Lavradio.

 

[1] Unidade militar composta de dois ou mais batalhões que está encarregada de guarnecer uma posição específica dentro do território, em caso de guerra, ou de proteger alguma fortificação.

[2] É a mais antiga das armas militares, geralmente, a que tem um dos maiores, senão o maior efetivo. Caracteriza-se pelo combate a pé. Até o século XVII, o exército português era constituído basicamente de duas armas: a cavalaria e a infantaria. A nobreza do reino pertencia, essencialmente, à cavalaria. Porém, os conhecimentos militares que mais se desenvolviam nessa época, eram os ligados à artilharia e à engenharia, que ainda não constituíam armas independentes, mas faziam parte da infantaria.

[3] Nas forças militares, é o conjunto de combatentes que se destina à guarda e manejo dos materiais de guerra, como canhões, projéteis e veículos destinados ao seu acondicionamento e transporte. Seu desenvolvimento corresponde ao aperfeiçoamento e modernização do Exército, em destaque a partir de meados do século XVII. A engenharia manteve-se atrelada à artilharia até fins do Setecentos e início do Oitocentos. Os artilheiros eram considerados, também, engenheiros militares, recebendo formação acadêmica nessa área. Foi criada no Brasil, em 1696, na então capital São Salvador, uma escola de artilharia e arquitetura militar, marcando a preparação e treinamento de militares na colônia brasileira.

[4] Sipai ou sipaio. Soldado de origem indiana que fazia parte das tropas portuguesas. Portugal manteve forças de sipaios no seu Estado português da Índia e, mais tarde, em outros dos seus territórios ultramarinos, sendo o maior contingente de sipaios estabelecido em Moçambique. Foram utilizados em larga escala pelos ingleses em suas atividades militares e comerciais no Oriente.

[5] As fragatas eram navios de guerra que, apesar de terem o mesmo comprimento, eram mais estreitas, o que lhes conferiam maior agilidade e velocidade frente às naus. Eram usadas em missões de escolta ou reconhecimento territorial e movidas por propulsão à vela. Em meados do século XIX, se desenvolveram as fragatas mistas e a vapor.

 

Criação da Junta da Fazenda Real em Goa

Carta expedida pela Secretaria de Estado da Fazenda, por ordem do rei de Portugal d. José I, a d. João José de Melo, governador do Estado da Índia, na qual explicava que devido ao grande “atraso, descuido e malícia dos oficiais da Fazenda” daquele Estado, deveria ser criada uma Junta da Fazenda Real, sendo sua função arrecadar os rendimentos e administrar os bens confiscados. Para que isso ocorresse, dever-se-ia criar um cofre, pelo qual seriam responsáveis o tesoureiro-geral, o escrivão e o contador.

Conjunto documental: Registro de ordens expedidas do Real Erário para a Índia sobre a Fazenda Real
Notação: códice 517
Datas-limite: 1769-1777
Titulo do fundo ou coleção: Negócios de Portugal
Código do fundo ou coleção: 59
Argumento de pesquisa: Goa, cidade de; Goa, porto de
Data do documento: 10 de abril de 1769
Local: Salvaterra de Magos
Folha(s): 1-3

 

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Carta régia expedida pela Secretaria de Estado, respectiva, ao governador, e capitão general do Estado da Índia[1], para se estabelecer uma Junta da Fazenda Real; cuja cópia se dirigiu a este Real Erário[2] donde se acha registrada na Contadoria Geral, competente.

Dom João José de Melo, governador, e capitão general do Estado da Índia. Amigo eu el-rei[3] vos envio muito saudar. Sendo-me presente o grande atrasamento, e decadência em que se acha a arrecadação da minha Real Fazenda por causa dos muitos descaminhos que nel[a] há procedidos dos descuidos e malícia dos oficiais da Fazenda desse Estado: sou servido ordenar, que para obviar a tão perniciosos abusos, nessa capital se estabeleça uma Junta, a que presidireis por vós, e vossos sucessores assistindo o vedor da Fazenda, o chanceler da Relação[4], o procurador da Coroa e outrossim assistirão o tesoureiro geral, e o escrivão da Junta, ou quem seus lugares servirem para proporem, e votarem nos particulares concernente a boa arrecadação da minha Real Fazenda. E porque da pontualidade e exatidão dos pagamentos, e da arrecadação da mesma Real Fazenda depende não só a autoridade da minha coroa, mas também a segurança, e a subsistência dos meus fiéis vassalos[5]. Sou outrossim servido, que na casa onde se tiver a sobredita Junta, se estabeleça um cofre com três chaves das quais terá uma o tesoureiro geral, e outra o escrivão, e a terceira o contador, no qual se reponham todos os rendimentos desse Estado, e se façam os pagamentos nas tardes certas de cada semana, que julgares necessário estabelecer para os ditos efeitos, recebendo-se neste cofre geral com a devida distinção, e arrecadação tudo que se cobrar dos rendeiros, com os quais se recensearão as contas no fim de cada ano, e se ajustarão finalmente no fim de cada triênio, procedendo-se bem assim ao tempo do dito recenseamento, como também ao do referido ajuste final contra os devedores executivamente, como se costuma proceder pelas dívidas da minha Real Fazenda. E faltando o vedor da Fazenda que ora é, e ao diante for, aos referidos procedimentos, o hei logo por suspenso, e ainda pelo simples fato de não os haver praticado a seus devidos tempos até nova mercê minha; além de pagar por seus bens à minha Real Fazenda todo o prejuízo que resultar da sua omissão; e a referida Junta nomeará logo serventuário para exercer o sobredito emprego. No caso porém não esperado de que a mesma Junta omita a referida suspensão, e os mais procedimentos acima ordenados, ficará também responsável subsidiariamente pelas ditas moras, e omissões de pagamentos, para se proceder por elas contra os bens das pessoas por quem é constituída, ou [insolidum] contra qualquer delas, ou em geral contra todas [pro rata], como mais convier a minha Real Fazenda, e eu houver por bem determinar. Confio do zelo com que me serviu concorrereis da vossa parte com a maior atividade, para que tenha o seu devido efeito esta minha real resolução, pelas quais sou servido abolir a outra Junta, que havia determinado para a arrecadação dos bens vagos pela extinção dos regulares da Companhia denominada de Jesus[6], para ficarem debaixo da administração, e arrecadação desta Junta novamente criada, e escriturando-se o que pertencer aos sobreditos bens vagos em livros, e contas separadas, pelo método, que para este efeito, vos será remetido pelo inspetor geral do meu Real Erário. Escrita em Salvaterra de Magos a dez de abril de mil setecentos sessenta e nove. Rei. Para dom João José de Melo.

 

[1] Região da Ásia meridional ligada à península Indochinesa. Desde o século XII os artigos orientais, como as especiarias, já se faziam presentes no comércio português, tornando-se em pouco tempo os produtos mais lucrativos no comércio europeu. A partir de 1453, quando Constantinopla e a rota de envio desses produtos para a Europa caiu sob o domínio turco, esses produtos sofreram uma alta abrupta de preços, colocando a necessidade de se buscar um caminho alternativo que possibilitasse aos comerciantes lusos tratar diretamente com os do Oriente. Esse foi um dos principais propulsores da expansão marítima do século XV, cuja finalidade era chegar às Índias, onde se poderia obter as tão cobiçadas especiarias, além de tecidos, porcelanas, chás, marfim, entre outros produtos de luxo. Vasco da Gama chegou a Calicute, no sudoeste da Índia, em 1498. Sete anos mais tarde, foi fundado o estado da Índia, colônia portuguesa com sede do governo em Cochim. Em 1530, a capital foi transferida para Goa, de onde o governador exercia sua autoridade sob as possessões portuguesas no Oceano Índico.

[2] Instituição fiscal criada em Portugal, no reinado de d. José I, pelo alvará de 22 de dezembro de 1761, para substituir a Casa dos Contos. Foi o órgão responsável pela administração das finanças e cobrança dos tributos em Portugal e nos domínios ultramarinos. Sua fundação simbolizou o processo de centralização, ocorrido em Portugal sob a égide do marquês de Pombal, que presidiu a instituição como inspetor-geral desde a sua origem até 1777, com o início do reinado mariano. Desde o início, o Erário concentrou toda a arrecadação, anteriormente pulverizada em outras instâncias, padronizando os procedimentos relativos à atividade e serviu, em última instância, para diminuir os poderes do antigo Conselho Ultramarino. Este processo de centralização administrativa integrava a política modernizadora do ministro, cujo objetivo central era a recuperação da economia portuguesa e a reafirmação do Estado como entidade política autônoma, inclusive em relação à Igreja. No âmbito fiscal, a racionalização dos procedimentos incluiu também novos métodos de contabilidade, permitindo um controle mais rápido e eficaz das despesas e da receita. O órgão era dirigido por um presidente, que também atuava como inspetor-geral, e compunha-se de um tesoureiro mor, três tesoureiros-gerais, um escrivão e os contadores responsáveis por uma das quatro contadorias: a da Corte e da província da Estremadura; das demais províncias e Ilhas da Madeira; da África Ocidental, do Estado do Maranhão e o território sob jurisdição da Relação da Bahia e a última contadoria que compreendia a área do Rio de Janeiro, a África Oriental e Ásia. Por ordem de d. José I, em carta datada de 18 de março de 1767, o Erário Régio foi instalado no Rio de Janeiro com o envio de funcionários instruídos para implantar o novo método fiscal na administração e arrecadação da Real Fazenda. Ao longo da segunda metade do século XVIII, seriam instaladas também Juntas de Fazenda na colônia, subordinadas ao Erário e responsáveis pela arrecadação nas capitanias. A invasão napoleônica desarticulou a sede do Erário Régio em Lisboa. Portanto, com a transferência da Corte para o Brasil, o príncipe regente, pelo alvará de 28 de junho de 1808, deu regulamento próprio ao Erário Régio no Brasil, contemplando as peculiaridades de sua nova sede. Em 1820, as duas contadorias com funções ultramarinas foram fundidas numa só: a Contadoria Geral do Rio de Janeiro e da Bahia. A nova sede do Tesouro Real funcionou no Rio de Janeiro até o retorno de d. João VI para Portugal, em 1821.

[3] Sucessor de d. João V, foi aclamado rei em setembro de 1750, tendo sido o único rei de Portugal a receber este título. Considerado um déspota esclarecido – monarcas que, embora fortalecessem o poder do Estado por eles corporificado, sofriam intensa influência dos ideais progressistas e racionalistas do iluminismo, em especial no campo das políticas econômicas e administrativas – ficou conhecido como o Reformador devido às reformas políticas, educacionais e econômicas propostas e/ou executadas naquele reinado. O governo de d. José I destacou-se, sobretudo, pela atuação do seu secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, marquês de Pombal, que liderou uma série de reestruturações em Portugal e seus domínios. Suas reformas buscavam racionalizar a administração e otimizar a arrecadação e a exploração das riquezas e comércio coloniais. Sob seu reinado deu-se a reconstrução da parte baixa de Lisboa, atingida por um terremoto em 1755, a expulsão dos jesuítas do Reino e domínios ultramarinos em 1759, a guerra guaranítica (1754-56) contra os jesuítas e os índios guaranis dos Sete Povos das Missões, a assinatura do Tratado de Madri (1750), entre Portugal e Espanha que substituiu o Tratado de Tordesilhas, entre outros. Em termos administrativos, destacam-se a transferência da capital da colônia de Salvador para o Rio de Janeiro, a criação do Erário Régio e a divisão do antigo Estado do Grão-Pará e Maranhão em dois: Maranhão e Piauí, e Grão-Pará e Rio Negro.

[4] O Tribunal da Relação de Goa foi instituído em 1554. Com o objetivo de servir como tribunal de segunda instância não só das Índias portuguesas, mas também das regiões próximas – Moçambique, por exemplo, ficava dentro de sua jurisdição –, o tribunal estava subordinado à Casa de Suplicação de Lisboa. Composta por desembargadores, a Relação tinha cargos de ouvidor-geral, chanceler, desembargadores dos Agravos e Apelações, desembargadores Extravagantes, Juízes, Procuradores dos Feitos da Coroa e Provedores dos Defuntos e Resíduos, servindo de base e experiência para a Relação que seria criada no Brasil, algumas décadas depois, em 1609, na Bahia. O governador geral das Índias também intervinha no tribunal, presidindo suas sessões como regedor e dispondo da Relação como um conselho consultivo para assuntos políticos e administrativos.

[5] Súdito do rei, independentemente de sua localização no Império. Até o século XV, o título “vassalo” era empregado para designar homens fiéis ao rei, aqueles que o serviam na guerra, sendo, portanto, cavaleiros ou nobres de títulos superiores. Em troca do apoio e serviços realizados, recebiam tenças (pensões), dadas, inicialmente, a todos os vassalos e seus filhos varões. Na medida em que se pulverizaram as distribuições destes títulos, principalmente por razões de guerra (a conquista de Ceuta foi a mais significativa nesse processo), e que eles começaram a ser mais almejados, principalmente pelos plebeus e burgueses em busca de mercês e de aproximação com a realeza, o rei diminui a concessão dos títulos, e, mais importante, das tenças. A esta altura, as dificuldades financeiras da monarquia também empurraram para a suspensão da distribuição dos títulos e benefícios. O rei passa, então, a conceder mercês e vantagens individuais, e o termo vassalo se esvazia do antigo significado de título, passando a indicar homens do rei, súditos e habitantes do reino, de qualquer parte do Império.

[6] Ordem religiosa fundada em 1540 por Inácio de Loyola e marcada por severa disciplina, profunda devoção religiosa e intensa lealdade à Igreja e à Ordem. Criada para combater principalmente o protestantismo, sua fundação respondeu à necessidade de renovação das ordens regulares surgida das determinações do Concílio de Trento (1545-1563). A instalação da Companhia de Jesus em Portugal e nos seus domínios ultramarinos deu-se ainda no século XVI. O primeiro grupo de missionários jesuítas chegou ao Brasil em 1549, na comitiva de Tomé de Souza. Seus membros eram conhecidos como ‘soldados de Cristo’, dadas as suas características missionárias. Responsáveis pela catequese, coube também, aos jesuítas, a transmissão da cultura portuguesa nas possessões americanas por meio do ensino, que monopolizaram até meados do século XVIII. Fundaram, por todo território colonial, missões religiosas e aldeamentos indígenas de caráter civilizador e evangelizador. Em fins do século XVII, o modelo missionário já estava bem consolidado, difundido por quase toda a América, e os jesuítas acumulando grande poder. Os primeiros jesuítas a chegar ao Maranhão, em 1615, foram os padres Manuel Gomes e Diogo Nunes, detentores de uma posição privilegiada na região, tanto na evangelização e defesa dos índios, quanto no monopólio do comércio e armazenamento das drogas. São de religiosos da Companhia de Jesus relatos sobre os primeiros séculos da colonização. O padre italiano João Antonio Andreoni (André João Antonil) publicou em 1711 Cultura e opulência no BrasilHistória da Companhia de Jesus no Brasil escrito por Serafim Leite, os dois volumes de Tesouro descoberto no máximo Rio Amazonas (1722-1776) do padre João Daniel, Tratados da terra e gentes do Brasil de Fernão Cardim e os numerosos sermões e cartas da Antonio Vieira são testemunhos importantes e reveladores do Brasil colonial. Os jesuítas também foram os responsáveis por espalhar a língua dos Tupinambá, chamada língua geral (nheengatu), largamente falada no Brasil até meados do século XVIII. O grande poderio e influência dos jesuítas na América portuguesa foram contestados durante a administração pombalina (1750-1777), gerando um conflito de interesses entre a Companhia de Jesus e o governo, que culminou com a expulsão dos membros dessa ordem religiosa em 1759. Cabe ressaltar que a decisão de expulsar os jesuítas de Portugal e de seus domínios, tomada pelo marquês de Pombal, não buscava reduzir o papel da Igreja, mas derivava da intenção de secularizar a educação, dentro dos moldes ilustrados.

 

Alvará sobre os direitos e encargos sobre os navios que partem para Goa

Alvará da rainha Maria I, em 8 de janeiro de 1783, ordenando que as fazendas nacionais ou estrangeiras que fossem enviadas pelo porto de Lisboa para Goa, em navios da Índia ou qualquer outra embarcação portuguesa, teriam de pagar os impostos estabelecidos. Se estes navios fizessem escala pela Ilha da Madeira, Ilha dos Açores ou Brasil, com produtos produzidos somente em tais localidades (vinho, aguardente e açúcar), não pagariam nas alfândegas mais do que 4% das baldeações. Caso os navios portugueses parassem nestes portos apenas como escala, mas negociassem com as fazendas, teriam de pagar os direitos, e ao voltarem para Portugal iriam se restituir. Os navios que importassem as chamadas “fazendas de negros” – de pior qualidade –, ou seja, tecidos de Zuarte, Coromandel, Chellas, Linhas, Cadéas, Languis e Guzerate, pagariam meio direito de entrada e os que exportassem pagariam mais o consulado da saída. Já as “fazendas brancas”, que fossem compradas para pintar ou estampar nas fábricas de Portugal, deveriam pagar os direitos inteiros na entrada, mas ao voltarem essas peças pra Índias, os donos deveriam se restituir delas metade dos direitos pagos. As fazendas da Europa que fossem transportadas para o porto de Goa e que desembarcassem para uso ou para serem remetidas a outros portos, não lhes eram concedidas as baldeações; mas se as fazendas fossem da Ásia, lhes seria concedida a baldeação.

Conjunto documental: Correspondência da Corte com o vice-reinado
Notação: códice 67, vol. 11
Datas-limite: 1783-1783
Título do fundo ou coleção: Secretaria de Estado do Brasil
Código do fundo ou coleção: 86
Argumento de pesquisa: cidade de Goa, porto de Goa
Data do documento: 8 de janeiro de 1783
Local: Lisboa
Folha(s): 5-7v

 

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EU A RAINHA: faço saber a que este alvará virem: que tendo dado diferentes providências, para promover, e animar o comercio, e navegação da Ásia; e desejando continuá-las, em benefício, e utilidade da capital de Goa: Hei por bem ordenar, que todos os gêneros, efeitos e fazendas nacionais, ou estrangeiras, que se despacharem, e embarcarem no porto de Lisboa em navios de viagem da carreira da Índia, ou em outras qualquer embarcações portuguesas, que, como eles, dirigirem a sua navegação, com carga redonda, para o referido porto de Goa, e que neles descarregarem os ditos gêneros, efeitos e fazendas, pagando os direitos[1] ali estabelecidos, ou seja, as ditas fazendas para consumo da terra, ou para depois se exportarem para fora pela via do mar, ou do continente: E fazendo, ou querendo fazer os ditos navios, e embarcações escala, pelas ilhas dos Açores, da Madeira, ou pelos portos do Brasil; e embarcando nelas, ou neles vinhos, água-ardentes[2], açúcares, ou outros quaisquer gêneros da produção tão somente das mesmas ilhas, e Brasil, exceto o tabaco, para serem da mesma sorte transportados ao sobredito porto de Goa, não paguem nas alfândegas de Lisboa, Ilhas, e Brasil, mais que quatro por cento das baldeações.

Ordeno, outrossim, que os navios portugueses, que saírem do porto desta capital, com destino a diferentes portos da Ásia; e que entrando no de Goa por escala, ou de arribada, ou por outro qualquer motivo, ali negociarem com os gêneros, efeitos e fazendas, que levarem da Europa, tirando certidão autêntica da alfândega daquela capital, por onde conste as que efetivamente ali descarregarão, venderão, e pagarão os direitos; apresentando a dita certidão na alfândega de Lisboa, quando voltarem a este reino, se restituirão aos donos da referidas fazendas os direitos, que houverem pago delas na dita alfândega de Lisboa, retendo-se somente quatro por cento de baldeação: E o mesmo se praticará nas alfândegas das sobreditas Ilhas, e Brasil.

Hei outrossim por bem, que todos os gêneros, efeitos e fazendas, ou sejam da produção, e manufatura de Goa, e dos mais domínios portugueses daquele Estado, ou de países estrangeiros da Ásia, e China; ou de outra qualquer parte ao de lá do Cabo da Boa Esperança[3], embarcadas no referido porto de Goa em navios de viagem, ou em outras quaisquer embarcações portuguesas, e transportadas ao porto de Lisboa; sendo aqui vendidas para fora do reino, não paguem mais direito, que quatro por cento de baldeação: e sendo para ficar dentro dele, paguem os direitos de entrada, que se acham estabelecidos: exceto porém, em primeiro lugar, as fazendas de algodão, tais, como Zuartes, Coromandéis, Chellas, Cadeás, Linhas, Languis, e outras de Guzerate, vulgarmente chamadas fazenda de negro; as quais; ou sejam vendidas para dentro, ou para fora do reino, pagarão meios direitos de entrada; e as que se exportarem, pagarão, além deles, o consulado da saída: exceto em segundo lugar, os elefantes, bafetás, callas, doreas, dotiz, e outras fazendas brancas do mesmo algodão, que se comprarem para pintar, ou estampar nas fábricas de tinturaria, estabelecidas em Portugal; as quais fazendas, ainda que devem pagar os mesmos direitos de entrada por inteiro, como as mais fazendas desta qualidade, e que se venderem para dentro do reino; logo que se tornarem a apresentar na casa da Índia pintadas, e estampadas, nas sobreditas fábricas, ou as ditas fazendas venham do porto de Goa, ou de outros portos da Ásia, se restituirão aos donos delas meios direitos, dos que tiveram pago em branco.

Sendo-me presente, que sobre a inteligência da carta régia, dirigida ao governador, e capitão general[4] do Estado da Índia, com data de doze de março de mil setecentos setenta e nove, que permitiu a baldeação do porto de Goa para o desta capital, se tem procurado introduzir alguns abusos, que é preciso desterrar do comércio: Fui servida ordenar ao dito governador, e capital general: Que para os gêneros, efeitos e fazendas da Europa, que se transportarem ao porto de Goa, e que ali se desembarcarem, ou seja para consumo da terra, ou para serem conduzidas a outros portos, se não conceda baldeação: e que para os gêneros, efeitos, e fazendas da Ásia, ou de qualquer outra parte ao de lá do Cabo da Boa Esperança, que se levarem ao referido porto de Goa, para serem transportadas a outros portos da mesma Ásia, ou ao de Lisboa, se conceda a dita baldeação, requerendo-se, na conformidade do capítulo trinta e nove do regimento da Alfândega[5] daquela capital, e da sobredita carta régia[6] de doze de março: Das Fazendas porém, que do porto de Goa, se remeterem ao de Lisboa debaixo da referida baldeação, se formarão na alfândega daquele estado das relações exatas, que venham imediatamente dirigidas ao provedor da Casa da Índia, para que logo que as referidas fazendas chegarem ao porto desta capital, se mandem recolher nos armazéns da dita  Casa da Índia, debaixo da mesma baldeação; e debaixo dela sejam exportadas para fora do reino, sem se conceder aos donos, ou encarregados das ditas fazendas, traspassá-las, ou vendê-las na praça de Lisboa em leilão, ou fora dele, permitindo-lhes tão somente o simples trânsito deste porto, para os países estrangeiros, pagando os quatro por cento de costume.

Sendo o porto, e cidade de Macau, um estabelecimento, que igualmente se faz digno da minha real atenção: Hei por bem ordenar, que todos os gêneros, efeitos, e fazendas nacionais ou estrangeiras; e as de produção, e manufatura das Ilhas dos Açores, e Madeira, ou do Brasil, exceto o tabaco, que se despacharem, e embarcarem no Porto de Lisboa, ou nos daquelas Ilhas, e Brasil, para se transportarem ao referido porto de Macau em navios portugueses, que vão em direitura, ou por escala ao mesmo porto, ou sejam as ditas fazendas para vender na terra, ou para serem transportadas a outros portos na China, e Ásia, não paguem mais direitos no porto de Lisboa, Ilhas e Brasil, que quatro por cento de baldeações: E as que virem em retorno nos mencionados navios, sendo embarcadas em Macau, e vendidas neste reino, pagarão os direitos de entradas, que se acham estabelecidos: Os navios portugueses porém, que fazendo a navegação da China, não entrarem no dito porto de Macau, e que em lugar de se servirem daquele interporto nacional, para o giro do seu comércio, se forem estacionar em cantão, e ali carregarem as fazendas, que transportarem ao porto de Lisboa, não gozarão, na exportação delas para fora do reino, da graça da sobredita baldeação; esta graça devendo só conceder-se as fazendas embarcadas em Macau, outro algum porto da China.

Pelo que: Mando à Mesa do Desembargo do Paço[7]; regedor da Casa da Suplicação[8]; conselhos da minha real fazenda, e do ultramar; Mesa da Consciência e Ordens; Junta do Comércio destes reinos e seus domínios; vice-rei, e capitão general do Estado do Brasil; governadores, e capitães generais do mesmo Estado, e do da Índia; e aos desembargadores, corregedores, juízes e mais ministros, e pessoas, a quem o conhecimento deste pertencer, o cumpram, e guardem e façam cumprir, o guardar tão inteiramente, como nele se contém, não obstante quaisquer leis, regimentos, ou [ilegível] em contrário. Dado no palácio de Nossa Senhora da Ajuda, em oito de janeiro de mil setecentos e oitenta e três.

RAINHA.

 

[1] Direitos pertencentes ao soberano, relacionados à tributação e à taxação comercial, bem como ao monopólio para a exploração de riquezas coloniais como o pau-brasil, o ouro e o diamante. A cobrança dos direitos reais sobre o ouro e os diamantes concentrava-se no “quinto” (equivalente a 20% dos minérios produzidos), que os contribuintes estavam obrigados a pagar ao rei. Esses direitos também conferiam o poder de conceder cargos e fazer nomeações.

[2] Bebida derivada da fermentação e destilação do caldo ou do melaço da cana-de-açúcar, conhecida também como jeribitatáfiacachaçavinho de mel, ou ainda garapa azeda. Foi introduzida no Brasil pelos primeiros colonizadores portugueses, surgindo como subproduto dos engenhos de açúcar. Destinada inicialmente ao consumo local, ficou conhecida por muito tempo como bebida de escravo. Entretanto, pelo altíssimo teor alcoólico e baixo preço em relação ao vinho português, sua venda disseminou-se não só na América, como também em outras colônias portuguesas, de maneira que, no século XVII, já era utilizada como moeda de troca na compra de escravos na costa africana. A concorrência com a produção das Antilhas no Seiscentos fez despencar o preço do açúcar brasileiro no mercado internacional, forçando a procura por outros gêneros com características semelhantes. Foi nessa conjuntura que a aguardente ganhou espaço, sendo considerada como produto compensador da economia açucareira. Mesmo nas fases favoráveis, o açúcar possuía uma grande desvantagem em relação à aguardente: a baixa lucratividade para os seus produtores. Sendo um derivado da cana-de-açúcar, a aguardente era a grande responsável pelos ganhos dos engenhos brasílicos (25%), pois não estava atrelada ao dízimo e não era mercadoria dividida com os lavradores de cana. Devido à alta lucratividade dada aos senhores de engenho na colônia e ao temor da concorrência com o vinho português, a Coroa passou a tributar o produto e proibir sua comercialização. Apesar disso, as engenhocas, que oficialmente fabricavam rapadura, e os alambiques continuaram a produzir aguardente, o que contribuiu para disseminar a expressão a “salvação da lavoura”. Baixo custeio da produção e alta lucratividade fizeram da bebida, tipicamente tropical, o recurso acionado em momentos de dificuldades.

[3] Situado ao sul do continente africano, é conhecido por ser uma localização geográfica importante durante o processo de expansão marítima europeia. No século XV, Portugal buscou novas rotas marítimas para comercializar os produtos provenientes do Oriente Médio. Além da conquista de novos territórios ao longo do litoral norte da África, portugueses chegaram ao limite do território africano, região de navegação perigosa, com águas turbulentas que ofereciam muitas dificuldades para a tecnologia marítima da época. Em 1488, o navegador português Bartolomeu Dias chegou à região com sua tripulação enfrentando vários dias de severas tempestades que colocaram em risco a sobrevivência da expedição, o que levou o navegador português a chamar esse local de Cabo das Tormentas, mais tarde denominado Cabo da Boa Esperança. Essa conquista significou a descoberta de uma nova ligação com as Índias e a ampliação das rotas comerciais que não mais eram obrigadas a passar pelo mar Mediterrâneo para alcançar mercados orientais.

[4] Era responsável pelo governo de uma capitania geral, territórios administrados diretamente pela Coroa, em contraste com as donatárias, atribuídas a particulares, como BahiaPernambuco e Minas Gerais, por exemplo. Em tese, seria subordinado ao vice-rei, mas, como a autoridade deste se diluía com as distâncias e a presença dos governadores e capitães-generais que se comunicavam diretamente com a metrópole, na prática tal subordinação não funcionou na maioria das capitanias da América portuguesa.

[5] Organismo da administração fazendária responsável pela arrecadação e fiscalização dos tributos provenientes do comércio de importação e exportação. Entre 1530 e 1548, não havia uma estrutura administrativa fazendária, somente um funcionário régio em cada capitania, o feitor e o almoxarife. Porém, com a implantação do governo-geral, em 1548, o sistema fazendário foi instituído no Brasil com a criação dos cargos de provedor-mor – autoridade central – e de provedor, instalado em cada capitania. Durante o período colonial, foram estabelecidas casas de alfândega, que ficaram sob controle do Conselho de Fazenda até a criação do Real Erário em 1761, que passou a cobrar as chamadas “dízimas alfandegárias”. Estas, no entanto, mudaram com a vinda da família real em 1808 e a consequente abertura dos portos brasileiros. Por esta medida, quaisquer gêneros, mercadorias ou fazendas que entrassem no país, transportadas em navios portugueses ou em navios estrangeiros que não estivessem em guerra com Portugal, pagariam por direitos de entrada 24%, com exceção dos produtos ingleses que pagariam apenas 15%. Os chamados gêneros molhados, por sua vez, pagariam o dobro desse valor. Quanto à exportação, qualquer produto colonial (com exceção do pau-brasil ou outros produtos “estancados”) pagaria nas alfândegas os mesmos direitos que até então vigoravam nas diversas colônias.

[6] Trata-se de um documento produzido pelo monarca dirigido às autoridades metropolitanas ou coloniais contendo ordens de caráter permanente, com poder de lei. As cartas régias diferem-se dos outros documentos jurídicos pela sua estrutura. Em geral principiam com o nome do destinatário seguido da frase “Eu El Rei vos envio muito saudar”. Quando endereçadas a pessoas de maior graduação, encontramos a designação “amigo” após o nome. Quando dirigidas a indivíduos de alta graduação, costumam apresentar, após o nome do destinatário, o termo amigo seguido do período “Eu El Rei vos envio muito saudar, como aquele que prezo”. A assinatura segue o modelo dos Alvarás: Rei, Rainha ou Príncipe.

[7] Também chamada de Tribunal do Desembargo do Paço, foi o mais alto órgão da administração central portuguesa até o século XIX, que regia o Reino, e não o Ultramar. Este tribunal, estabelecido no reinado de d. João II (1481-1495) mas somente efetivado no período de d. Manuel I (1495-1521), era o tribunal supremo da monarquia, responsável por questões relativas à justiça e à administração civil do reino no âmbito da Graça. Tornou-se autônomo em relação à Casa de Suplicação em 1521, recebendo novo regimento. Até o reinado de d. Sebastião I, suspenso em 1578, quem presidia o Tribunal era o próprio rei, o que passou a não ser mais obrigatório com uma mudança instituída durante os reinados Filipinos (1580-1640). Constituído por um corpo de magistrados, já então denominados desembargadores do Paço, recrutados principalmente entre os eclesiásticos, teólogos e juristas experientes, este órgão da administração central da coroa, possuía uma grande variedade de incumbências, tendo suas funções revistas e ampliadas por sucessivas alterações de regimento, dentre as quais compreendiam: a concessão de cartas de perdão e cartas de privilégio; concessão de perdões reais, suspensão de degredos; a dispensa de idade e de nobreza para servir nos cargos de governo; comutação de pena aos criminosos; restituição de fama e outras mercês semelhantes; a legitimação e emancipação de filhos; a concessão de licença para impressão de livros; deliberando, ainda, sobre o recrutamento e provimento de juízes e arbitrando conflitos entre os demais tribunais da Coroa; entre outras questões. A vinda da corte para o Brasil em 1808 acarretou a criação da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens no Rio de Janeiro, por meio do alvará de 22 de abril daquele ano, que incorporou parte dos encargos da Mesa da Consciência e Ordens de Lisboa. No entanto, a Mesa do Desembargo do Paço do Reino continuou a existir, sendo extinta apenas em 1833, no âmbito da guerra civil entre liberais e absolutistas, suas atribuições passando para as Secretarias de Estado do Reino e dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça.

[8] Era o órgão judicial responsável pelo julgamento das apelações de causas criminais envolvendo sentenças de morte. A Casa da Suplicação de Lisboa era o tribunal de segunda instância ganhou estatuto das mãos de Filipe I em fins do século XVI, embora a sua constituição tivesse ocorrido ao longo das décadas anteriores. Era a corte suprema diante da qual respondiam os tribunais de relação. Compunha-se de diversos órgãos, com funções distintas. Os cargos mais altos da Casa eram o de regedor e o de chanceler. Atuava nas comarcas da metade sul do país e nos territórios de além-mar, com exceção da América portuguesa e da Índia. No Brasil, este órgão foi instalado na Corte pelo alvará de 10 de maio de 1808, com atribuições semelhantes à Casa da Suplicação de Lisboa e em substituição ao Tribunal da Relação, existente na cidade desde 1752. Considerada como Supremo Tribunal de Justiça, nela eram resolvidos todos os juízos e apelações em última instância, como as sentenças de morte. Suas atribuições eram similares às da Casa da Suplicação de Lisboa. Nesse sentido, compunha-se de vários órgãos com funções distintas de caráter jurídico-administrativo, destacando-se o Juízo dos Agravos e Apelações; a Ouvidoria do Crime; o Juízo dos Feitos da Coroa e da Fazenda; o Juízo do Crime da Corte; o Juízo do Cível da Corte e o Juízo da Chancelaria. O distrito de atuação compreendia as áreas do centro-sul da América, além da superposição dos agravos provenientes do ParáMaranhão, Ilha dos Açores e Madeira e Relação da Bahia. Era composta por um regedor, um chanceler da Casa, oito desembargadores dos Agravos, um corregedor do Crime da Corte e da Casa, um juiz dos Feitos da Coroa e da Fazenda, um procurador, um corregedor do Cível da Corte, um juiz da Chancelaria, um ouvidor do Crime, um promotor de Justiça e seis extravagantes.

 

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