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Festas Coloniais

Funerais de D. José I

Escrito por Super User | Publicado: Sexta, 26 de Janeiro de 2018, 18h05 | Última atualização em Quarta, 14 de Abril de 2021, 16h06

Os funerais do rei dom José I foram descritos nesses documentos, desde o vestuário até a realização da solenidade. Relata a elaboração do todo o cerimonial, dando instruções do papel a ser desempenhado por cada membro participante do funeral. A partir deste documento é possível dimensionar a importância marcante do ritual que acompanhava toda a trajetória dos indivíduos na colônia. As funções – o que se reflete na ordem a ser seguida na procissão – foram objeto de regulamentação nas Câmaras, delegadas a cada membro da cerimônia, possuíam um simbolismo que demarcava a posição hierárquica de poder e prestígio dos súditos reais.

 

Conjunto documental: Secretaria de Estado do Ministério do Reino

Notação: Caixa 735, pct 01

Datas – limite: 1735 - 1813

Título do fundo: Negócios de Portugal

Código do fundo: 59

Argumento de pesquisa: festas oficiais

Data do documento: 23 a 25 de Fevereiro de 1777.

Local: Lisboa.

Folha (s): -

 

Leia esse documento na íntegra

“Para o marquês de Tancos

 

Forma de Acompanhamento do Corpo do Augustíssimo Senhor d. José[1]

 

1º) O Corpo do Augustíssimo Senhor Rei d. José I há de ser sepultado na Igreja de São Vicente de Fora[2].

 

2º) Há de sair do Paço ... e dirigir-se à Ponte de Alcântara: dela à Esperança: daí pela Boa Vista ao Arsenal: daí pela Ribeira ao Cais do Carvão: dele ao Cais dos Moiros, e Praça do Arsenal Real do Exército: dele subindo pela calçada nova às Portas da Cruz: delas pela Estrada tão bem ultimamente aberta ao Campo de Santa Clara, e por ele ao Largo da Igreja de S. Vicente de Fora.

 

3º) Em primeiro lugar hão de ir seis Porteiros da Cana a Cavalo com suas canas.

 

4º) Em segundo lugar os dois Corregedores do Crime da Corte.

 

5º) Logo se seguirão os Títulos Oficiais da Casa do Augustíssimo senhor rei d. José I, defunto, em duas alas; os títulos a mão direita, e os Oficiais a Esquerda com declaração, que os Oficiais da mesma Casa que levam insígnias hão de ir no meio das duas alas.

 

6º) Depois se seguirão os clérigos da Basílica Patriarcal da Santa Igreja de Lisboa.

 

7º) Segure-se á o coche com o corpo, entre os moços da Câmara, a pé, com as suas tochas acesas: E virão também os Moços da Estribeira a pé, no lugar que lhes toca, mas sem tochas.

 

8º) Adiante do coche irá V. Ex.as, com o Mordomo Mór, com a sua insígnia; seguindo-se o marquês de Angeja, que vai servindo de Reposteiro Mór.

 

9º) A ilharga do mesmo coche há de ir o marquês Estribeiro Mór: tendo advertência que o pescoço do cavalo, em que for, há de ir junto à última roda do coche.

 

10º) Logo se seguirá o Coche de Respeito, e irá coberto com um pano de veludo preto, na mesma forma, em que há de ir coberto o coche em que vai o Corpo.

 

11º) Os Capitães da Guarda Real, o conde de Resende[3], e o conde de Pombeiro, hão de ir atrás do Estribeiro Mór separados dele.

 

12º) As duas Companhias da Guarda dos Arqueiros hão de ir formadas no lugar onde lhes toca, acompanhando desde o Paço até a Igreja de São Vicente de Fora.

 

13º) Os Presidentes dos Tribunais, Conselheiros e Fidalgos, que não forem Títulos, e quiserem acompanhar, o farão indo a cavalo com os mais nos lugares que costumam ter em semelhantes acompanhamentos.

 

14º) Procurar-se-á que o acompanhamento vá composto nesta forma em duas alas, por não haver confusão; e que as Religiões, e Cleros estejam arrumados, para que pelo meio possa passar o Enterro.

 

Para o Patriarca Eleito de Lisboa

Em.mo e R mo Snr.

 

 Sua Majestade é servida que V. Emcia ordene ao Cura da Santa Igreja de Lisboa[4], ou a quem seu cargo servir, que no dia hoje haja de transportar particularmente os Intestinos do Augustíssimo senhor rei dom José 1º que Deus chamou à Sua Santa Glória á sobredita Igreja: E que nela ache aberta e pronta, a cova em que os referidos Intestinos hão de ser sepultados: sendo tirados do coche e levados a ela, pelos Clérigos Beneficiados, que V. Emcia nomear. E ao marquês Estribeiro Mor se avisa para que mande logo aprontar o coche em que se deve fazer a dita condução.

Deus Guarde a V.Em.cia Paço em 24 de fevereiro de 1777.

//Ayres de Sá Mello//

Termo

Da Entrega do Cadáver do Augustíssimo Senhor Rei d. José Primeiro

Aos vinte e seis dias do mês de Fevereiro do Ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil setecentos e setenta e sete, nesta Santa Igreja Patriarcal, citando ali os presentes o marquês de Tancos dom Duarte Antônio da Câmara, do Conselho de Guerra, Gentil-homem da Câmara de Sua Mag.e , e Tenente General dos seus Exércitos, que foi nomeado pela rainha nossa senhora para exercitar o cargo de Mordomo Mor nos Atos Cerimoniais do Acompanhamento e Enterro do corpo do Augustíssimo senhor rei dom José 1º que Deus chamou à Bem Aventurança. O senhor dom João, do Conselho de Estado, Mordomo Mor da casa da sereníssima senhora rainha mãe, e Capitão General dos Galeões de Alto Borto do Mar Oceano. O marquês de Penalva Manoel Telles da Silva, do Conselho de Sua Mag.e , e Deputado da Junta dos Três Estados; o marquês de Fronteira dom Jozé Luis Mascarenhas, do Conselho de Sua Mag.e , e Veador da Casa da Rainha Nossa Senhora; o marquês de Pombal Sebastião José de Carvalho e Mello[5], dos Conselhos de Estado e Gabinete, Inspetor Geral do Real Erário, e nesse lugar Tenente junto á Real Pessoa de El Rei Nosso Senhor, e seu Plenipotenciário, Visitador e Lugar Tentente a sua Real Pessoa na Fundação da Universidade de Coimbra[6]; o marquês das Minas d. Lourenço José dos Brotos e Lancastre, do Conselho de Sua Mag.e , Gentil-homem de sua Câmara, e Marechal de Campo dos seus Exércitos; o conde de Redondo Fernando de Souza Coutinho Castello Branco e Menezes, do Conselho de Sua Mag.e e Marechal de Campo de seus Exércitos; o conde de Val Reis Lourenço Filippe de Mendonça e Moura do Conselho de Sua Mag.e  Estribeiro Mor da Sereníssima Senhora Rainha-Mãe; o conde de S. Lourenço Antonio Maria César de Mello e Silva, do Conselho de sua Mag.e e Tenente Coronel do Regimento da Cavalaria do Cais; o visconde de Villa Nova da Cerveira d. Thomas de Lima, do Conselho de Sua Mag.e e Veador da Casa da Sereníssima Senhora Rainha-Mãe: E achando-se também presente d. Fernando de Souza da Silva, Principal Vigário Capitular, e Patriarca Eleito da Santa Igreja de Lisboa: logo pelo referido marquês de Tancos Mordomo Mor, foi entregue ao dito Patriarca Eleito um caixão guarnecido por fora de veludo negro liso, com uma grande Cruz de lustrina de oiro branca em cima; cercado com galões de oiro, e cravado com pregos dourados; com três fechaduras todas da mesma parte; e com dez argolas douradas, tudo uniformemente fabricado, e forrado por dentro o sobredito caixão de ilhama branca de prata; em que disse ele marquês de Tancos, e jurou aos Santos Evangélicos, em que pôs as mãos, que se achava fechado outro caixão de chumbo, que guardava o Corpo do Muito Alto, e Muito Poderoso senhor rei dom José 1º o qual em o dia vinte e três do corrente mês de Fevereiro, aos vinte e três minutos depois da meia-noite, faleceu da vida o presente no Palácio de Nossa Senhora D’Ajuda[7]: E que ele dito marquês de Tancos, o vira, e o reconhecera ao fechar do mesmo Caixão; havendo consigo as chaves dele, e acompanhando-o sempre junto dele, sem perder de vista, com as mais pessoas acima nomeadas: E pelo mesmo Patriarca Eleito da Santa Igreja de Lisboa foi dito que ele se dava por entregue do dito Caixão e Corpo nele depositado; e se obrigou por si e seus ilegível} no lugar, a dar sempre conta do mesmo Augusto Cadáver, ou dos Ossos dele; ficando em seu poder uma das chaves do mesmo caixão, e as outras na mão dele marquês de Tancos, para se guardarem onde pertencerem. Do que eu, Ayres de Sá Mello, por especial Ordem de Sua Mag.e , fiz lavrar dois termos deste mesmo teor; um para se remeter ao Real Arquivo da Torre do Tombo[8], e outro para ficar na Secretaria d´Estado: e ambos foram assinados por todos os acima nomeados: com a declaração porém que em lugar do marquês de Pombal, que se escusou por moléstia, e pegou e assinou o conde de Soure, d. João Antonio Francisco d.ingo Bento da Costa Carvalho Patalim, do Conselho de Sua Mag.e , Tenente General dos seus Exércitos, e Provedor das Obras dos Paços Reais. Feito tudo na Santa Igreja Patriarcal, e no mesmo dia, mês e ano que fica declarado, e no princípio deste termo escrito.

 

//Ayres de Sá e Mello//

 

Marquês de Tancos//Marquês de Penalva// Marquês das Minas//Conde de Santiago//Conde de S. Lourenço//Visconde de Villa Nova da Cerviera//D. João// Marquês de Fronteira//Conde de Redondo//

Conde de Val de Reis//Conde de Soure//F. Patriarca Eleito//

 

 Para o marquês de Lavradio[9]

Ill.mo e Ex.mo Snr.

 

Em a noite do dia de ontem, pela meia-noite e 23 minutos, chamou Deus a Sua Santa Glória o Augustíssimo senhor rei dom José 1º depois de muitos e fervorosos atos de católica resignação. E a rainha nossa senhora manda participar V. Ex.a esta infanta notícia, para que V. Ex.a concorra pela sua parte, e pelo que lhe pertence, para as demonstrações do justo sentimento de tão grande perda: ordenando que nas Praças e Terras desse Governo mande V. Ex.a fazer todas as honras fúnebres que se costumam fazer em semelhantes ocasiões: E o luto geral que a mesmo Senhora mandou que se tomasse, há de ser por tempo de um ano; seis meses rigorosos, e seis aliviados; não obstante o cap.o 17 da Pragmatica de 24 de Maio de 1749. O que V. Ex.a fará assim executar.

 

Deus Guarde a V. Ex.a Palácio Nossa Senhora D’Ajuda em 25 de Fevereiro de 1777.

 

//Martinho de Mello e Castro[10]//

 

[1] JOSÉ I, D. (1714-1777): sucessor de d. João V, foi aclamado rei em setembro de 1750, tendo sido o único rei de Portugal a receber este título. Considerado um déspota esclarecido – monarcas que, embora fortalecessem o poder do Estado por eles corporificado, sofriam intensa influência dos ideais progressistas e racionalistas do iluminismo, em especial no campo das políticas econômicas e administrativas – ficou conhecido como o Reformador devido às reformas políticas, educacionais e econômicas propostas e/ou executadas naquele reinado. O governo de d. José I destacou-se, sobretudo, pela atuação do seu secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, marquês de Pombal, que liderou uma série de reestruturações em Portugal e seus domínios. Suas reformas buscavam racionalizar a administração e otimizar a arrecadação e a exploração das riquezas e comércio coloniais. Sob seu reinado deu-se a reconstrução da parte baixa de Lisboa, atingida por um terremoto em 1755, a expulsão dos jesuítas do Reino e domínios ultramarinos em 1759, a guerra guaranítica (1754-56) contra os jesuítas e os índios guaranis dos Sete Povos das Missões, a assinatura do Tratado de Madri (1750), entre Portugal e Espanha que substituiu o Tratado de Tordesilhas, entre outros. Em termos administrativos, destacam-se a transferência da capital da colônia de Salvador para o Rio de Janeiro, a criação do Erário Régio e a divisão do antigo Estado do Grão-Pará e Maranhão em dois: Maranhão e Piauí, e Grão-Pará e Rio Negro.

[2] IGREJA DE SÃO VICENTE DE FORA: igreja de estilo maneirista dedicada ao padroeiro da cidade, localizada no bairro da Alfama em Lisboa, construída entre 1582-1627, durante o período da União Ibérica, no reinado filipino, foi erguida sobre o local onde d. Afonso Henriques mandou construir um templo primitivo dedicado a São Vicente. A denominação “de fora” remete ao fato de a igreja ter sido construída fora das muralhas de Lisboa. Projeto e construção atribuídos a Filipo Terzi, Juan de Herrera e Baltasar Álvares, a planta é em formato retangular, com fachada em estilo italiano, com duas torres simétricas e estátuas de Santo Agostinho, São Sebastião e São Vicente na fachada. Destacam-se também os painéis de azulejo do século XVIII no interior da igreja e no mosteiro anexo. Na igreja também se encontram os panteões da Casa Real dos Bragança e dos patriarcas de Lisboa.

[3] CASTRO, D. JOSÉ LUÍS DE (1744-1819): 2º conde de Resende foi governador e capitão-general da Bahia de 1788 a 1801, de onde seguiu para o Rio de Janeiro como vice-rei do Estado do Brasil até 1806. Considerado um administrador colonial com baixa popularidade, durante sua administração ocorreram a Conjuração Mineira e o julgamento e condenação dos envolvidos, dentre eles, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, preso, enforcado e esquartejado no Rio de Janeiro. Foi responsável também pelo fechamento e pela devassa da Sociedade Literária do Rio de Janeiro, academia voltada para literatura e filosofia natural, acusada pela sedição conhecida como a Conjuração do Rio de Janeiro, ocorrida em 1794. A administração de conde de Resende contribuiu para a urbanização da cidade do Rio de Janeiro e melhoria das condições sanitárias. Em relação à iluminação pública, instalou lamparinas com óleo de peixe, criou o primeiro Regulamento de Higiene, em 1797, e acabou com o despejo sanitário no Campo de Santana, aterrando a área contaminada e transformando-a em um grande “rossio”. Concluiu a reforma do Paço dos Vice-Reis, entre outras importantes obras de canalização e distribuição de água. Em 1792, a Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho foi criada, instituição encarregada da formação de engenheiros militares no país. A nomeação como Marechal de Campo, em 1795, sugere que atuou nas guerras contra a França, entre 1793 e 1795, concomitantemente com o vice-reinado. De volta a Portugal, foi nomeado Conselheiro de Guerra e recebeu a Grã-Cruz da Ordem de São Bento de Avis.

[4] CURA DA SANTA IGREJA DE LISBOA: trata-se do vigário da Santa Igreja de Lisboa.

[5] MELO, SEBASTIÃO JOSÉ DE CARVALHO E (1699-1782): estadista português, nascido em Lisboa, destacou-se como principal ministro no reinado de d. José I (1750-1777). Filho do fidalgo da Casa Real Manuel de Carvalho e Ataíde e de d. Teresa Luísa de Mendonça e Melo, Sebastião José de Carvalho e Melo frequentou a Universidade de Coimbra; foi sócio da Academia Real da História Portuguesa (1733); ministro plenipotenciário de Portugal em Londres e Viena entre os anos de 1738 e 1749, sendo nomeado secretário de Estado dos Negócios do Reino de Portugal com a ascensão de d. José I ao poder. Ficou no governo durante 27 anos, período em que realizou uma série de reformas que alteraram sobremaneira a natureza do Estado português. As reformas pombalinas, como ficaram conhecidas, em consonância com a Ilustração ibérica, marcaram um período da história luso-brasileira, caracterizadas pelo despotismo esclarecido de Pombal – uma conciliação entre a política absolutista e os ideais do Iluminismo. Preocupado em modernizar o Estado português e tirar o Império do atraso econômico em relação a outras potências europeias, o primeiro-ministro buscou reestabelecer o controle das finanças, controlando todo comércio ultramarino, além de fortalecer o poder estatal, consolidando a supremacia da Coroa perante a nobreza e a Igreja. Entre as principais medidas empreendidas por Pombal durante seu governo, podemos destacar: a criação de companhias de comércio, como a Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão (1755-1778) e a de Pernambuco e Paraíba (1759-1780); a expulsão dos jesuítas do reino e domínios portugueses (1759); a reorganização do exército; a transferência da capital do Estado do Brasil de Salvador para o Rio de Janeiro (1763) e a reforma do ensino, em especial a da Universidade de Coimbra (1772). Pombal sobressaiu-se, ainda, por ter sido o responsável pela reconstrução de Lisboa, destruída por um terremoto em 1755. Foi agraciado com o título de conde de Oeiras, em 1759, e de marquês de Pombal em 1769. Com a morte de d. José I e a consequente coroação de d. Maria I, Pombal foi afastado de suas funções e condenado ao desterro. Em decorrência de sua idade avançada, Carvalho e Melo recolheu-se à sua Quinta de Oeiras, onde permaneceu até sua morte.

[6] UNIVERSIDADE DE COIMBRA: fundada em 1290 por d. Dinis, foi a principal instituição responsável pela formação acadêmica da elite do Império português, proveniente da metrópole ou da colônia. Desde 1565, esteve sob a direção dos padres jesuítas e, em 1772, durante a administração do marquês de Pombal, ministro de d. José I, sofreu sua principal e mais significativa reforma. A renovação da Universidade resultou na elaboração de novos estatutos e fazia parte de um plano mais geral de reforma do ensino em Portugal e seus domínios, iniciada em 1759. A reforma educacional pombalina teve como principal diretriz a expulsão dos jesuítas de todo Império lusitano e, conforme os estatutos, “abolir e desterrar não somente da Universidade, mas de todas as Escolas públicas (...) a Filosofia Escolástica” que era atribuída aos árabes e aos comentadores de Aristóteles, aos quais eram associados os jesuítas. O processo educativo pedagógico, governado, anteriormente, pelos inacianos, seria substituído por um sistema público de ensino. Num primeiro momento, apenas os Estudos Menores (ensino elementar e médio) sofreram grandes mudanças, deixando-se os Estudos Maiores (superior) para um período posterior, quando a nova base da instrução estivesse organizada. Em 1771 d. José formou a Junta da Providência Literária, cuja principal missão seria a avaliação do estado da universidade durante o período em que esteve sob administração dos jesuítas e a proposição de mudanças, a fim de melhorar o ensino, conforme sua orientação. Os resultados dessa avaliação foram reunidos no Compêndio Histórico do Estado da Universidade de Coimbra. Tratava-se do primeiro documento originário da Junta de Providência Literária, apresentado ao rei pela Real Mesa Censória e que daria sustentação, no ano seguinte, aos Novos Estatutos da Universidade de Coimbra, publicados em 1772. Segundo Nívia Pombo, “seu conteúdo reiterava a primeira lição a ser aprendida: a ideia de que o Estado deveria se aproveitar das novidades das ciências e das artes e colocá-las a serviço da sociedade. Tal aspecto aparece bem marcado com a recorrência das expressões “necessidade pública” e “nações civilizadas”, associadas à noção de que o “exame da Natureza” promovia “imensas utilidades em benefício das Famílias, e dos Estados” (Nívia Pombo. A cidade, a universidade e o Império: Coimbra e a formação das elites dirigentes (séculos XVII-XVIII). Intellèctus, ano XIV, n. 2, 2015. Acesso: https://www.e-publicacoes.uerj.br). A diretriz geral da reforma seria, por conseguinte, a secularização e a modernização do ensino superior, na busca por um conhecimento mais técnico, crítico e pragmático, orientado pelos princípios das luzes e da ciência [iluminismo], para a formação de cidadãos “úteis” ao Estado e à administração pública. Deste modo, foram reformuladas as faculdades de Filosofia e de Matemática; introduzidos os laboratórios para aulas práticas; a organização dos cursos e das disciplinas foi alterada, de modo a seguir um novo método; toda a metodologia de ensino e os compêndios usados pelos jesuítas foram proibidos e substituídos e a duração das aulas e dos cursos foi encurtada. Os professores religiosos deveriam ser paulatinamente substituídos por leigos escolhidos por seleção pública. Evidenciando o viés do ensino prático, foram criados, em paralelo, o Teatro Anatômico, o Observatório Astronômico, o Horto Botânico, o Museu de História Natural, o Laboratório de Física e o Dispensatório Farmacêutico. Para realizar a reforma foi nomeado d. Francisco de Lemos de Faria Pereira Coutinho, intitulado bispo reformador da Universidade de Coimbra, natural do Rio de Janeiro, que ficou à frente da sua administração entre 1770 e 1779 (e depois entre 1799 e 1821) e que executou a reforma, nos moldes dos novos estatutos. A partir de então, a reformada Universidade de Coimbra passou a ser referência e modelo para as instituições de ensino existentes na época e as posteriormente criadas.

[7] PALÁCIO REAL DA AJUDA: foi construído em Lisboa, no século XVIII, em função da destruição do Paço da Ribeira, então sede do governo, causada pelo terremoto de 1755, durante o reinado de d. José I. O Palácio da Ajuda foi edificado em madeira para melhor resistir aos abalos sísmicos e serviu residência oficial da monarquia portuguesa durante cerca de três décadas. Durante seu governo, marquês de Pombal mandou construir à volta do palácio o primeiro jardim botânico de Portugal. Em 1794, um incêndio destruiu por completo a habitação real e outro palácio em pedra e cal foi projetado. A construção do novo palácio se estendeu por mais de sessenta anos, durante os quais o palácio ora serviu de residência real (quando monarcas escolhiam alas já habitáveis do palácio como moradia), ora assumia plano secundário. As obras na estrutura do edifício foram concluídas em 1861, durante o reinado de d. Luís I.

[8] REAL ARQUIVO DA TORRE DO TOMBO: arquivo instituído na Torre do Tombo do Castelo de Lisboa no século XIV. A Torre do Tombo, durante o Antigo Regime, foi essencialmente composta do arquivo do rei, ou da Coroa, sendo o lugar onde se guardavam todos os tipos de registros oficiais, tais como: tombos de registro e demarcação de bens e direitos, documentos da Fazenda, capítulos das Cortes, livros de chancelaria, registros de instituição de morgados e capelas, testamentos, forais, sentenças do juiz dos feitos da Coroa, bulas papais, tratados internacionais, correspondência régia e outros documentos. Desde 1378, o mais importante arquivo português denomina-se Torre do Tombo, uma vez que os principais documentos que o rei mandava guardar – o Recabedo Regni, ou Livro do Tombo, onde se registravam as suas propriedades e direitos – localizavam-se na torre albarrã, do castelo de São Jorge, em Lisboa. Em 1755, esta torre foi destruída no terremoto que abalou Lisboa, sendo o arquivo acomodado, provisoriamente, em parte do mosteiro de São Bento, onde hoje está o edifício da Assembleia da República. A invasão das tropas bonapartistas em 1807 colocou em risco os arquivos portugueses, com o embarque dos fundos de secretarias de governo para o Brasil. Os arquivos da Torre do Tombo permaneceram no reino, mas foram selecionados e encaixotados diante da reentrada dos franceses em 1809 e da ameaça de tomada de Lisboa no ano seguinte, quando se discutiu que documentos deveriam ser embarcados para o Rio de Janeiro. Afastados esses riscos esses arquivos não foram afinal deslocados para a colônia (MARTINS, Ana Canas Delgado. Governação e arquivos: d. João VI no Brasil. Lisboa: Instituto dos Arquivos Nacionais, [2007]). Na década de 1990, o Arquivo Nacional da Torre do Tombo foi transferido para um moderno edifício-sede, com amplas instalações, na cidade universitária de Lisboa.

[9] MASCARENHAS, D. LUÍS DE ALMEIDA PORTUGAL SOARES ALARCÃO D' EÇA E MELO SILVA E (1729-1790) - MARQUÊS DO LAVRADIO: 5º conde de Avintes e 2º marquês do Lavradio era filho do 1.º marquês do mesmo título d. Antônio de Almeida Soares e Portugal e de d. Francisca das Chagas Mascarenhas. Governador da Bahia entre 1768 e 1769, conseguiu neste curto período apaziguar os conflitos entre as autoridades locais e restabelecer a ordem na guarnição de Salvador. Sua forma de governar se pautava pela prudência na utilização dos recursos procurando manter suas contas sob estrito controle. Foi nomeado décimo primeiro vice-rei do Brasil em 1769, e seu governo durou 10 anos. Durante este período, a cidade colonial do Rio de Janeiro, que abrigava a sede do vice-reinado, passou por uma série de melhorias, como o aterro de pântanos e lagoas que prejudicavam a qualidade do ar, calçamento e abertura de ruas na parte central (inclusive a que leva seu nome), além de incentivos à produção local de alguns itens como o café e o vinho. Também foi responsável pela fundação da Academia Científica, em 1772, obedecendo à política pombalina de fomento às atividades científicas, que incluiu a remessa de coleções de História Natural e a criação de um horto botânico na cidade. No entanto, ao longo de seu governo, medidas impopulares, implementadas por ordem direta da metrópole, foram adotadas, como: o cumprimento das leis do Livro da Capa Verde do Distrito Diamantino – regulamentação da exploração de diamantes na colônia, editado por iniciativa do marquês de Pombal – e a extinção da Companhia de Jesus. Foi também durante sua administração que a situação de crescente instabilidade na região do Rio da Prata, com ocasionais conflitos armados entre forças espanholas e lusas, demandou providências para contornar a situação, como iniciativas de povoamento da região sul do Brasil e a construção de fortalezas na região, com o envio de guarnições. Em 1779, dois anos depois do falecimento do rei d. José I, o marquês do Lavradio deixou o governo do Brasil, sendo substituído por Luís de Vasconcelos e Sousa. De volta a Portugal, tornou-se conselheiro da Guerra, presidente do Desembargo do Paço, inspetor-geral das tropas do Alentejo e Algarve, veador da rainha e recebeu a Grã Cruz da Ordem de Cristo. A correspondência trocada por ele com outras autoridades e membros da nobreza em Portugal gerou as Cartas da Bahia (1768 a 1769), e as Cartas do Rio de Janeiro (1769-1770) publicadas pelo Arquivo Nacional. A instituição conserva ainda o fundo privado Marquês do Lavradio em seu acervo.

[10] CASTRO, MARTINHO DE MELO E (1716-1795): nascido em Lisboa, foi secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos de 1770 até sua morte. Estudou latinidade, filosofia e teologia na Universidade de Évora, além de direito canônico, em Coimbra, onde se formou bacharel em 1744. Diplomata, iniciou seus trabalhos em 1751, como embaixador em Haia, Holanda, e atuou de forma decisiva na solução de questões conflituosas entre Portugal e Inglaterra, decorrentes da Guerra dos Sete Anos, o que levou à sua nomeação para a Secretaria de Estado. Durante sua gestão como secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, desempenhou papel central no planejamento e execução das viagens e expedições filosóficas às colônias portuguesas. Melo e Castro foi o principal agente da Coroa envolvido no planejamento das viagens e na interlocução com os naturalistas e administradores locais, com vistas à solução de problemas no decurso das expedições. O secretário foi, ainda, diretor do Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda e destinatário das remessas de produtos naturais provenientes das viagens, encaminhados aos museus de História Natural em Lisboa e Coimbra para sistematização, análise e classificação. Demonstrou habilidade na administração pública, muito embora seus escritos apontem que não foi um grande político ou teórico, não reconhecendo o início da crise do sistema colonial durante sua governação. Foi sob sua gestão que ocorreu a Conjuração Mineira (1789), tendo partido de Melo e Castro a ordem para que o governador da capitania de Minas Gerais, Luis Antonio Furtado de Castro, visconde de Barbacena, promovesse a devassa dos envolvidos.

Sugestões de uso em sala de aula:

Utilização(ões) possível(is):

- Ao trabalhar o tema transversal “pluralidade cultural”
- No eixo temático sobre a “História das representações e das relações de poder”

 
Ao tratar dos seguintes conteúdos:

- O Homem e a Cultura
- A sociedade colonial: movimentos religiosos e culturais
- Brasil colonial: sociedade de corte
- Brasil colonial: religião e sociedade

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