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Cidades

Opulência na Corte

Escrito por Super User | Publicado: Sexta, 20 de Outubro de 2017, 14h50 | Última atualização em Quinta, 12 de Agosto de 2021, 19h39

Inventário de Maria de Jesus, falecida em novembro de 1803, que tem por inventariante o capitão Francisco da Cunha Pinheiro. No documento são listados todos os seus bens, tais como móveis e utensílios de madeira, imagens sacras, louças, ouro, prata e 14 escravos em diferentes faixas etárias, caracterizando uma casa ricamente mobiliada. Além disso, constam imóveis localizados na rua do Ouvidor, na rua Direita e em Vila Nova de Gaia em Portugal.

 

Conjunto documental: Maria de Jesus
Notação: maço 361, proc. 6368
Datas-limite: 1804-1808
Título do fundo ou coleção: Inventários
Código do fundo: 3J
Argumento de pesquisa: cidades, Portugal
Data do documento: 20 de outubro de 1808
Local: Rio de Janeiro
Folha (s): 1 a 38
 

“Auto de Inventário[1]

Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e quatro aos dois dias do mês de janeiro do mesmo ano nesta cidade do Rio de Janeiro[2], e Casas da residência do Juiz de Órfãos[3] Luiz Telles Barreto de Meneses onde eu, escrivão, fui vindo, e sendo a eis (sic) presente, capitão Francisco da Cunha Pinheiro o dito juiz lhe deferiu o juramento dos Santos Evangelhos e lhe encarregou desse Inventário todos os bens que ficaram por morte de sua mulher sem reserva ociosa alguma até o valor de quarenta réis[4] dinheiro, ouro, prata, cravos (sic), móveis e de raiz, efeitos, carregações e seus produtos (...) Avaliações dos bens da falecida dona Maria de Jesus de quem é inventariante o capitão Francisco da Cunha Pinheiro.

Casas: (...) Uma morada de casa de dois sobrados[5] na rua do Ouvidor[6]4:17:30 fazendo canto para o beco que vai para a rua do Rosário[7], cujas casas têm de frente no seu vão palmos e fundo cento e vinte palmos, no seu fundo é mais estreita dezoito palmos, na distância de trinta e quatro palmos; a sua formação na frente pedra e cal com janelas de sacada de pedra tanto embaixo quanto encima (...); outra dita casa de dois sobrados na rua Direita[8], fazendo canto para a rua do ouvidor que de um lado parte com casas do Capitão Domingos Francisco Rosa, cujas casas têm de um vinte e seis palmos e fundo noventa palmos, sua formação na frente e lado é parede de pedra e cal e na frente duas janelas de sacada, em lado quatro janelas de sacada e uma de peitoril, tudo de pedra e tudo formado, menos o corredor que vai para a cozinha (...); Há uma morada de casas na rua da Quitanda dos Pretos[9] com seu sotroques (sic) e um lado parte com casas do padre Ivan da Silveira e pelo outro lado com outro do mesmo inventário, cujas casas têm de vão quinze palmos, fundo trinta palmos e sua formação na frente é frontal de tijolo com dois portões de madeira, encima é uma janela de peitoril de madeira (...); Há uma morada de casas térreas na rua do Conde[10] que de um lado parte com casas do capitão Bernardo Gomes Souto e pelo outro com quem direito pertencer cujas casa têm de vão trinta palmos, e fundo enquanto casas setenta e dois palmos, e tem mais uma meia água livre o leste comprimento que serve de cozinha e vários quartos de acomodação que tem de comprido oitenta e quatro palmos com quatorze palmos de largo, e tem mais de quintal até o portão trinta e sete palmos (...); No lugar chamado a Gamboa uma casa de vivenda de sobrado que tem de vão trinta palmos e fundo cento e quarenta e dois em cujo a sua formação na frente parede mestra até ao vigamento e do lado embaixo até ao meio da casa, e daí para o fundo em até o vigamento pilares de tijolo (...); no lugar chamado o Saco do Alferes[11] em terras do mesmo senhorio, um pedaço de muro que faz frente ao mar. Com seu portão é dentro do dito terreno tem duas casas de meia água cobertas de telhas com paredes de pau-a-pique (...); Móveis de madeira: um oratório de três faces, com vidros, com talha no Remate e na venda, todo dourado, em bom uso avaliado na quantia de oitenta mil Reis (...), um espelho de parede com moldura preta avaliado em dez mil Reis (...), uma cama grande de jacarandá antiga torneada avaliada na quantia de dois mil quinhentos e setenta Reis (...), uma canoa de tomar banho avaliada na quantia de quatro mil Reis (...), uma bengala com castão de prata avaliada em dois mil Reis (...); Imagens: uma imagem de Cristo com cruz e calvário de Sebastião de Arruda, com pontas de madeira de pequeá[12] avaliada na quantia de dezenove mil e duzentos Reis (...); Louça: Dois jogos de chá brancos pó de pedra lavados, avaliados a cinco mil Reis cada um (...), seis pratos esmaltados da Índia[13], avaliados todos na quantia de mil duzentos e oitenta Reis (...), quatorze pratos do Porto[14], grossos, avaliados a setenta Reis cada um (...); Roupa: (...) um xale de seda riscado, avaliado em dois mil quinhentos e sessenta (...), uma toalha de cambraia de flores com babados, avaliada na quantia de três mil e duzentos Reis (...), duas saias de pano de linho avaliadas ambas na quantia de mil duzentos e oitenta Reis (...); Ouro: (...) um rosário de ouro de mão antigo, pesa assim como está dezoito oitavas e três quartos, a mil e quatrocentos a oitava, importa na quantia de vinte e seis mil duzentos e cinqüenta Reis (...), um laço e brincos antigos com cento e trinta e um diamantes rosas em prata, avaliados na quantia de vinte mil Reis (...), um anel antigo com uma água marinha em prata, fundo e aro em ouro de lei, avaliado na quantia de três mil e duzentos Reis (...), três pares de brincos de cristais com folhas de várias cores, em prata, avaliados todos na quantia de mil e duzentos Reis (...); escravos: Manoel Benguela, que pareceu ter trinta anos, do serviço de casa, e dei ser rendido de ambas as virilhas, avaliado na quantia de cento e dois mil e quatrocentos Reis, (...), Luzia Cabindá, que pareceu ter setenta e seis anos do serviço de casa avaliada em quarenta mil Reis (...), Narcisa Mina, que pareceu ter trinta e oito anos, costureira, diz padecer erisipelas[15], e tem a perna direita inchada, avaliada na quantia de oitenta mil Reis (...), Rosa Crioula, filha da dita, que pareceu ter quatorze anos, costureira, e diz padecer quase sempre do estômago, avaliada na quantia de noventa mil Reis (...), Sabina Crioula, filha da dita Narcisa, que pareceu ter três meses de idade, avaliada em doze mil Reis (...); Gado vacum: cinco vacas, avaliadas umas por outras a seis mil Reis, importam todas na quantia de trinta mil Reis (...); Bens existentes em Portugal[16] em Vila Nova de Gaya[17], como consta do termo de louvação abaixo: (...) primeiramente, (...) foram vistas e examinadas quatro moradas de casas, as quais servem de loja de ferreiro (...) e são situadas na praia da Vila Nova de Gaya (...).”

 

[1]INVENTÁRIO: levantamento e registro que geralmente se faz dos bens pertencentes a uma pessoa falecida, mas que também pode ser feito ainda em vida.

[2]RIO DE JANEIRO: a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro foi fundada tendo como marco de referência uma invasão francesa. Em 1555, a expedição do militar Nicolau Durand de Villegaignon conquista o local onde seria a cidade e cria a França Antártica. Os franceses, aliados aos índios tamoios confederados com outras tribos, foram expulsos em 1567 por Mem de Sá, cujas tropas foram comandadas por seu sobrinho Estácio de Sá, com o apoio dos índios termiminós, liderados por Arariboia. Foi Estácio que estabeleceu “oficialmente” a cidade e iniciou, de fato, a colonização portuguesa na região. O primeiro núcleo de ocupação foi o morro do Castelo, onde foram erguidos o Forte de São Sebastião, a Casa da Câmara e do governador, a cadeia, a primeira matriz e o colégio jesuíta. Ainda no século XVI, o povoamento se intensifica e, no governo de Salvador Correia de Sá, verifica-se um aumento da população no núcleo urbano, das lavouras de cana e dos engenhos de açúcar no entorno. No século seguinte, o açúcar se expande pelas baixadas que cercam a cidade, que cresce aos pés dos morros, ainda limitada por brejos e charcos. O comércio começa a crescer, sobretudo o de escravos africanos, nos trapiches instalados nos portos. O ouro que se descobre nas Minas Gerais do século XVIII representa um grande impulso ao crescimento da cidade. Seu porto ganha em volume de negócios e torna-se uma das principais entradas para o tráfico atlântico de escravos e o grande elo entre Portugal e o sertão, transportando gêneros e pessoas para as minas e ouro para a metrópole. É também neste século, que a cidade vive duas invasões de franceses, entre elas a do célebre Duguay Trouin, que arrasa a cidade e os moradores. Desde sua fundação, esta cidade e a capitania como um todo desempenharam papel central na defesa de toda a região sul da América portuguesa, fato demonstrado pela designação do governador do Rio de Janeiro Salvador de Sá como capitão-general das capitanias do Sul (mais vulneráveis por sua proximidade com as colônias espanholas), e pela transferência da sede do vice-reinado, em Salvador até 1763, para o Rio de Janeiro quando a parte sul da colônia tornou-se centro de produção aurífera e, portanto, dos interesses metropolitanos. Ao longo do setecentos, começam os trabalhos de melhoria urbana, principalmente no aumento da captação de água nos rios e construção de fontes e chafarizes para abastecimento da população. Um dos governos mais significativos deste século foi o de Gomes Freire de Andrada, que edificou conventos, chafarizes, e reformou o aqueduto da Carioca, entre outras obras importantes. Com a transferência da capital, a cidade cresce, se fortifica, abre ruas e tenta mudar de costumes. Um dos responsáveis por essas mudanças foi o marquês do Lavradio, cujo governo deu grande impulso às melhorias urbanas, voltando suas atenções para posturas de aumento da higiene e da salubridade, aterrando pântanos, calçando ruas, construindo matadouros, iluminando praças e logradouros, construindo o aqueduto com vistas a resolver o problema do abastecimento de água na cidade. Lavradio, cuja administração se dá no bojo do reformismo ilustrado português (assim como de seu sucessor Luís de Vasconcelos e Souza), ainda criou a Academia Científica do Rio de Janeiro. Foi também ele quem erigiu o mercado do Valongo e transferiu para lá o comércio de escravos africanos que se dava nas ruas da cidade. Importantíssimo negócio foi o tráfico de escravos trazidos em navios negreiros e vendidos aos fazendeiros e comerciantes, tornando-se um dos principais portos negreiros e de comércio do país. O comércio marítimo entre o Rio de Janeiro, Lisboa e os portos africanos de Guiné, Angola e Moçambique constituía a principal fonte de lucro da capitania. A cidade deu um novo salto de evolução urbana com a instalação, em 1808, da sede do Império português. A partir de então, o Rio de Janeiro passa por um processo de modernização, pautado por critérios urbanísticos europeus que incluíam novas posturas urbanas, alterações nos padrões de sociabilidade, seguindo o que se concebia como um esforço de civilização. Assume definitivamente o papel de cabeça do Império, posição que sustentou para além do retorno da Corte, como capital do Império do Brasil, já independente.

[3]JUIZ DOS ORFÃOS: autoridade judiciária, tinha a função de zelar pelos órfãos de sua jurisdição e seus bens, inclusive registrando em livro próprio quantos órfãos havia e de que bens dispunham, além de verificar se os mesmos estavam sendo bem geridos. Aos juízes dos órfãos competia uma quantidade enorme de atribuições e atividades, até mais do que aos juízes ordinários e de fora. Entre as competências constam nomear e confirmar tutores e curadores, prover os órfãos de bens para garantir seu sustento, fazer inventários, avaliar os bens e realizar as partilhas, fazer vender imóveis e arrendar bens de raiz, cuidar para que os rendimentos seguissem para a educação do órfão, conceder cartas de emancipação e licenças de casamento. Eram responsáveis por assegurar com que todos os órfãos tivessem tutor até um mês depois do falecimento do pai ou da mãe, fossem familiares ou não, e por fiscalizar e verificar a idoneidade do tutor ou curador. Se sobre os tutores fosse constatada alguma irregularidade ou má conduta, o juiz deveria destituí-los e obrigá-los a restituir os bens dos órfãos, além de nomear um novo tutor. Era obrigação dos juízes fiscalizar e vigiar os valores que entravam e saíam do cofre dos órfãos e verificar o patrimônio dos tutores, além de fiscalizar o trabalho realizado pelo juiz anterior e denunciá-lo em caso de irregularidades, e arrecadar impostos e taxas para o Juízo. Possuía jurisdição sobre todas as ações cíveis que envolvessem os órfãos, fossem como autores ou réus, até a sua emancipação. Estruturalmente, o juízo dos órfãos era constituído pelo respectivo juiz, pelos escrivães, pelo tutor geral dos órfãos, pelo contador e pelos avaliadores e partidores. Ainda cabia a eles fiscalizar seus oficiais subordinados, escrivão, ajudante de escrivão, oficiais de registro, tesoureiro, contador, avaliador, partidor e porteiro do auditório – considerando que uma mesma pessoa poderia acumular mais de uma função – e prestar contas de tudo o que acontecia sob sua jurisdição ao Provedor, responsável, por sua vez, por fiscalizar as atividades do juiz dos órfãos.

[4]RÉIS: moeda portuguesa utilizada desde a época dos descobrimentos (séculos XV e XVI). Tratava-se de um sistema de base milesimal, cuja unidade monetária era designada pelo mil réis, enquanto o réis designava valores fracionários. Vigorou no Brasil do início da colonização (século XVI) até 1942, quando foi substituída pelo cruzeiro.

[5]SOBRADO: casa grande possuidora de dois ou mais pavimentos. Geralmente, era utilizado como prédio comercial ou misto – embaixo atividades comerciais como farmácias e mercearias, e em cima funcionava como moradia –, adquirindo fins estritamente residenciais somente pelas famílias mais abastadas. Enquanto moradia própria das camadas mais privilegiadas do Brasil colonial, durante o período de urbanização brasileiro, processo iniciado com a atividade mineradora e intensificado com a chegada da corte no início do século XIX, o sobrado seria elemento importante para compreensão de uma ordem sociocultural marcada pelo patriarcalismo. Segundo Gilberto Freire, as casas-grandes urbanizaram-se em sobrados, configurando-se núcleo das interações socioeconômicas e culturais entre os habitantes das cidades, expressando novas relações de distanciamento e integração entre ricos e pobres, brancos e negros, homens e mulheres, o antagonismo entre os domínios públicos e privados e conferindo status a esses homens, proprietários dos sobrados. Com padrões arquitetônicos europeus, numa busca pela modernização do país, os sobrados caracterizaram o processo de urbanização das cidades brasileiras. No Rio de Janeiro colonial, concentravam-se nos logradouros mais importantes do centro da cidade, como na freguesia da Candelária e nas proximidades do largo do Paço.

[6]OUVIDOR, RUA DO: uma das ruas mais antigas do Rio de Janeiro, com registros de sua existência desde fins do século XVI. Seu nome atual data de 1870, quando a Câmara Municipal designou este logradouro como endereço residencial dos ouvidores nomeados para a comarca do Rio de Janeiro. Mas, foi no século XIX e início do XX que a rua do Ouvidor se firmou como ponto de excelência da sociabilidade carioca, tendo sua história contada por Machado de Assis, Joaquim Manoel de Macedo, João do Rio, entre outros. A rua começou a ganhar importância a partir da chegada da família real portuguesa ao Brasil em 1808. Com abertura dos portos às nações amigas, muitos comerciantes estrangeiros estabeleceram seus negócios e lojas naquela artéria urbana central, diversos deles voltados para artigos da moda e costumes das grandes cidades europeias. Endereço de elegância, foi onde os principais cafés, confeitarias, lojas de artigos de luxo, jornais e livrarias se instalaram. A Ouvidor tornou-se o principal centro cultural, político e comercial da cidade. Lugar do novo, onde todas as inovações chegavam primeiro, lá surgiram a primeira vitrine, o primeiro cinema, a primeira linha de bonde regular da cidade, onde foi instalado o primeiro telefone. Foi também a primeira rua a ter obras de calçamento e receber iluminação a gás e, no final do século, elétrica. O Rio de Janeiro, ao longo do século XIX, passou por intenso processo de urbanização e modernização e, segundo cronistas da época, a rua do Ouvidor era a que mais traduzia a nova fisionomia e a alma da cidade.

[7]ROSÁRIO, RUA DO: uma das ruas mais antigas da cidade do Rio de Janeiro, nascia na praia do Peixe e terminava na antiga rua da Vala, atual Uruguaiana, de frente para a Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Pretos. Recebeu este nome porque era a rua que ia para a Igreja do Rosário, erguida entre 1701 e 1736 pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos (fundada em 1640) e foi a primeira a permitir a participação de negros, livres ou escravos, na cidade do Rio de Janeiro. Antes de se tornar rua do Rosário teve diversas denominações, já que cada quarteirão ou esquina tinha um nome, de Domingos Manuel, do padre Matoso, do Vila Lobos, moradores conhecidos de cada trecho. A igreja que fica na própria rua é a de Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte (erguida entre 1735 e 1835), que passou a abrigar a Irmandade de Nossa Senhora da Conceição, de pardos livres, que anteriormente ficava na Sé de São Sebastião no morro do Castelo. Às vésperas da Independência algumas sessões do Senado da Câmara, entre elas a célebre do dia do Fico, aconteceram no consistório da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, na Igreja. No século XIX, o trecho entre as ruas da Quitanda e a Direita tinha muitas casas de negócio importantes, mas a rua era também ocupada por escritórios de advogados, médicos e engenheiros. Na rua do Rosário morou o médico francês José Francisco Xavier Sigaud, em cuja casa se reuniram os primeiros fundadores da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro (posteriormente Academia Imperial de Medicina). Estabeleceram-se ali instituições como o hotel inglês Balger (ou Bulcher), um colégio para meninas da Corte: o Pensionat de Jeunes Demoiselles de propriedade de Madame St. Julien, e o periódico literário fundado por Artur Azevedo, A Gazetinha, quase em frente à rua Gonçalves Dias. Em 1902 sofreu um processo de alargamento desde a rua Visconde de Itaboraí até a Igreja do Rosário.

[8]DIREITA, RUA: prolongamento da rua da Misericórdia, no centro do Rio de Janeiro, passou a se chamar rua Primeiro de março em 1870 quando as tropas brasileiras voltaram da Guerra do Paraguai. Rua mais antiga da cidade, fazia a ligação direta entre o Morro do Castelo e o Morro de São Bento, os dois principais núcleos de ocupação na cidade do Rio colonial. Esta rua ganhou notoriedade por ser o palco das batalhas travadas contra o francês Duclerc, em 1710, durante invasão francesa à cidade [ver Invasões francesas]. Foi o local escolhido para sediar o convento dos Carmelitas, fundado em 1590, na época o maior prédio da cidade. Os carmelitas também fundaram um hospital (com entrada pela rua do Carmo), posteriormente desalojado para abrigar os livros provenientes de Portugal por ocasião da vinda da família real para o Brasil. Foi palco de cerimônias reais importantes como a sagração de d. João VI em 1816, o casamento do príncipe d. Pedro com d. Leopoldina em 1817 e o juramento da Constituição de 1824 pelo imperador, na igreja da Sé da cidade. Destacou-se, ainda, por ter acomodado o primeiro Banco do Brasil, a primeira sede dos Correios, onde até hoje ficam a Igreja de São José e uma das faces do Paço Imperial.

[9] QUITANDA, RUA DA: anteriormente conhecida como rua do Açougue Velho, rua da Quitanda Velha, ou da Quitanda dos Pretos, ou da Quitanda dos Mariscos, localizada no centro da cidade do Rio de Janeiro, fazia a comunicação entre a Prainha (região da atual Praça Mauá) e o bairro da Misericórdia. Recebeu este nome pela existência de uma grande feira aberta, semelhante a uma quitanda, em um trecho da rua. Foi nesta via que ocorreu o pagamento do resgate oferecido pela cidade ao corso francês Duguay-Trouin em 1711 e o episódio conhecido como "Noite das Garrafadas" em 1831 – conflito entre brasileiros e portugueses que antecedeu a abdicação de d. Pedro I ao trono. Nessa importante rua do centro da cidade, estabeleceram-se, entre outros: a sede da tipografia dos irmãos Laemmert; a Loteria da Santa Casa da Misericórdia; a primeira Escola Homeopática (1844); a primeira sede da Academia Brasileira de Letras; o Gabinete Inglês de Leitura e o Clube Militar. Foi também o endereço de inúmeros jornais, como O Mequetrefe e o Correio Mercantil.

[10]CONDE, RUA DO: atual Frei Caneca foi um dos primeiros logradouros abertos na Cidade Nova, durante o vice-reinado do Conde da Cunha (1763-1767), D. António Álvares da Cunha. Foi traçada passando pelo terreno da chácara do sargento-mor Pedro Dias Paes Leme, sitiada entre o largo do Rocio e o Campo de Santana. Inicialmente, recebeu o nome de rua da Sentinela, em função da sua execução, em 1774, sobre os aterros da lagoa de mesmo nome. Recebeu, ainda, a denominação de rua Nova do Conde em 1766 e, em 1866, rua do Conde D'Eu. Essa região, durante todo século XVIII, caracterizava-se pelo predomínio de chácaras, com certo ar rural. Apenas com a chegada da Corte portuguesa em 1808, e a crescente demanda por habitações, a região passaria por um maior processo de urbanização.

[11]SACO DOS ALFERES: pequena enseada localizada entre o Saco de São Diogo e a Gamboa, no centro da cidade do Rio de Janeiro. No século XVII, a região pertencia ao alferes Diogo de Pina, daí o nome atribuído à praia existente no local. A área rural, conhecida também como praia Formosa, era destinada, até a segunda metade do século XVIII, à plantação de canaviais, sendo em sua quase totalidade desabitada. A urbanização da região ocorreu em fins do século, com a construção do cais do Valongo e intensificada após a chegada de corte em 1808. A grande movimentação comercial no porto do Rio de Janeiro, provocou um redimensionamento do espaço portuário e na região do Saco do Alferes, assim como na Gamboa. Foram construídos armazéns e trapiches, levando à abertura de novas ruas com a instalação inclusive de um curtume no local, dotado de cais próprio (Cf. LAMARÃO, Sérgio Tadeu de Niemeyer. Dos trapiches ao porto. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal das Culturas, 2006). A região foi totalmente aterrada – incluindo a Ilha das Moças e dos Melões – na primeira década do século XX para dar lugar ao Novo Porto do Rio de Janeiro.

[12]PEQUEÁ: denominado vulgarmente piqui, uma espécie do gênero Caryocar, encontrado também no Suriname e Guiana. No Brasil, a área de incidência é vasta, estendendo-se do Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí, Goiás, Bahia, Ceará até São Paulo e Minas Gerais em menor escala. Árvore de grande porte, sua madeira é fibrosa, resistente e muito usada na construção de móveis. A casca fresca e seca do fruto pode substituir a noz de galha na preparação de tinta preta esverdeada de escrever e para tinturaria. O óleo do fruto de pequi é considerado um substituto da banha e toucinho. O licor de pequi, preparado com o caroço, tem virtudes principalmente estomacais e como fortificante.

[13]ÍNDIA: região da Ásia meridional ligada à península Indochinesa. Desde o século XII os artigos orientais, como as especiarias, já se faziam presentes no comércio português, tornando-se em pouco tempo os produtos mais lucrativos no comércio europeu. A partir de 1453, quando Constantinopla e a rota de envio desses produtos para a Europa caiu sob o domínio turco, esses produtos sofreram uma alta abrupta de preços, colocando a necessidade de se buscar um caminho alternativo que possibilitasse aos comerciantes lusos tratar diretamente com os do Oriente. Esse foi um dos principais propulsores da expansão marítima do século XV, cuja finalidade era chegar às Índias, onde se poderia obter as tão cobiçadas especiarias, além de tecidos, porcelanas, chás, marfim, entre outros produtos de luxo. Vasco da Gama chegou a Calicute, no sudoeste da Índia, em 1498. Sete anos mais tarde, foi fundado o estado da Índia, colônia portuguesa com sede do governo em Cochim. Em 1530, a capital foi transferida para Goa, de onde o governador exercia sua autoridade sob as possessões portuguesas no Oceano Índico.

[14]PORTO, CIDADE DO: localizada à margem direita do rio Douro, é atualmente a segunda maior cidade de Portugal, sendo considerada a capital do norte do país. Inicialmente batizada de Cale e, posteriormente, de Portucale (nome que deu origem à denominação Portugal), a cidade passou a chamar-se Porto no século XIII, como forma de distingui-la do reino recém-fundado. Entre os séculos XIII e XV, a região desenvolveu fortemente a atividade marítima e comercial, reforçando as relações com portos importantes do Velho Mundo (Barcelona, Valência, Londres, entre outros). A cidade também se tornou conhecida pela produção e comércio de vinho de alta qualidade, que contribuiu para o aumento populacional da região no século XVII. No Porto foi instalada a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro com o objetivo de sustentar a reputação dos vinhos dessa região, a cultura das vinhas, beneficiar o seu comércio. A cidade foi palco e centro irradiador da Revolução Liberal do Porto em 1820. De caráter liberal e antiabsolutista, tinha como principal objetivo a formulação da primeira constituição de Portugal.

[15]ERISIPELAS: doença infecciosa causada por bactéria (Streptococcus erysipelatis, mais comum) e que se caracteriza por um “enrubescimento da pele” e aparecimento de feridas doloridas, às vezes acompanhado por bolhas ou pequenas vesículas sebosas. Sua ocorrência dá-se geralmente em surtos, principalmente em locais sujos e sem saneamento que propicia a proliferação bacteriana.

[16]PORTUGAL: país situado na Península Ibérica, localizada na Europa meridional, cuja capital é Lisboa. Sua designação originou-se de uma unidade administrativa do reino de Leão, o condado Portucalense, cujo nome foi herança da povoação romana que ali existiu, chamada Portucale (atual cidade do Porto). Compreendido entre o Minho e o Tejo, o Condado Portucalense, sob o governo de d. Afonso Henriques, deu início às lutas contra os mouros (vindos da África no século VIII), das quais resultou a fundação do reino de Portugal no século XIII. Tornou-se o primeiro reino a constituir-se como Estado Nacional após a Revolução de Avis em 1385. A centralização política foi um dos fatores que levaram o reino a ser o precursor da expansão marítima e comercial europeia, constituindo vasto império com possessões na África, nas Américas e nas Índias ao longo dos séculos XV e XVI. Os séculos seguintes à expansão foram interpretados na perspectiva da Ilustração e por parte da historiografia contemporânea como uma lacuna na trajetória portuguesa, um desvio em relação ao impulso das navegações e dos Descobrimentos e que sobretudo distanciou os portugueses da Revolução Científica. Era o “reino cadaveroso”, dominado pelos jesuítas, pela censura às ideias científicas, pelo ensino da Escolástica. Para outros autores tratou-se de uma outra via alternativa, a via ibérica, sem a conotação do “atraso”. O século XVII é o da união das coroas de Portugal e Espanha, período que iniciado ainda em 1580 se estendeu até 1640 com a restauração e a subida ao trono de d. João IV. Do ponto de vista da entrada de novas ideias no reino deve-se ver que independente da perspectiva adotada há um processo, uma transição, que conta a partir da segunda metade do XVII com a influência dos chamados “estrangeirados” sob d. João V, alterando em parte o cenário intelectual e mesmo institucional luso. Um momento chave para a história portuguesa é inaugurado com a subida ao trono de d. José I e o início do programa de reformas encetado por seu ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, o marquês de Pombal. Com consequências reconhecidas a longo prazo, no reino e em seus domínios, como se verá na América portuguesa, é importante admitir os limites dessa política, como adverte Francisco Falcon para quem “por mais importantes que tenham sido, e isso ir-se-ia tornar mais claro a médio e longo prazo, as reformas de todos os tipos que formam um conjunto dessa prática ilustrada não queriam de fato demolir ou subverter o edifício social” (A época pombalina, 1991, p. 489). O reinado de d. Maria I a despeito de ser conhecido como “a viradeira”, pelo recrudescimento do poder religioso e repressivo compreende a fundação da Academia Real de Ciências de Lisboa, o empreendimento das viagens filosóficas no reino e seus domínios, e assiste a fermentação de projetos sediciosos no Brasil, além da formação de um projeto luso-brasileiro que seria conduzido por personagens como o conde de Linhares, d. Rodrigo de Souza Coutinho. O impacto das ideias iluministas no mundo luso-brasileiro reverberava ainda os acontecimentos políticos na Europa, sobretudo na França que alarmava as monarquias do continente com as notícias da Revolução e suas etapas. Ante a ameaça de invasão francesa, decorrente das guerras napoleônicas e face à sua posição de fragilidade no continente, em que se reconhece sua subordinação à Grã-Bretanha, a família real transfere-se com a Corte para o Brasil, estabelecendo a sede do império ultramarino português na cidade do Rio de Janeiro a partir de 1808. A década de 1820 tem início com o questionamento da monarquia absolutista em Portugal, num movimento de caráter liberal que ficou conhecido como Revolução do Porto. A exemplo do que ocorrera a outras monarquias europeias, as Cortes portuguesas reunidas propõem a limitação do poder real, mediante uma constituição. Diante da ameaça ao trono, d. João VI retorna a Portugal, jurando a Constituição em fevereiro de 1821, deixando seu filho Pedro como príncipe regente do Brasil. Em 7 de setembro de 1822, d. Pedro proclamou a independência do Brasil, perdendo Portugal, sua mais importante colônia.

[17]VILA NOVA DE GAYA: situada na margem sul do rio Douro (que significa rio de ouro), suas origens remontam ao tempo em que era uma aglomeração de construções em torno de um castelo celta. Quando a vila foi incorporada ao império romano chamava-se Cale ou Gale, a população vivendo às margens do rio. Com o tempo foi se tornando um centro de trocas comerciais, de um lado e do outro do Douro, onde hoje ficam Vila Nova de Gaia e a cidade do Porto. Com as invasões mouras no século VII, a fronteira entre o estado árabe e o cristão passou a ser o rio, até por volta do ano 1000. A população de Gaia frequentemente fugia para o outro lado do Douro, em virtude das constantes invasões mouras – só retornaram em definitivo para a cidade depois da Reconquista, no século XIII. Foi então que a vila mudou o nome para Gaia – Vila Nova era uma outra vizinha. Juntaram-se ao Porto em 1383, e mantiveram-se uma região de forte vocação agrícola, além da comercial. Vila Nova e Gaia se uniram de vez no século XIX (só se tornaram uma cidade definitivamente em 1984). Tornou-se uma terra de homens do mar, artífices, mercadores e homens de negócios a partir da segunda metade do século XVIII. Data desse mesmo século a instalação da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro na região, por ordem do marquês de Pombal, promovendo sua economia e seu desenvolvimento urbano. A facilidade para a travessia do rio e o seu enorme ancoradouro fizeram da cidade um importante estaleiro e entreposto comercial.

 
Sugestões de uso em sala de aula:
Utilização(ões) possível(is):
-  No eixo temático sobre a “História das relações sociais da cultura e do trabalho”
-  No eixo temático sobre a “História das representações e das relações de poder”

Ao tratar dos seguintes conteúdos:
-  A sociedade colonial
-  Práticas e costumes coloniais
-  O Rio de Janeiro colonial  

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