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Moçambique

Conjuração de Minas Gerais

Escrito por Super User | Publicado: Quarta, 11 de Outubro de 2017, 17h18 | Última atualização em Segunda, 16 de Agosto de 2021, 17h24

Correspondência do vice-rei d. José Luís de Castro, conde de Resende, para a Corte, comunicando as sentenças dadas aos réus da Conjuração de Minas Gerais.

 

Conjunto documental: Correspondência do vice-reinado para a corte
Notação: Códice 68, vol. 10
Datas-limite: 1792-1792
Título do fundo ou coleção: Negócios de Portugal
Código do fundo: 59
Argumento de pesquisa: Moçambique
Data do documento: 29 de maio de 1792
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 177

 

Leia esse documento na íntegra

 

“No dia 18 de Abril em conferência que durou até as duas horas da noite foram sentenciados em relação os réus da Conjuração de Minas Gerais[1]. Sustentaram os juízes os seus votos até a decisão dos segundos embargos; e sendo então apresentada na mesa a carta régia de 15 de outubro de 1790, julgaram somente o réu Joaquim José da Silva Xavier[2] em execução da pena última que mandei executar.
Como o chanceller[3] remete o traslado de todo o processo sumário, por evitar extensão, não respeito a mudança e última decisão, que pela dita carta régia  houve nos degredos, para os quais, em seu cumprimento se vão expedindo os réus a medida que se oferece ocasião de embarcações. E já fiz partir para Angola[4] os quatro réus Ignácio José de Alvarenga[5], Francisco Antônio de Oliveira Lopes, José Alvares Maciel[6], e Luiz Vaz de Toledo Peza[7]: e para Moçambique[8], e Rio de Sena, pelo navio da Índia Nossa Senhora da Conceição princesa de Portugal, os sete réus Thomás Antonio Gonzaga[9], José Ayres Gomes[10], Vicente Vieira da Motta, João da Costa Rodrigues, Antônio de Oliveira Lopes, Victoriano Gonçalves Vellozo, e Salvador Carvalho do Amaral Gorgel[11]. Deus guarde a Vossa Exª. Rio de Janeiro 29 de maio de 1792.
Senhor Martinho de Mello e Castro[12]. Conde de Rezende

 

[1]MINAS GERAIS, CAPITANIA DE: nascida a partir do desmembramento da capitania de São Paulo e Minas do Ouro, ocorrido em 1720, Minas Gerais foi o foco da exploração de ouro e pedras preciosas – inclusive diamantes – ao longo do século XVIII. O início da exploração do ouro em fins do século XVII faria com que a metrópole implementasse reformas administrativas e legislativas com o intuito de estabelecer um maior controle sobre o território e sobre a exploração das suas riquezas, processo acentuado com a descoberta de diamantes na década de 1720. Em 1709, a crise causada pelo confronto entre os primeiros exploradores da região das minas e os “aventureiros” que chegaram posteriormente resultou no conflito conhecido por Guerra dos Emboabas e foi uma das causas para a criação da capitania de São Paulo e Minas do Ouro. Em 1720, a revolta de Felipe dos Santos (ou de Vila Rica), que questionava a forma de tributação sobre o ouro e a intensificação do controle da coroa sobre as atividades locais sob a forma da criação das casas de fundição oficiais contribuiu para novo desmembramento, e a criação da capitania de Minas Gerais. O levante de 1720 não seria o último a opor a coroa aos colonos em torno da exploração e taxação das riquezas da região; em 1789 – no período de decadência da exploração colonial do ouro, diametralmente oposto ao do movimento de Felipe dos Santos – ocorreu a Conjuração Mineira, já sob a influência das ideias liberais e da revolução americana. Tornada polo dinamizador da economia colonial, a capitania das Minas (agora, Gerais, e não apenas do ouro) desenvolve, na sua rede de povoados, vilas e cidades uma sociedade mais urbana e dinâmica do que a que caracterizava a economia agrícola, cuja exclusividade marcou os primeiros dois séculos da colonização. À medida que ouro e diamantes jorravam, as cidades se desenvolviam e sofisticavam, a sociedade se diversificava, assim como as atividades econômicas, a despeito da repressão da metrópole que não via com bons olhos a produção local de bens necessários ao dia a dia dos colonos e à própria atividade mineradora. Neste painel variado, a massa de escravos e o pequeno grupo de senhores – molas mestras da produção de riquezas –  dividiam espaço com artistas, intelectuais, comerciantes de víveres, e um sem número de “sem destinos”, indivíduos que vagavam à margem da sociedade e da riqueza da qual se apossavam poucos privilegiados. De forma não muito diferente do que ocorre nos dias de hoje, em regiões em que uma fonte potencial de riqueza é subitamente descoberta e explorada, os lucros e benefícios da nova atividade tendem a se concentrar de forma intensa, deixando à margem uma quase horda de excluídos, muitos deles vivendo a vã esperança de partilhar as sobras possíveis. Não é à toa que a paisagem arquitetônica desenvolvida ao longo do século XVIII impressiona até os dias de hoje, e lançou para a história nomes como Manuel Francisco Lisboa, que planejou a igreja do Carmo, em Ouro Preto (antiga Vila Rica). Artistas locais, como Aleijadinho e Mestre Ataíde, desenvolveram uma versão nativa de barroco/ rococó e beneficiavam-se do grande afluxo de riquezas. Patrocinadas pelas irmandades e ordens terceiras – organizações religiosas de indivíduos sem vínculo com a Igreja, mas que se dedicam a um culto específico –, que tiveram um papel crucial na vida social da região das minas, as opulentas igrejas se multiplicaram, exibindo o esplendor de uma era que chegaria ao fim com o século XVIII. Após a década de 1760 percebe-se que a comarca do Rio das Mortes passou a apresentar um crescimento demográfico substancial, em oposição à comarca de Vila Rica, que começava a perder população. Isso se deveu ao declínio da produção de ouro – estreitamente relacionada à Vila Rica – e a diversificação e florescimento da agricultura, da pecuária e até mesmo, em certa medida, da nascente produção manufatureira em Rio das Mortes. Esta transformação marca o início da queda da produção de ouro na região e indica a diversificação de atividades para além da mineração.

[2]XAVIER, JOAQUIM JOSÉ DA SILVA (1746-1792):  Joaquim José da Silva Xavier nasceu em 1746 na região onde hoje se encontra a cidade de São João del-Rei, em Minas Gerais. Uma das suas ocupações consistia em arrancar dentes ruins e colocar “novos”, feitos de ossos, o que lhe rendeu, além da alcunha de Tiradentes, um importante papel como arregimentador para o movimento inconfidente mineiro [ver Conjuração Mineira]. Deixava abertamente implícito o seu descontentamento com o governo português e ressentimento em relação ao exército – por sentir-se preterido em missões e promoções na carreira militar, na qual ingressou em 1775, após uma experiência não muito bem-sucedida na mineração. Era alferes – oficial de baixa patente –  no corpo de Dragões del-Rei: unidade do exército português criada em 1775 na cidade de Vila Rica, responsável pela arrecadação dos tributos da Coroa portuguesa; pela garantia da lei e da ordem nas atividades de exploração do ouro; pela vigilância das estradas, caminhos e rios, entre outros. Tal cargo fazia dele uma peça-chave no levante, já que dos soldados, dependeria o êxito inicial do movimento. Tiradentes foi um dos maiores propagandistas do levante, cujas ideias apresentavam, mais claramente, o viés do “nacionalismo econômico”, caracterizado pela defesa e enaltecimento dos recursos naturais da colônia, superiores, em muito, aos da metrópole. Não apoiou o fim do tráfico negreiro ou da escravidão, embora o autor que mais citasse publicamente, o Abade Raynal, iluminista francês e autor censurado na colônia, a condenasse. Compunha o grupo de inconfidentes para quem a questão política, ou seja, o rompimento com a metrópole portuguesa, colocava-se acima das contingências financeiras imediatas causadas pelos altos impostos. Pertencia ao núcleo central de revoltosos que dariam início ao levante assim que a derrama fosse anunciada em Minas Gerais, e era previsto que ele mostrasse a cabeça do governador Luís Antônio Furtado de Castro do Rio de Mendonça, visconde de Barbacena, clamando por liberdade. A seguir, seria proclamada a República e lida uma declaração de independência, conclui o historiador Kenneth Maxwell (Conjuração mineira: novos aspectos. Estudos Avançados, 3(6), 04-24. http://www.revistas.usp.br/eav/article/view/8518 ). No entanto, devido à denúncia do coronel Silvério dos Reis, a conspiração foi desmantelada. Instaurou-se uma devassa da inconfidência, desdobrada em dois processos, um aberto no Rio de Janeiro e outro na capitania de Minas Gerais, destinados a apurar e punir os crimes dos conjurados. Tiradentes foi preso por um destacamento de soldados do regimento europeu de Estramoz na casa em que se escondia no Rio de Janeiro em 10 de maio de 1789, portando um mosquete carregado, e admitiu a culpa que lhe fora atribuída, declarando-se o cabeça do levante, cujo objetivo seria, segundo os autores de sua sentença, “subtrair da sujeição, e obediência devida a mesma senhora [a rainha d. maria I]; pretendendo desmembrar, e separar do Estado aquela Capitania [Minas Gerais], para formarem uma república independente”. Seu processo durou aproximadamente três anos e, em abril de 1791, foi declarado culpado por crime de lesa-majestade. De todos os condenados à morte, Tiradentes foi o único que não recebeu indulto – os demais condenados à mesma pena tiveram sua sentença comutada ao degredo na África. Morreu na forca em 1792 e foi esquartejado, suas partes foram expostas ao longo do caminho para Minas Gerais. Todos os seus sucessores, incluindo filhos e netos, caso os tivesse, foram declarados infames, e seus bens foram revertidos para o Fisco e para a Câmara Real. Sua casa em Vila Rica foi derrubada e o terreno salgado, em um gesto que significa infertilizar as terras. Cerca de cem anos depois de sua morte, a figura de Tiradentes, como a própria “inconfidência” em si, seria recuperada pelos republicanos e, em torno desta personagem e deste evento, seriam tecidas teias complexas de mitos e significados, a confundir ideias e ideais, lenda e história. Os autos da devassa da inconfidência, contendo depoimentos e a sentença de Joaquim José da Silva Xavier, estão reunidos em oito volumes e formam o conjunto documental Inconfidência em Minas Gerais, levante de Tiradentes, sob custódia do Arquivo Nacional. Em 2007, os autos da devassa foram nominados ao Registro Nacional do Brasil do Programa Memória do Mundo da UNESCO.

[3]CHANCELER: guarda-selos. Funcionário do governo encarregado de chancelar documentos ou diplomas tornando-os autênticos. Era o magistrado responsável pela guarda do selo real.

[4]ANGOLA: localiza-se na região sudoeste da África. Como colônia portuguesa tem seu início em 1575, a partir do contrato de conquista e de colonização recebido da Coroa pelo explorador Paulo Dias de Novaes, face ao sucesso obtido na corte do Ndongo, conforme J. Vansina no capítulo “O reino do Congo e seus vizinhos” (História Geral da África, vol. V, Unesco, 2010). A colônia viria a se chamar Angola, nome atribuído pelos portugueses, inspirado no título ngola dado ao rei do Ndongo, região constituída mais pela submissão de grupos a uma autoridade maior, por alianças ou guerra, do que por uma delimitação territorial como explica Marina de Mello e Souza (Além do visível: poder, catolicismo e comércio no Congo e em Angola. São Paulo: Edusp, 2018). No ano seguinte é criada a vila de São Paulo de Luanda, da qual Dias de Novaes foi o primeiro governador e capitão geral, conforme o modelo implantado no Brasil, instalando-se com famílias de colonos e soldados portugueses. As pressões metropolitanas para se impor na região e as suspeitas surgidas entre os líderes locais de que os portugueses vinham para ficar levaram à eclosão de uma guerra iniciada em 1579 que durou até 1671. Entre 1641 e 1648, Angola esteve sob domínio holandês, em um movimento que não pode ser dissociado da ocupação da região nordeste da América portuguesa. Se desde o início de sua presença, os portugueses dedicaram-se ao comércio de escravos, primeiro para São Tomé e depois para o Brasil, esse negócio tornar-se-ia a principal atividade econômica da região, fazendo de Angola a grande exportadora de mão de obra compulsória para a América. Segundo a base de dados americana Atlantic Slave Trade, calcula-se que tenham saído de Angola, entre 1501 e 1866, quase 5,7 milhões de escravos. Criaram-se relações bilaterais entre Brasil e Angola, onde o primeiro produzia matérias-primas e alimentos – quer para a agro exportação, quer para o mercado interno, e Angola forneceria a força de trabalho cativo. Este eixo é, para parte da historiografia, constitutivo do sistema atlântico luso e sustenta a concepção de uma monarquia pluricontinental, na qual Angola, destacando-se a cidade de Luanda, já no século XVII era um dos seus polos. A independência de Angola só foi declarada em 1975, marcando também o fim do colonialismo português.

[5]ALVARENGA, IGNACIO JOSE DE (1744-1792): nascido no Rio de Janeiro, viveu desde criança em Portugal, onde frequentou o curso de Leis na Universidade de Coimbra na mesma época que Tomás Antônio Gonzaga. Terminados seus estudos lecionou em uma das cadeiras do mesmo curso e começou a carreira na magistratura em Portugal. Protegido do marquês de Pombal, veio a ocupar o cargo de ouvidor de rio das Mortes na capitania de Minas Gerais, até a queda do ministro, quando abandona a vida pública e passa a dedicar-se aos negócios da família da sua esposa, a poetisa Bárbara Heliodora Alvarenga Peixoto. Ignacio José também se dedicava à poesia, mas para parte da crítica sua obra não se equipava a de outros inconfidentes. Uma parcela de sua produção lírica perdeu-se devido ao seu envolvimento na conspiração em Minas Gerais da qual foi um dos principais líderes. Em fins da década de 1780, encontrava-se extremamente endividado, o que funcionava como mais um incentivo para a sua participação na Conjuração Mineira e para seu entusiasmo pela ideia de independência, atribuindo-se a ele a proposta da legenda da bandeira revolucionária Libertas quae sera tamem. Apesar das dívidas, contudo, suas propriedades superavam o montante devido, e o arrolamento de bens dos inconfidentes nos Autos da Inconfidência ainda o colocam no topo da lista de homens mais ricos. Diz-se que a senha para a eclosão da revolta nasceu de uma celebração em sua casa – o batizado de um dos filhos. Um dos únicos a defender o fim da escravidão – embora fosse, ele próprio, dono de terras, minas e escravos, foi um dos principais denunciados e estava entre os primeiros a serem presos por ordem do visconde de Barbacena, ainda em maio de 1789. Condenado ao degredo em Angola, morreu pouco tempo depois da sua chegada.

[6]MACIEL, JOSÉ ALVARES (1760-1802): José Álvares Maciel era filho do capitão-mor de Vila Rica, de quem herdara o nome, um rico comerciante e fazendeiro. Como outros filhos da elite colonial, foi mandado com 21 anos à Universidade de Coimbra para completar seus estudos em Filosofia Natural, tendo seguido para a Inglaterra posteriormente para estudar técnicas de siderurgia e manufatura. Na Inglaterra, teve contato com as ideias liberais e a maçonaria e passou a adquirir e ler textos com relatos da Revolução americana, também discutindo com amigos ingleses a possibilidade da independência do Brasil. Na época em que retornou ao Brasil, em 1788, se engajou ao grupo daqueles insatisfeitos com a relação metrópole-colônia (em especial, no tocante à situação das Minas) e que pregavam a rebelião. Por ser uma figura próxima ao governador das Minas, o visconde de Barbacena – era tutor de seus filhos além de encarregado de prospecções mineralógicas nos arredores de Vila Rica –, acabou se tornando um informante privilegiado dos movimentos do visconde e de suas ações. Foi preso em 1789 pela Devassa e enviado para o Rio de Janeiro para interrogatório. Alvares Maciel foi condenado à morte, mas teve sua pena comutada para degredo perpétuo em Angola, conseguindo estabelecer-se com sucesso na região como negociante, inclusive a serviço da Coroa. Em 1799, tornou-se encarregado de uma missão para verificar a existência de riquezas minerais nos sertões de Angola, dando início à produção de ferro no ano seguinte.

[7]PIZA, LUIZ VAZ DE TOLEDO (1739-1807): o sargento-mor Luiz Vaz de Toledo Piza foi um dos participantes da Conjuração Mineira (1789). Preso e condenado à morte, teve sua pena comutada para degredo em Angola. Conseguiu estabelecer-se com sucesso, sendo nomeado escrivão da Ouvidoria de Luanda em 1797. Morreu no exílio aos 68 anos.

[8]MOÇAMBIQUE: país localizado na costa sudeste da África, banhado pelo oceano Índico. Os primeiros povos a habitarem a região, entre os séculos I e V, eram grupos de língua banta que vieram em ondas migratórias pelo vale do rio Zambeze e fundaram comunidades basicamente agrícolas. Ao longo da Idade Média as cidades pouco se desenvolveram e pouco delas restou. O comércio costeiro foi dominado inicialmente por persas e árabes que tinham assentamentos pelo litoral e mantinham negócios com o Oriente. A viagem de Vasco da Gama levou os primeiros portugueses a região, em 1498; desde então a hegemonia comercial árabe e persa começa a decair e cede lugar às novas rotas marítimas dos portugueses, vindo da Europa até o Oriente, com passagem pelos entrepostos ao longo da costa africana. Os mercadores portugueses se estabeleceram mantendo boas relações com os reinos que dominavam a região, por meio de acordos ou ocasionalmente por meio da força. A primeira povoação fundada na região de Moçambique foi Sena, em 1530, e depois outras ainda no século XVI, tomando conta da rota entre as minas de ouro e o oceano Índico. Entre os séculos XVII e XVIII os portugueses negligenciaram a ocupação dos territórios, mais envolvidos com a colonização da América, mas chegaram a mandar colonos para Moçambique, que se misturaram com os habitantes da região, estreitando os laços de comércio e agricultura. Portugal controlava as ocupações e os negócios da região a partir da capital do Estado da Índia, Goa, mas a administração não era bem sucedida. Em 1752, o governo pombalino decidiu nomear um governador-geral para o território de Moçambique, visando a melhorar as atividades comerciais, coletar os impostos e manter a colônia. Os principais produtos de interesse da metrópole eram o ouro (principalmente nos séculos XVI e XVII), depois o marfim, produto de alto valor na Europa, mas sobretudo escravos, milhares enviados para o trabalho nas Américas até o ano de 1842, quando o tráfico foi oficialmente proibido – sem considerar o comércio clandestino que seguiu ainda alguns anos. Até meados do século XIX, a presença portuguesa limitava-se a algumas capitanias (os chamados prazos), ao longo do litoral, Moçambique só chegou a ser administrada como uma colônia unificada em finais do Oitocentos. Foi a última colônia portuguesa a conseguir a independência, em 1975.

[9]GONZAGA, TOMÁS ANTONIO (1744-1810): nascido em 1744, ganhou fama como poeta, em especial como autor de Marília de Dirceu e das Cartas Chilenas, sátira virulenta que tinha como alvo o venal governador de Minas Gerais na época, Luís da Cunha Meneses. O antagonismo entre Cunha Meneses e Tomás Gonzaga, aliás, bem demonstra o tipo de conflito que emergia na confusa e dinâmica região das minas, resultado de uma máquina administrativa que permitia a sobreposição dos interesses da Coroa, daqueles que ocupavam postos de funcionários desta e de indivíduos que apenas tencionavam explorar a riqueza da terra de forma privada. Ouvidor de Vila Rica, nascido em Portugal, mas criado no Brasil, era apontado como provável primeiro governante de um Brasil livre – ou antes, das Minas Gerais livre. Seus escritos por ele permitem entrever um pensador alerta, perspicaz, crítico da tirania de alguns monarcas, mas muito mais afinado com uma monarquia não-despótica do que com a democracia republicana dos norte-americanos. Foi um dos primeiros implicados no levante de 1798 (Conjuração Mineira), preso ainda no mês de maio e logo remetido para o Rio de Janeiro. Seus depoimentos pouco revelaram, sustentando até o fim que jamais ouvira falar em sedição alguma. Foi condenado a degredo em Moçambique, onde acabou por casar-se e reconstruir sua vida, terminando a carreira como funcionário da Coroa no cargo de promotor de defuntos e ausentes e advogado dos auditórios públicos.

[10]GOMES, JOSÉ AIRES (1734-1796): Fazendeiro, proprietário de terras, filho de João Gomes, fundador do arraial que levou o seu nome, mais tarde recebeu o nome de Palmira e hoje Santos Dumont, Minas Gerais. Recebeu a patente de Coronel de milícias que a coroa portuguesa concedia a proprietários de terras e sesmarias, abastados, para manutenção da ordem e defesa do territorial nas adjacências das suas propriedades e auxiliou o alferes Joaquim José da Silva Xavier no combate e prisão de salteadores que infestavam a região da Serra da Mantiqueira, atacando tropas que transitavam no Caminho Novo. Subscreveu o requerimento em que vários proprietários e membros da comunidade do Arraial da Igreja Nova de Nossa Senhora da Piedade, atual Barbacena, pediam ao governador da capitania, visconde de Barbacena, a sua elevação à vila. Foi um dos Inconfidentes condenado ao degredo, em 1792, seguindo primeiramente para Ambaca, em Angola, e depois para Inhambane, em Moçambique, onde faleceu.

[11]GORGEL, SALVADOR CARVALHO DO AMARAL: inconfidente degredado para Moçambique, conseguiu estabelecer-se com sucesso, tendo sido nomeado, em 1792, ao cargo de ajudante do cirurgião-mor da região, e em 1794, eleito vereador da câmara de Inhambane, Moçambique.

[12]CASTRO, MARTINHO DE MELO E (1716-1795): nascido em Lisboa, foi secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos de 1770 até sua morte. Estudou latinidade, filosofia e teologia na Universidade de Évora, além de direito canônico, em Coimbra, onde se formou bacharel em 1744. Diplomata, iniciou seus trabalhos em 1751, como embaixador em Haia, Holanda, e atuou de forma decisiva na solução de questões conflituosas entre Portugal e Inglaterra, decorrentes da Guerra dos Sete Anos, o que levou à sua nomeação para a Secretaria de Estado. Durante sua gestão como secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, desempenhou papel central no planejamento e execução das viagens e expedições filosóficas às colônias portuguesas. Melo e Castro foi o principal agente da Coroa envolvido no planejamento das viagens e na interlocução com os naturalistas e administradores locais, com vistas à solução de problemas no decurso das expedições. O secretário foi, ainda, diretor do Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda e destinatário das remessas de produtos naturais provenientes das viagens, encaminhados aos museus de História Natural em Lisboa e Coimbra para sistematização, análise e classificação. Demonstrou habilidade na administração pública, muito embora seus escritos apontem que não foi um grande político ou teórico, não reconhecendo o início da crise do sistema colonial durante sua governação. Foi sob sua gestão que ocorreu a Conjuração Mineira (1789), tendo partido de Melo e Castro a ordem para que o governador da capitania de Minas Gerais, Luis Antonio Furtado de Castro, visconde de Barbacena, promovesse a devassa dos envolvidos.

 

 

Sugestões de uso em sala de aula: 
Utilização(ões) possível(is): 
- No eixo temático sobre a “História das Relações Sociais da Cultura e do Trabalho”
- Ao abordar o eixo temático sobre as “Relações de Poder” e no sub-tema: “Nações, povos, lutas, guerras e revoluções”

Ao tratar dos seguintes conteúdos:
- Manutenção do sistema colonial
- A sociedade colonial: hierarquias, resistências e culturas
- Mecanismos de repressão e controle colonial
- A crise do sistema colonial: seus fatores internos

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